Análise do genoma de novo vírus de pneumonia na China pode ajudar a travar surto

Há vários laboratórios a analisar os dados públicos sobre a sequência genética do novo coronavírus, que foi detectado na China, e já foram identificadas semelhanças e diferenças com a síndrome respiratória aguda grave (SARS).

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Homem num funeral de uma vítima da SARS, em 2003 Bobby Yip/Reuters

A pneumonia viral que começou na cidade de Wuhan, na China, no final do ano passado e que conta com 59 casos prováveis de infecção, colocou as autoridades de saúde em alerta. A Organização Mundial da Saúde já avisou que o vírus pode alastrar-se a outros países e, em Portugal, a Direcção-Geral de Saúde emitiu um comunicado com alguns conselhos dirigidos às pessoas que viajam de (ou para) esta região da China. Enquanto isso, há vários cientistas que estão a trabalhar com os dados que foram tornados públicos sobre a sequenciação do genoma deste novo vírus implicado no surto. A sequência do genoma é crucial para desenvolver testes específicos de diagnóstico e identificar possíveis opções de intervenção.

Andrew Rambaut é um dos muitos cientistas que “perderam” tempo a analisar os dados divulgados recentemente sobre o genoma do coronavírus detectado pela primeira vez em Wuhan, em Dezembro de 2019. Os dados sobre os vírus de uma dezena de doentes foram tornados públicos e estão em vários sites de acesso aberto, entre os quais, a iniciativa GISAID que é uma base internacional especialmente dedicada ao vírus influenza. “O Centro Chinês de Controle e Prevenção de Doenças, a Academia Chinesa de Ciências e a Academia Chinesa de Ciências Médicas divulgaram através da Iniciativa GISAID a sequência genómica de um coronavírus recém-descoberto”, anuncia o site de GISAID onde estão publicados os dados.

Citado numa notícia da revista Science, Andrew Rambaut, biólogo evolutivo da Universidade de Edimburgo (Escócia), terá publicado no seu Twitter que o novo coronavírus tem uma semelhança com uma síndrome respiratória aguda grave (SARS) na ordem dos 89%. No mesmo artigo, Ralph Baric, investigador especializado em coronavírus na Universidade da Carolina do Norte (EUA), adianta ainda que, dos quatro vírus SARS de morcegos e que podem infectar humanos, este recém-descoberto vírus na China é o “mais distante da SARS”.

Em vários laboratórios de todo o mundo os especialistas estão a tentar saber mais sobre este surto que parece estar a ganhar força, tendo já levado um caso de uma mulher que esteve em Wuhan para a Tailândia. E os esforços são mais que bem-vindos. A equipa de Ralph Baric já começou a fazer algumas experiências para tentar replicar o vírus e conseguir realizar testes de anticorpos e ensaios em modelos animais. “Se quisermos uma forte resposta de saúde pública, temos de fazer isto rapidamente”, avisa o investigador na Science, revelando ainda que espera que a resposta a este desafio mostre o que os cientistas são capazes de fazer quando trabalham juntos. “As pessoas não percebem a incrível competência da saúde pública e da comunidade científica quando tornam possível que se passe rapidamente de um vírus recém-descoberto para uma tremenda capacidade de rastrear e tentar controlar sua propagação”, diz.

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Tal como aconteceu em surtos anteriores na Ásia, as autoridades estão atentas a todos os viajantes com sintomas suspeitos REUTERS/Bobby Yip

Apesar das autoridades continuarem a garantir que as possibilidades de transmissão de humano para humano são muito limitadas, o novo caso confirmado fora da China é motivo para preocupação. Ontem, a Organização Mundial de Saúde (OMS) confirmou que o caso suspeito diagnosticado na Tailândia era, de facto, uma infecção por este novo vírus e garantiu que está já em curso um plano que será aplicado nos hospitais de todo o mundo. Segundo um comunicado da OMS, a detecção do primeiro caso fora da China pode significar que um surto internacional da doença está próximo.

Esta pneumonia é causada por coronavírus, um grupo de vírus que causam infecções respiratórias em seres humanos e animais e são transmitidos por via aérea (através da tosse ou espirros) ou contacto físico. Alguns destes vírus resultam apenas numa constipação, enquanto outros podem gerar doenças respiratórias mais graves, como a pneumonia atípica, ou SARS – o último surto desta doença começou no Sul da China e foram registados mais de oito mil casos em todo o mundo. Cerca de 800 pessoas morreram por causa desse vírus entre 2002 e 2003.

A OMS reitera que é essencial que as investigações continuem na China para identificar a fonte do vírus. Segundo as últimas informações fornecidas pela Comissão Municipal de Saúde de Wuhan, o surto terá começado num mercado de peixe e animais vivos – as investigações preliminares revelaram que a maior parte dos casos foi diagnosticado em trabalhadores ou visitantes frequentes do mercado de Huanan. O mercado foi encerrado a 1 de Janeiro de 2020. 

Em Portugal, a Direcção Geral da Saúde (DGS) já garantiu que Portugal está preparado para atender doentes e que está a “acompanhar a situação e as preocupações vindas da Ásia, assim como os casos de doentes que tenham estado em viagem” por esses países.

De acordo com as últimas informações transmitidas à OMS pelas autoridades chinesas, há 59 casos prováveis (41 confirmados) com a nova infecção na cidade de Wuhan, todos estes identificados antes de 3 de Janeiro. Um homem de 61 anos, com outros problemas de saúde associados, foi, por enquanto, a única vítima mortal. No total, 763 pessoas que tiveram contacto directo com os doentes também foram avaliados pelos profissionais de saúde, mas mais nenhum caso foi detectado. Os sinais clínicos relatados pelos doentes são febre, dificuldades respiratórias e dores musculares e as autoridades de saúde já avisaram que todos os cidadãos devem estar atentos a estes sintomas. Com Sofia Neves

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