Dívida ao FMI fica com juros baixos e ainda há espaço para poupar mais

Do empréstimo inicial de 26.300 milhões de euros, Portugal vai ficar a partir desta quarta-feira a dever apenas 4600 milhões. Mas mesmo agora que as taxas estão mais baixas ainda pode fazer sentido pensar numa amortização antecipada.

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Mourinho Félix anunciou pagamento adicional ao FMI durante o primeiro dia de Mário Centeno como líder do Eurogrupo OLIVIER HOSLET/EPA

Depois de, nos últimos três anos, ter pago antecipadamente quase 22 mil milhões de euros, Portugal irá, depois de amortizar esta quarta-feira mais cerca de 800 milhões de euros, deixar de suportar, nos empréstimos concedidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), taxas de juro muito superiores às praticadas no mercado. A partir de agora, a dívida ao fundo fica reduzida a pouco mais de 4600 milhões de euros, um montante ao qual se aplicam taxas de juro que, embora ainda fiquem acima das conseguidas actualmente por Portugal junto dos investidores, são já bastante mais favoráveis.

Quando, na Primavera de 2011, o FMI concedeu a Portugal um empréstimo de 26.300 milhões de euros, as taxas de juro foram definidas de acordo com as regras da instituição: para o total do empréstimo aplica-se a taxa base dos direitos especiais de saque (DSE) calculada diariamente pelo fundo (e que neste momento é de 0,787%) acrescida de um spread de um ponto percentual. Depois, como penalização para os países que pedem empréstimos de grande dimensão, acrescentam-se ainda mais três pontos percentuais à taxa de juro aplicada ao valor do empréstimo que fique acima de 187,5% da quota do respectivo país no capital do FMI (o que no caso de Portugal corresponde a 4643 milhões euros, ao câmbio actual).

O que isto significa é que, ao longo dos últimos anos, Portugal suportou uma taxa mais baixa (actualmente na casa dos 1,8% quando calculada em DSE, e de 0,85% quando convertida em euros) para um valor equivalente a 4643 milhões de euros, e uma taxa de juro mais alta (actualmente na casa dos 4,8% em DSE e de 3,68% em euros) para o resto. No início, essa parte do empréstimo mais penalizada ascendia a mais de 20.000 milhões de euros, mas agora, até à amortização desta quarta-feira, era de unicamente 833 milhões, de acordo com os números fornecidos pelas Finanças.

No momento em que foi concedido o empréstimo, essas taxas de juro, embora já mais elevadas do que as praticadas nos empréstimos concedidos pela UE, eram muito mais favoráveis do que as praticadas nos mercados, que na altura estavam na prática fechados para Portugal. No entanto, a partir de 2014, Portugal voltou a conseguir ter acesso aos mercados e começou progressivamente a fazê-lo a taxas mais favoráveis do que as praticadas pelo FMI para a maior parte do seu empréstimo, algo que motivou os governos (o anterior e o actual) a seguirem a partir de 2015 uma estratégia de antecipação dos pagamentos ao fundo.

De acordo com os dados fornecidos pelo Ministério das Finanças, em 2015 foram amortizados 8488 milhões de euros, em 2016 mais 4496 milhões e em 2017 mais 10.013 milhões.  

Na segunda-feira, o secretário de Estado adjunto, Ricardo Mourinho Félix, anunciou no final da reunião do Eurogrupo que o Tesouro irá proceder esta quarta-feira à amortização de mais cerca de 800 milhões de euros, eliminando desse modo a parte do empréstimo a que ainda eram aplicadas taxas de juro mais elevadas.

O que fazer agora?

A questão que se coloca agora é se, depois da amortização desta quarta-feira, a estratégia de pagamento antecipado ao FMI chega ou não ao seu fim. Os responsáveis do Tesouro português dizem que tal irá depender das condições do mercado.

Olhando para os números actuais, é possível verificar que mesmo as taxas mais baixas que a partir de agora se vão passar a aplicar à totalidade do empréstimo do fundo são neste momento mais desfavoráveis do que as conseguidas por Portugal nos mercados. A maturidade média do FMI é de 4,5 anos e a taxa de juro aplicada é actualmente de 0,85% (quando convertida em euros), enquanto no mercado a taxa de juro implícita no prazo de cinco anos não vai além dos 0,37%. Será este motivo suficiente para continuar a amortizar rapidamente a dívida do FMI e a trocá-la por dívida obtida nos mercados?

Cristina Casalinho, presidente da Agência para Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP, reconhece, em declarações ao PÚBLICO, que as taxas no mercado continuam a ser mais baixas do que as do FMI, mas salvaguarda que “a continuação do reembolso antecipado do empréstimo ao FMI para além de 187,5% da quota deve ser, como tem sido até ao momento, equacionada por comparação com outras alternativas de utilização eficiente do saldo de tesouraria”. A responsável lembra que “têm de existir condições de mercado favoráveis à realização deste reembolso antecipado” e assinala que “os actuais níveis de taxas dos 5 anos justificam-se pelo presente enquadramento de taxas de juro na Europa, que pode alterar-se ao longo do tempo, porventura com a progressiva mudança no carácter da política monetária do BCE”.

Seja como for, antes de realizar qualquer nova amortização antecipada para além da realizada esta quarta-feira, o Governo terá de pedir autorização aos parceiros europeus para o fazer, já que a autorização já existente se esgota agora. Em relação a esta questão, fonte oficial do Ministério das Finanças afirma que “a solicitação de um novo pedido de autorização para reembolso antecipado deste empréstimo terá de ser equacionada conjuntamente com outras alternativas, de modo a avaliar qual a utilização dos excedentes de tesouraria mais eficiente”.

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