Juros baixos – o perigo

O grande desafio económico deste ciclo de taxas de juro anormalmente baixas e negativas é como conceber um progresso saudável e duradouro para a economia mundial dentro deste padrão de taxas.

Desde a crise de 2008 que os bancos centrais tomaram paulatinamente diversas medidas de cariz monetário com o objetivo de estimular a economia, combater o declínio da inflação e reduzir a pressão sobre a apreciação das taxas de câmbio. A partir de 2011, essas medidas foram reforçadas com consecutivas diminuições das taxas de juro, que no caso da Zona Euro tomam a designação de taxas de juro oficiais do Eurosistema. Desde 2014 que uma dessas taxas (facilidade permanente de depósito) passou a ser negativa, sendo atualmente de -0,5%. No tocante à facilidade permanente de cedência marginal de liquidez, a sua taxa é atualmente de 0,25% e nas operações principais de refinanciamento, a taxa é nula. O que se passa na Zona Euro passa-se um pouco por todo o mundo. A título de exemplo, o Japão adotou uma taxa de juro zero em 2000, sendo que atualmente é de -0,1%, e as perspetivas são de que, pelo menos nos próximos três anos, não deverá atingir valores positivos.

É verdade que juros baixos estimulam o investimento, o consumo e ajudam a colocar a inflação nos desejados 2%, mas podem provocar algumas repercussões negativas para as quais devemos estar atentos.

A primeira dessas repercussões é sobre as remunerações das poupanças, que continuam infindavelmente em valores irrisórios. Ao contrário dos Millennials, muitos dos Baby Boomers viam nos juros uma forma de aumentar os seus rendimentos durante a sua reforma. Com a perda desse rendimento o seu consumo diminui, o que contribui para uma desaceleração da economia, na parte que lhes diz respeito.

A segunda dessas repercussões é o desencorajamento em aplicar o dinheiro em contas poupança, devido às baixas taxas de juro. A alternativa pode ser procurar investimentos alternativos com potenciais retornos superiores, como seja o caso de ações ou imobiliário, o que pode contribuir para a formação de bolhas especulativas. Quanto mais tempo durar a época dos juros baixos, maior a probabilidade dessas bolhas ocorrerem.

O problema das bolhas especulativas é que o preço dos ativos subjacentes não pode subir eternamente e ultrapassar de forma exponencial o seu valor real. Os aforradores em busca de rendimentos superiores podem ser incentivados a investir em produtos complexos, com riscos elevados e para os quais não estão preparados, nem foram devidamente informados do real perigo de potenciais perdas.

Existe ainda uma outra repercussão que, apesar de ser muito técnica, e que ocorre em termos de gestão organizacional, não deixarei de referir. Com taxas de juro de longo prazo muito baixas, o valor presente líquido dos fluxos de caixa previsionais aumenta, o que provoca incrementos na atratividade e rentabilidade dos investimentos empresariais em novas tecnologias com vista a aumentarem a produtividade. Desta forma, é provocado um efeito expansionista na economia via aumentos da produtividade. Recentemente, alguns investigadores validaram esta hipótese teórica, mas apenas para empresas líderes de mercado, pois usufruem de melhores condições de acesso ao crédito e muitas vezes possuem gestores (e não patrões) mais qualificados.

No tocante às empresas seguidoras, estas, por dificuldades naturais de serem seguidoras, deixam de investir tanto e são ultrapassadas em termos tecnológicos pelos líderes. Por falta de concorrência, os próprios líderes, agora numa posição de mercado cada vez mais confortável, deixam de investir, o que provoca uma estagnação na evolução tecnológica.

Baixas taxas de juro provocam ainda um efeito negativo nos lucros dos bancos, que estes procuram compensar por sucessivos aumentos nas comissões, o que penaliza duplamente os pequenos aforradores.

Outro efeito negativo sente-se na desigualdade da riqueza. Com aumentos dos preços dos ativos, os proprietários beneficiam com o aumento da sua riqueza aumentar, enquanto os não proprietários estagnam.

Por último, e talvez um dos mais graves efeitos que juros baixos provocam, é o risco do sobreendividamento. Apesar de não se perspetivar uma subida dos juros no curto prazo, quando estes subirem, muitas famílias e empresas poderão entrar em incumprimento, por falta de meios para pagarem as prestações. O empréstimo que hoje é fácil de pagar pode no futuro tornar-se um pesadelo, sendo que muitos empréstimos são contratados por décadas.

O grande desafio económico deste ciclo, de taxas de juro anormalmente baixas e negativas, é como conceber um progresso saudável e duradouro para a economia mundial dentro deste padrão de taxas.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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