Isolamento social e a nova realidade dos casais

Vamos todos aprender e crescer com esta experiência, mas é fundamental termos a franqueza, tolerância e expectativas realistas uns para com os outros.

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taylor hernandez/Unsplash

Neste tempo de pandemia para casais em teletrabalho, com filhos muito pequenos e dependentes, é fundamental que a gestão, organização do tempo e das rotinas em casa seja mais rigorosa e definida por ambos, através do diálogo e da comunicação das expectativas de cada um sobre este período. Sobretudo, no que respeita ao tempo a dedicar ao trabalho, aos filhos e tarefas de casa.

As crianças mais pequenas, perante a percepção da presença dos pais durante todo o dia, em casa, ao contrário do que é habitual, também se tornam mais apelativas face à presença do adulto, requerendo a sua presença para actividades e brincadeiras.

É importante procurar:

  • Definir o tempo de responsabilidade de cada um com a criança, enquanto o outro poderá estar dedicado ao trabalho, tendo em conta a realidade e exigência profissional de cada um.
  • Definir as tarefas domésticas de forma mais equitativa e preferencialmente aproximada ao que já cada um assumia anteriormente a esta condição, para que ambos se sintam confortáveis no seu desempenho.
  • Criar rotinas diárias relativamente ao tempo de início e término do dia de trabalho, elegendo momentos de paragem, como por exemplo, o horário das refeições que permite algum tempo de partilha familiar.
  • Recorrer aos filhos mais velhos, quando existem, por curtos períodos de tempo, para estarem com os mais novos e, assim, libertarem os pais para outras tarefas.
  • Manter as rotinas de sono das crianças, sobretudo à noite, o que permitirá aos casais o reencontro na intimidade.

Será importante e um dever de todos sensibilizar as chefias para a realidade que as famílias estão a viver actualmente. Este tempo não é um equivalente a um período de férias. O tempo em casa não pode ser ocupado de forma integral e ininterrupta pela dedicação ao trabalho, menos ainda no caso de um casal com filhos pequenos e dependentes, agora com menos apoios por parte da família alargada, nomeadamente os avós.

Sensibilizar para que este primeiro tempo é de grande exigência e requer adaptação a múltiplas tarefas. O stress está aqui aumentado pela exigência em dar respostas à pressão do trabalho, o apoio aos filhos e tarefas domésticas muitas vezes acrescidas.

Vamos todos aprender e crescer com esta experiência, mas é fundamental termos a franqueza, tolerância e expectativas realistas uns para com os outros.

Importa também ter em conta os que, aparentemente, não são dependentes mas que precisam muitas vezes da orientação dos pais nesta fase em que a aprendizagem é feita em casa. Os jovens e adolescentes, por terem uma maior consciência de toda esta conjuntura também podem manifestar um aumento da ansiedade ou comportamentos diferentes dos habituais, que requerem atenção e tempo de dedicação dos pais.

Para os casais sem filhos é fundamental ter presente a importância da gestão dos limites de cada um. Definir tempos para o casal e tempos individuais. Este é um período em que a intimidade do casal estará muito exposta e corre o risco de ser atingida, pelo tempo prolongado passado em conjunto e pelo corte com o mundo exterior.

Neste sentido, é importante fazer um esforço para definir e diversificar o espaço relacional através da reorganização dos vários tempos para o trabalho, tarefas domésticas, novas rotinas e tempo de lazer. Fazer uma espécie de horário diário com os momentos de encontro para o casal, seja para conversar, ver um filme, fazer exercício físico, assistir às notícias diárias, etc.. Igualmente, neste planeamento têm de estar incluídos os tempos individuais para as necessidades e gostos de cada um, para que o “eu” continue a existir e a contribuir activamente para a construção do “nós”.

Para os casais em início de namoro, se já vivem juntos devem continuar. Se só namoram e vivem em casas separadas, devem continuar a ver-se na rua mas não a partilhar casa. As pessoas podem sair por curtos períodos, com as recomendações já conhecidas. Não estão em “prisão domiciliária”, como erradamente já ouvimos. Esta é uma expressão que aterroriza as pessoas.

Pode acontecer, para alguns casais, estarem impossibilitados de estar fisicamente juntos e importa reflectir sobre o que fazer para não se perder a aproximação inicial da relação pelo motivo deste isolamento social. A utilização das redes sociais e dispositivos digitais favorecem actualmente um contacto mais próximo e com capacidade de surpreender o outro com acções inesperadas mantendo o factor surpresa tão importante para a manutenção das relações. Igualmente importante para a estabilidade da nova relação é poderem combinar previamente as horas em que se comunicam para reduzir o eventual aumento da ansiedade provocado pela distância.

Para todos os casais é fundamental ter consciência que este é um momento único e absolutamente novo onde importa ter presente que a forma como cada um vive e gere esta situação é muito própria e individual. As preocupações, medos e ansiedades de um não são as mesmas do outro. Uma intensificação das emoções ou, por outro lado, um maior distanciamento emocional como respostas adaptativas são reacções que podemos esperar.

É importante evitar colocar no outro a responsabilidade pelo nosso bem-estar e fazer acusações nesse sentido. O uso de um tom acusatório apenas serve para afastar o outro e dificultar a tarefa de nos fazermos entender sobre aquilo que sentimos.

Não comunicar sobre o que se precisa ou o que esperamos do outro é algo que devemos evitar pelo risco de acumulação dos conflitos e desilusão e porque é perigoso viver a acreditar que o outro sabe exactamente o que dele esperamos e precisamos.

É fundamental mostrar empatia e respeito pela forma como o outro elemento do casal está a viver a situação actual de confinamento e receio de contaminação pelo novo coronavírus. Estar ao lado, sem ser intrusivo, manifestando disponibilidade de escuta sobre como o outro se sente, e em conjunto, procurar encontrar novas formas de estar e de fazer diferentes que possam ir ao encontro de um maior bem-estar e segurança.

Revelar tolerância perante a eventual alteração de comportamentos ou reacções habituais do outro é geralmente muito valorizado por quem se sente num momento de maior fragilidade.

Mostrar comportamentos e acções dirigidas ao cuidar do outro, no sentido de valorizar e dar prioridade às suas necessidades também contribui certamente para uma melhoria do seu bem-estar.

Um discurso positivo com um olhar no futuro próximo e reflexivo sobre os ganhos e aprendizagens sobre este período também pode ser útil numa reflexão partilhada.

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