Centros de Interpretação querem dar a conhecer de forma isenta a I República e o Estado Novo

O projecto foi iniciado pela Associação de Desenvolvimento Local, com sede em Santa Comba Dão, em parceria com três municípios.

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Nelson Garrido

Dentro de dois anos deverá nascer a Rede de Centros de Interpretação e Memória Política da I República e do Estado Novo, num projecto que pretende dar a conhecer, de forma isenta, parte da história do século XX.

Será uma rede implantada em cinco espaços distribuídos por outros tantos concelhos da região das Beiras (Penacova, Santa Comba Dão, Carregal do Sal, Tondela e Seia), com o objectivo de promover o conhecimento e o aprofundamento da democracia.

O projecto foi iniciado pela ADICES - Associação de Desenvolvimento Local, com sede em Santa Comba Dão, em parceria com três municípios e o Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS XX) da Universidade de Coimbra, que presta consultoria científica, tecnológica e deontológica, aos quais se juntaram as autarquias de Seia e Penacova.

“Há sensivelmente três anos que temos vindo a trabalhar num projecto que entendemos como da máxima importância para o território, através da criação de uma rede de centros interpretativos, onde está em causa o holocausto, em Cabanas de Viriato, associado à figura do Aristides Sousa Mendes, mas também a estância sanatorial do Caramulo, no Guardão (Tondela), e o Estado Novo”, explicou à agência Lusa João Carlos Figueiredo, coordenador da ADICES.

O objectivo da associação “era mostrar a importância da região na história do século XX”.

“E quando estabelecemos contacto com o CEIS XX da Universidade de Coimbra, apercebemo-nos de que eles próprios também estão a trabalhar num projecto muito parecido, nomeadamente com o Centro Interpretativo da I República, em Penacova [António José de Almeida], e com o Afonso Costa, em Seia”.

“Ao longo da construção deste projecto, percebemos que havia a necessidade de construirmos uma base científica e histórica que suportasse, de uma forma isenta, todo um projecto que se pretende que seja objectivo, em que não há mestres, não há ideologias”, sublinhou João Carlos Figueiredo.

A rede, que terá uma fase posterior com Tomás da Fonseca e Branquinho da Fonseca no Centro Interpretativo da Literatura do Século XX, pretende ser um motivo de atracção para os seus territórios, conjugando-se “com potencialidades que já existem ou que venham a existir, como é o caso da Ecopista do Dão, que é também uma mais-valia da região, e a Ecovia do Mondego que está em fase de arranque”.

“Esta é a nossa visão no sentido do desenvolvimento que queremos que seja integrado, equilibrado. Obviamente, não procurando fama nenhuma, nem exaltar ideologias e fazer apologia do que quer que seja, que não seja obviamente a história que não se apaga”, reiterou.

A rede vai constituir-se através do Centro de Interpretação do Estado Novo, em Santa Comba Dão, Centro de Interpretação da Primeira República/Casa-Museu António José de Almeida (Vale de Vinha, Penacova), Centro de Interpretação do Anti-semitismo e do Holocausto/Casa-Museu Aristides de Sousa Mendes (Cabanas de Viriato, Carregal do Sal), Centro de Interpretação da Estância Sanatorial do Caramulo (Guardão, Tondela) e Centro de Interpretação da Primeira República/Afonso Costa (Seia).

António Rochette, coordenador do CEIS XX, salienta que este projecto “está inserido dentro de uma estratégia do próprio Centro de Investigação que já vem de muito longe, de desenvolver trabalhos sobre a I República e o Estado Novo, o que se reflecte claramente naquilo que é o plano estratégico para a próxima década”.

“Nós não queremos que [os centros] sejam quatro paredes, mas que cada um destes locais, muitos deles até isolados, tenham uma dinâmica pedagógica para as novas gerações, ou seja, que tenha uma vertente de educação a trabalhar para o esclarecimento e para a formação das novas gerações, para que aquilo que aconteceu de bom se repita e o de mau não se repita”, frisou.

O coordenador do CEIS XX salienta que o projecto trabalha ao nível da componente cultural, política e das “componentes ligadas a vivências de um território de baixa densidade”, abrangendo lugares que “95% dos portugueses não sabem onde é que fica”.

“Nós estamos a trabalhar numa lógica daquilo que é um dos grandes desígnios portugueses, que é a manutenção de população em territórios de baixa densidade, tentando chamar gente para esses mesmo territórios e promover também algum desenvolvimento desses mesmos territórios que estão nessa situação”, enfatizou António Rochette.

Segundo João Paulo Avelãs Nunes, um dos coordenadores científicos do projeto, os cinco centros de interpretação “têm temas actuais, realidades que aconteceram no passado, património e possibilidades de reutilização no presente, quer para o debate cívico, sempre de reforço da democracia e de qualificação dos territórios e das pessoas que vivem nos territórios”.

O académico, director do departamento de História e Estudos Europeus, Arqueologia e Artes da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, salientou que, “aqui, o papel da historiografia e das outras ciências sociais não é determinar o que as pessoas devem pensar, mas propor análises, comparações que depois as pessoas utilizarão como cidadãos”.

O projecto, neste momento, está em fase de discussão das linhas orientadoras de produção de conteúdos, que serão aprovadas pelas entidades que encomendaram o projecto ao CEIS XX e, posteriormente, pelo conselho consultivo, que será criado em breve, explicou Avelãs Nunes.

A criação da Rede de Centros de Interpretação e Memória Política da I República e do Estado Novo engloba a reabilitação e reutilização de cinco edifícios, nomeadamente um antigo sanatório, a casa de Aristides Sousa Mendes [que está em reconstrução] e a Escola Cantina Salazar.

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