Inflação ainda não satisfaz, mas BCE deve anunciar menos estímulos já em Outubro

Apesar de reconhecer que o euro forte está a criar incerteza, presidente do BCE sinaliza que anúncio do início da redução dos estímulos pode já acontecer na próxima reunião do banco.

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Mario Draghi na conferência de imprensa desta quinta-feira em Frankfurt LUSA/ARMANDO BABANI

Nem a revisão em baixa da previsão para a inflação na zona euro nem o reconhecimento de que a apreciação da divisa cria um clima de instabilidade chegou para apagar dos mercados uma ideia que tem vindo a tornar-se cada vez mais forte nos últimos meses: a política monetária expansionista do BCE está mesmo prestes a começar a ser retirada.

Numa conferência de imprensa em que voltou a tentar passar a imagem de que o BCE será muito prudente na forma como irá retirar os estímulos à economia, Mario Draghi acabou ao mesmo tempo por confirmar as expectativas de quem antecipa que o banco central venha a reduzir, a partir de Janeiro, o seu programa de compra de activos.

O presidente do BCE disse que os diversos cenários (redução do volume de compras mensais e diminuição do tempo de duração do programa) já foram estudados na reunião desta quinta-feira e deixou no ar a promessa que as principais decisões serão anunciadas já na próxima reunião, agendada para 26 de Outubro.

Na sua declaração inicial, Draghi tinha repetido que a decisão ocorreria no Outono (o que significa que pode em teoria ocorrer, ou na reunião de 26 de Outubro ou na de 14 de Dezembro), mas depois disse aos jornalistas que “provavelmente a maior parte das medidas serão tomadas em Outubro”. “Vamos anunciar quando estivermos prontos, e acreditamos que vamos estar prontos para a maior parte das decisões em Outubro”, revelou.

Isto foi o suficiente para que, no mercados, à medida que Draghi falava, o euro continuasse a registar uma ligeira apreciação, atingindo os 1,20 dólares, um resultado que espelha a expectativa dos investidores relativamente a uma redução dos estímulos monetários na zona euro.

Aparentemente, os mercados ficaram pouco impressionados com o facto de Mario Draghi ter também assinalado que se sente uma “insatisfação generalizada” no conselho de governadores relativamente à inflação. O BCE apresentou novas previsões macroeconómicas e, apesar de ter revisto ligeiramente em alta as suas previsões para o crescimento, passou a apontar para uma inflação mais baixa e ainda mais distante do objectivo de médio prazo do BCE. Mantém a projecção de inflação 1,5% para 2017, mas baixa de 1,3% para 1,2% em 2018 e de 1,6% para 1,5% em 2019.

Porque é que isto acontece? O presidente assumiu que é precisamente por causa da apreciação do euro nos mercados, assinalando que este é um factor de instabilidade que terá necessariamente de ser levado em conta nas decisões que o BCE irá tomar. “A taxa de câmbio não é um objectivo de política monetária, mas é muito importante para o crescimento e para a inflação. É tão importante que fez com que a previsão da inflação fosse revista em baixa. E iremos levar isso em conta nas nossas decisões de política monetária”, afirmou.

Com a declaração de que o BCE continua insatisfeito com a evolução da inflação e repetindo, sempre que lhe era possível, que as taxas de juro se irão manter baixas durante o período longo de tempo, Draghi tentou, como tem feito nos últimos meses, passar a mensagem de que um futuro anúncio de redução dos estímulos será sempre feito de forma muito prudente.

Ainda assim, continua a subsistir o receio de que uma reacção demasiado negativa dos mercados, nomeadamente por via de uma apreciação ainda mais forte do euro, possa colocar em causa o ritmo de retoma da economia e a saída da zona de perigo em relação à inflação.

Para Portugal, que é um dos países que mais pode ter a perder com o fim da intervenção do BCE nos mercados de dívida, o anúncio de uma redução do program pode ter efeitos negativos. No entanto, a verdade é que desde o final do ano passado que o volume de compras de dívida pública portuguesa por parte do BCE já tem vindo a diminuir de forma muito acentuada, por causa dos limites auto-impostos pelo BCE à percentagem de títulos que pode deter de um determinado país.

Em relação a esta limitação, Mario Draghi voltou na conferência de imprensa a afirmar que o BCE não planeia qualquer alteração de regras, o que significa que as compras de dívida portuguesa continuarão a ser feitas a um nível menor do que aquele que resultaria da aplicação do peso do país no capital do BCE.

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