Sob pressão da Suécia, Portugal assina novo acordo fiscal

Crítico do regime de IRS português para os residentes não habituais, Estocolmo seguiu os passos de Helsínquia e forçou Lisboa a celebrar uma nova convenção.

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O acordo foi assinado à margem da reunião dos ministros das Finanças da UE LUSA/ARIS OIKONOMOU

O ministro das Finanças, Mário Centeno, e a homóloga sueca, Magdalena Andersson, assinaram nesta quinta-feira um novo acordo entre os dois países para evitar casos de dupla tributação. O novo texto foi celebrado à margem da reunião dos ministros das Finanças da União Europeia, em Bruxelas.

Lisboa negociou o novo texto sob pressão de Estocolmo (já depois de a Finlândia o conseguir), por causa do regime dos residentes não habituais. Na origem do descontentamento está a isenção de IRS (cá e lá) que alguns suecos conseguem ao terem este estatuto fiscal em Portugal.

O regime tem sido muito criticado e malvisto pelos dois países nórdicos do ponto de vista da justiça fiscal e da concorrência leal, olhado como um instrumento que distorce estes princípios no espaço europeu, pelo facto de alguns cidadãos nacionais, ao mudarem a residência para Portugal, ficarem a pagar um IRS mais baixo (de 20%) independentemente do nível de rendimentos ou de os pensionistas ficarem isentos de imposto.

Não será pelo número de suecos beneficiários em causa (cerca de 2300), mas por uma questão de princípio, que a Suécia levou Lisboa à mesa das negociações. Os contactos aconteceram ao longo de 2018. Segundo um comunicado do Ministério das Finanças, o novo acordo “acautela as principais preocupações de ambos os países”. O que isso significa, o gabinete do ministro não concretizou, estando por saber que margem poderá ganhar a Suécia para tributar os rendimentos.

Resta agora saber quando é que o texto é ratificado em Lisboa para poder entrar em vigor. É o segundo acordo que Lisboa é forçada a negociar com um país nórdico. O primeiro foi a Finlândia, ainda em 2016, mas apesar do tempo que já passou, o Governo de António Costa ainda não deu todos os passos necessários para que o documento entre em vigor. Helsínquia ratificou-o meses depois de o acordo ser alcançado e, perante a demora portuguesa, decidiu rasgar o anterior texto – que estava em vigor desde 1971 – e passar a tributar unilateralmente os pensionistas a partir de Janeiro de 2019.

O efeito prático será idêntico ao que conseguiu com o novo texto, mas a tomada de posição, ao rasgar a convenção histórica, é relevante e um passo inédito para uma convenção fiscal da Finlândia, segundo garantiu ao PÚBLICO em Dezembro uma fonte do Ministério das Finanças finlandês.

Bruxelas atenta

Na Suécia, o tema foi levantado durante a campanha das legislativas de Setembro, com Magdalena Andersson a falar do tema nos media nacionais e a congratular-se por ter conseguido levar Portugal a jogo.

Em Lisboa, o ministro das Finanças dizia há um mês ma entrevista na TVI que o Governo se preparava para levar a Conselho de Ministros uma alteração ao regime. Objectivo: torná-lo “mais activo na captação de qualificações”.

Por essa altura, a Comissão Europeia reagia a uma carta da eurodeputada Ana Gomes sobre as desigualdades criadas entre cidadãos, garantindo estar a analisar “cuidadosamente” as práticas fiscais agressivas na União Europeia. Gomes denunciara um “esquema de dumping fiscal” e apresentara alguns números divulgados pelo Governo.

Os dados conhecidos sobre o regime mostram um falhanço na captação de “cérebros”, com a esmagadora dos beneficiários a usufruírem de uma taxa especial de IRS sem exercerem uma “actividade de valor acrescentado”.

Dos 27 mil beneficiários, só pouco mais de dois mil (8%) desenvolvem uma actividade da lista oficial de profissões de elevado valor acrescentado; a larga maioria, 25 mil, surgem nas estatísticas divulgadas pelas Finanças como cidadãos “sem actividade de elevado valor acrescentado”.

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