O Orçamento está aprovado

A notícia de que, pela primeira vez em quase dez anos, irá existir aumentos na função pública confirma-o.

Reserve as quintas-feiras para ler a newsletter de Ana Sá Lopes em que a política vai a despacho.

A notícia de que, pela primeira vez em quase dez anos, irão existir aumentos na função pública, confirmada na sexta-feira pelo primeiro-ministro, significa que o Orçamento do Estado está aprovado e que o Governo PS, em aliança parlamentar com PCP e Bloco de Esquerda, não cai antes das próximas eleições legislativas. Ainda que faltem muitos "procedimentos" a cumprir - fim das negociações, entrega do Orçamento a 15 de Outubro na Assembleia da República, discussão na generalidade, aprovação na generalidade, discussão na especialidade, votação na especialidade e finalmente votação final global no Parlamento - o sinal de que o acordo é irreversível foi dado.

A insistência com que durante o Verão inteiro, António Costa, Mário Centeno e responsáveis do PS proclamaram a impossibilidade da existência de aumentos na função pública (em tom de alta dramatização) permite agora aos partidos da esquerda reclamar uma vitória perante tantas derrotas passadas e, como isto é para durar mais um ano, também futuras. Fica por enquanto por saber até que ponto a dramatização do Governo e do PS à volta deste tema, insistindo ferozmente na impossibilidade de aumentos, serviu apenas como moeda de troca negocial - o que seria de resto bastante previsível.

Falta saber como serão os aumentos e qual será o universo dos abrangidos. Tanto quanto se sabe, Centeno adjudicou uma verba para aumentos e deixa aos partidos que escolham se querem dar menos aos que têm menos, aumentando o leque de abrangidos, ou dar mais aos que têm menos, diminuindo o universo dos funcionários que serão aumentados. A vitória da primeira hipótese é mais ou menos evidente: só os salários mais baixos da função pública serão aumentados.

Desaparecendo o fantasma sobre a aprovação do Orçamento (que não interessava de maneira nenhuma ao Bloco e ao PCP, já que previsivelmente só o PS beneficiaria de uma crise política), o último ano da "geringonça" corresponderá a um período intenso de campanha eleitoral. Falta um ano para as legislativas, nove meses para as eleições europeias. O que disse ontem Jerónimo de Sousa é um bom mote de campanha para a esquerda: "Não vale a pena o PS enfeitar-se com alguns dos avanços que foram alcançados nestes três anos. Avançou-se porque o PS não tinha os votos para sozinho impor a política que sempre, ao longo de quatro décadas, fez sozinho ou com o PSD e o CDS". A questão é se o eleitorado percebe quais foram as mudanças que Bloco e PCP forçaram o Governo a fazer. A seguir à débâcle das autárquicas, Jerónimo reconheceu que o eleitorado não teria percebido isso e em consequência privilegiara eleitoralmente apenas o PS. Arrumado o Orçamento, o desafio para os partidos à esquerda do PS neste ano eleitoral é altamente complexo.

Sugerir correcção
Ler 17 comentários