Apropriação de segredos deve obrigar FC Porto a pagar mais de dois milhões ao Benfica

Tribunal do Porto condenou clube e SAD portistas a pagar quase dois milhões de euros de indemnização ao Benfica pela divulgação de correspondência privada e relega determinação de outra parte da indemnização para mais tarde

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Francisco J. Marques Ines Fernandes

O Tribunal Judicial da Comarca do Porto condenou esta sexta-feira o FC Porto, a respectiva SAD e o director de comunicação, Francisco J. Marques, a pagarem quase dois milhões de euros de indemnização ao Benfica (que exigia 17 milhões) pela divulgação de correspondência privada do clube da Luz. A decisão, assinada pelo Juiz Paulo Teixeira, considera que o FC Porto também terá que indemnizar o Benfica por se ter apropriado de segredos do clube rival, mas remete para mais tarde a determinação do valor exacto da compensação, deixando margem para o Benfica apresentar facturas que comprovem o que custaram alguns desses projectos sigilosos.

Pinto da Costa, Adelino Caldeira e Fernando Gomes, administradores da SAD “azul e branca”, foram absolvidos, assim como o Porto Canal, já que o tribunal deu como provado que o conteúdo do programa “Universo Porto - da Bancada” era da responsabilidade exclusiva da FCP Media, que emprega Francisco J. Marques e é responsável por uma newsletter do clube. 

A decisão determina uma compensação de 1,4 milhões de euros a título de danos não patrimoniais e de 523 mil euros para compensar danos que o clube teve, como 188 mil euros gastos no reforço dos sistemas informáticos e da respectiva segurança ou na contratação de 18 novos colaboradores para fazer face à crise mediática. O valor atribuído a este nível não corresponde à totalidade do que era reclamado pelo Benfica já que o tribunal considerou que, como havia vários factos cumulativos que podiam justificar essas despesas, só devia ser considerado um terço do valor gasto.

Numa sentença com 140 páginas, o juiz considera que os emails divulgados pelo director de comunicação do FC Porto no Porto Canal ao longo de 20 programas do “Universo Porto - da Bancada” emitidos entre Abril de 2017 e Janeiro de 2018 são de facto verdadeiros, mas salienta que Francisco J. Marques não é jornalista, nem a forma como a divulgação foi feita teve a intenção de informar. “A forma de exibição dos emails assumiu uma lógica clara de propaganda”, afirma o juiz, que nota que houve anúncios antecipados da divulgação de certos emails e algumas pausas artificiais na sua publicitação que se prolongou por 10 meses. O magistrado nota que “raramente os emails foram exibidos”, tendo sido “apenas lido, o que nunca possibilitou ao público em geral a sua leitura total, não truncada e crítica”.

Divulgar bruxaria custa 340 mil euros

Após a análise do conteúdo dos 55 emails, o juiz nota que dois deles foram “truncados” e que “desvirtuar não é informar”. Exemplo disso é um email entre o antigo árbitro Adão Mendes e o Paulo Gonçalves, antigo assessor jurídico do Benfica, em que o director de comunicação do Porto sublinhou a frase: “Hoje quem nos prejudicar sabe que é punido e este espaço foi conquistado com muito trabalho do primeiro-ministro”. A referência a Luís Filipe Vieira vem, no entanto, sublinha o juiz, antecedida de outra frase, omitida por Francisco J. Marques, que lhe dá um outro enquadramento. “O poder está no trabalho dia a dia, na busca da verdade e da seriedade e isso faz a diferença”. A omissão, diz o juiz, “desvirtua o sentido da frase” e põe em causa as mais elementares regras de boa-fé o que faz com que o juiz puna esta infracção com 160 mil euros.

A parcela mais elevada nos 1.430.000 euros determinados a título de danos não patrimoniais, são 340 mil euros, uma compensação determinada por causa da divulgação de cinco emails que dizem respeito à celebração de contratos de bruxaria pelo Benfica e que “visavam claramente agredir a credibilidade comercial do Benfica”. O juiz considera que o motivo da divulgação foi “amesquinhar” e “gozar” com os concorrentes, uma publicitação que teve uma ampla cobertura mediática, nomeadamente internacional.

Apesar de considerar ilícita a posse por parte do FC Porto das comunicações electrónicas de um clube concorrente, o juiz reconhece que a divulgação de alguns emails poderia estar abrangida pelo interesse público “não fora a forma, o motivo e as datas como foram divulgados”. Por isso mesmo, nestes casos determina uma indemnização de 10 mil euros por cada divulgação individual destes emails.

Nuno Brandão, advogado que representa o FC Porto neste caso, disse ao PÚBLICO que o clube recorrerá desta sentença para o Tribunal da Relação do Porto, apontando algumas “incongruências” e “inconsistências” a esta decisão.

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