Em busca da “invisibilidade” perdida dos pagamentos

A transformação do consumidor português tem sido também acompanhada por uma cada vez maior digitalização dos comerciantes.

Falar da revolução digital em Portugal, como algo que aí vem e para a qual nos devemos preparar, soa um pouco como aqueles avisos de mau tempo que recebemos no telemóvel quando, à nossa volta, já estão ramos e cadeiras a voar pelo ar. Não deixa de ser verdade, é apenas um pouco tarde.

Olhar para os nossos telemóveis é uma boa medida do que esta transformação já percorreu nas mãos (literalmente) do consumidor: mais de 70% dos portugueses já dispõem de um smartphone e utilizam a internet.

Esta transformação do consumidor português tem sido também acompanhada por uma cada vez maior digitalização dos comerciantes, visível no aumento do peso do comércio eletrónico (em 2017, mais de 35% dos portugueses fizeram compras online, embora 70% das mesmas ainda tenham sido em comerciantes estrangeiros), mas também na vulgarização da omnicanalidade, ou seja, na disponibilização pelos comerciantes originariamente tradicionais de apps, sites, páginas nas redes sociais, enfim, de vários canais que se vão revelando cruciais para continuar a atrair clientes e vender-lhes bens e serviços.

Para o ecossistema que serve este consumidor digitalizado o nível de exigência aumentou: a “jornada de compra” tem de ser mais integrada (entre canais), apelativa (convidando à compra por impulso, para evitar uma visita ao site do concorrente, que está lá sempre à distância de um clique) e assegurando a possibilidade de concluir a compra anytime, anywhere (em qualquer canal, em qualquer device, a qualquer hora).

Perante esta nova realidade, cabe aos prestadores de serviços de pagamentos garantirem o regresso da “invisibilidade” perdida dos pagamentos.

Há duas décadas, quando os canais de venda físicos (as velhas lojas) eram ainda quase exclusivos, os cartões asseguravam já uma desmaterialização do pagamento de tal forma cómoda e segura que a sua utilização e popularidade continuaram a crescer até hoje.

Sucede que a diversificação das jornadas de compra em contexto digital trouxe em paralelo uma maior diversidade nas preferências relativas à forma de pagar. Por vezes mais influenciados pela comodidade, outras vezes pela perceção de segurança, numa compra online ou in app, diferentes consumidores podem querer pagar de múltiplas formas, sendo necessário ao comerciante dispor de várias opções de pagamento, para que o mesmo se torne invisível aos seus olhos. Por invisível queremos dizer que, por um lado, está disponível o meio de pagamento que o consumidor prefere e, por outro, que está de tal forma bem integrado no fluxo da compra que é utilizado de forma simples e fluída.

No mercado português existem várias opções, algumas delas bastante entrosadas nos comportamentos dos portugueses: o pagamento de serviços, a possibilidade de emitir um cartão de crédito virtual com plafond limitado (um MB NET), a utilização de cartão de crédito online ou, mais recentemente, a possibilidade de utilização de wallets digitais (como o MB WAY) ou a realização de uma transferência imediata.

Pagar hoje utilizando apenas o telemóvel, em qualquer app ou site, ou até num qualquer terminal de pagamento físico (através de tecnologia contactless ou QR Code), parece extraordinariamente moderno. Mas o mercado não pára e não podemos baixar os braços, porque seguramente não ficaremos por aqui.

Se tiver de adivinhar algumas tendências, diria que o telemóvel será cada vez mais central (sem prejuízo do crescimento do uso de alguns wearables como o relógio, em segmentos específicos, como os desportistas), que os pagamentos serão cada vez mais instantâneos e que os comportamentos biométricos (não já a impressão digital ou facial, mas a forma única como usa e prime o ecrã quando está a usar o teclado) serão o novo padrão de segurança. Quem sabe? O que sabemos é que o pagamento deverá ser invisível e servir o consumidor. E não o contrário.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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