Tribunal ordena a demolição de 28 apartamentos em Albufeira

A câmara emitiu as licenças de utilização para habitações que o tribunal considerou ilegais e manda deitar abaixo. Na tentativa de travar o processo, a autarquia decidiu elaborar um plano de pormenor para a zona, ainda longe de vir a ser aprovado.

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Filipe Farinha/Stills

O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé voltou a mandar demolir 28 apartamentos no empreendimento Roja-Pé, nos Olhos d’Água, em Albufeira. Os proprietários começaram esta semana a receber as notificações dando conta que Ministério Público pediu a execução da sentença, já transitada em julgado. O Tribunal Central Administrativo do Sul não deu provimento ao recurso apresentado pela autarquia a pedir a revogação da sentença que deverá ser executada num prazo de 120 dias. No espaço que estava destinado à criação de uma zona de lazer, com piscina de uso colectivo, o construtor fez um bloco de apartamentos.

O licenciamento do edifício que ocupa o lote 5 da urbanização Roja-Pé foi declarado nulo pelo tribunal por violação do Plano Director Municipal (PDM). A ordem judicial é para deitar abaixo o bloco por inteiro. Pelas mesmas razões, o último piso do bloco situado no lote 4 também terá de ser demolido. Os proprietários não foram apanhados de surpresa, pois o caso arrasta-se desde 2013, quando a câmara retirou, por imposição judicial, as licenças de utilização que tinha emitido. Os condóminos vivem momentos de incerteza, com os bancos a pressionar o pagamento dos empréstimos.

O presidente da câmara, José Carlos Rolo [a exercer o cargo há quatro meses por falecimento do anterior titular], disse ao PÚBLICO que o município “ainda não foi notificado, embora tenha tido conhecimento que alguns proprietários” já receberam as cartas do tribunal dando conta que têm um prazo de 20 dias para contestar a acção da execução da sentença. “A câmara vai facilitar a apoio jurídico a quem necessitar”, adiantou. Entretanto, está em elaboração um plano de pormenor para a zona da Roja-Pé, no qual se prevê a manutenção dos apartamentos, construídos de forma ilegal em relação ao PDM.

A Câmara de Albufeira aprovou, por despacho do presidente da altura, Desidério Silva, o pedido de alterações ao projecto inicial para legalizar uma parte das obras que tinham sido feitas de forma clandestina. Por essa via, o empreendedor obteve o direito de aumentar a área de construção e o número de pisos. No lugar onde estava prevista a construção de uma piscina de uso colectivo e uma zona de lazer surgiu mais um edifício (lote 5) com 16 apartamentos. Os preços variaram conforme a localização. Um apartamento T1, com vista para o mar, foi comprado em 2007, com recurso a empréstimo bancário, por 138.600 euros. O proprietário não pode vender nem alugar, porque a licença de utilização foi invalidada em 2015, depois de o TAF de Loulé ter declarado a “nulidade das alterações ao alvará n.º 982 e as subsequentes autorizações de construção e de alteração aos projectos iniciais”.

O município recorreu da sentença para o Tribunal Central Administrativo do Sul, mas não teve acolhimento. Os juízes desembargadores não admitiram o recurso interposto por não ter sido usado o meio processual adequado. O acórdão transitou em julgado em 18 de Março de 2013 e a câmara tinha um prazo de oito meses para dar cumprimento à decisão judicial e “não foram apresentadas quaisquer causas legítimas de inexecução”, alegou o Ministério Público junto do TAF de Loulé, pedindo que a sentença seja executada num prazo de 120 dias. Os lesados tentaram junto da câmara fazer valer os seus direitos, alegando que compraram de “boa fé”, completamente alheios às ilegalidades praticadas. José Carlos Rolo justificou os licenciamentos do ex-autarca, actual presidente da Região de Turismo do Algarve, dizendo que “os despachos tiveram por base pareceres técnicos favoráveis, cujos fundamentos continuam a defender como sendo válidos”. Na próxima segunda-feira está agendada uma reunião, na câmara, para debater este assunto.

Para o empreendedor, Luís Canas, os problemas tiveram origem “numas queixas maldosas de pessoas que exigiam acesso à piscina do lote 5 alegando que estavam impedidas de o fazer, o que não era verdade”. Para que as queixas fossem retiradas, declarou, ofereceu “dois apartamentos a duas das queixosas, mais 50 mil euros a outra”. Uma vez alcançado o acordo entre os proprietários, a câmara desbloqueou o embargo das obras e deferiu o pedido de alteração do projecto inicial e do alvará. O tribunal veio a declarar a “nulidade” dos actos praticados.

O alvará desta urbanização vem dos anos 1979/80 e foi atribuído a um alemão, antigo proprietário do Hotel Alfamar. Luís Canas, empresário das Caldas da Rainha, pegou na obra em 2000, já com uma parte dos prédios construídos. Em vez da zona de lazer que estava prevista no lote 5, admitiu, fez um bloco de apartamentos. “Mas prescindimos de construir em três lotes onde havia uma zona de pinhal.” Nessa altura, recordou, “os presidentes da câmara tinham muito poder”, desabafou. É nesta altura que se afunda o Vale Navio, também em Albufeira — um dos maiores empreendimentos de time sharing. Cerca 8400 investidores, entre os quais 1600 portugueses, perderam aqui as suas poupanças, quando compraram semanas de férias em apartamentos e vivendas. A venda dos títulos de habitação periódica terá rendido 45 milhões de euros, circulando a maior parte do dinheiro por empresas offshore.

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