Dez livros do dia a não deixar escapar

Os “livros do dia” são como as promoções de vinhos nos hipermercados: alguns valem mesmo a pena, outros nem dados. Escolhemos uma dezena de títulos que pode comprar à confiança e a bom preço na 87.ª edição da Feira do Livro de Lisboa, que termina no dia 18 de Junho.

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Marcelo Rebelo de Sousa numa visita à Feira do Livro de Lisboa no dia da inauguração LUSA/NUNO FOX

Os “livros do dia” são como as promoções de vinhos dos hipermercados: podemos levar para casa uma belíssima pomada a metade do preço ou descobrir que comprámos uma zurrapa que não beberíamos nem dada. Aqui sugerimos dez francamente potáveis e que estarão como Livro do Dia na Feira do Livro de Lisboa, que encerra a 18 de Junho. Leve-os à confiança: alguns terão uma pontinha de acidez, mas nenhum é feito a martelo. É claro que poderíamos ter escolhido outros, da Divina Comédia de Dante ao Moby Dick de Melville, da Metamorfose de Kafka à Lolita de Nabokov, todos tão obviamente recomendáveis que quase não vale a pena recomendá-los.

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Álvaro Cunhal – Uma Biografia Política (4 volumes)

José Pacheco Pereira

Temas e Debates

Livro do Dia — 5, 6 e 9 de Junho

46,3 € os quatro volumes (PVP: 84,10 €)

A monumental biografia do líder histórico do PCP é um desses raros livros que representam o trabalho de uma vida. Mais do que o relato da vida política de Cunhal, a obra de Pacheco Pereira é uma história do PCP e um documento fundamental para o conhecimento de uma parte pouco contada da história portuguesa do século XX. Pode agora conseguir a bom preço os quatro volumes já publicados, mas dá algum trabalho. Terá de comprar esta segunda-feira o tomo inicial (pensar que já saiu em 1999!), voltar amanhã para adquirir o segundo, e regressar dia 9 para levar o quarto. O terceiro terá de o comprar só com o desconto de feira. Tudo somado, fica com 2586 páginas para se entreter enquanto espera pelo quinto volume.

 

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Winston Churchill – Uma Vida

Martin Gilbert

Bertrand

Livro do Dia — 7 de Junho

 14,95 € (PVP: 29,90 €)

É a versão condensada (mas ainda assim com um milhar de páginas) da magistral biografia de Winston Churchill do historiador britânico Martin Gilbert (1936-2015). Churchill ainda estava vivo quando, em 1962, o seu filho Randolph, que preparava a biografia do pai, convidou o jovem professor de Oxford a colaborar no projecto. Mas quando Randolph Churchill morreu, em 1968, só os dois primeiros tomos estavam prontos. Gilbert ficou encarregado de concluir a obra, que acabaria por ter oito volumes, cada um deles acompanhado por vários anexos documentais, num total de mais de 25 mil páginas. Um gigantesco trabalho de décadas que o historiador conseguiu resumir neste seu livro de 1991.

 

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A Terceira Miséria

Hélia Correia

Relógio D’Água

Livro do Dia — 7 de Junho

 6 € (PVP: 10 €)

Com a troika em Portugal e a Grécia a ser destruída e humilhada pelas imposições austeritárias de Bruxelas, Hélia Correia publicou em 2012 o poema A Terceira Miséria, confirmando que a romancista de Lillias Fraser e Adoecer foi também sempre um magnífico segredo escondido da poesia portuguesa contemporânea. Em assumido diálogo com esse compatriota de Schäuble que amou a Grécia com uma paixão sem igual, o poeta Friedrich Hölderlin, Hélia Correia retoma logo a abrir a nunca desactualizada questão colocada pelo autor da elegia Pão e Vinho: “Para quê, perguntou ele, para que servem/os poetas em tempo de indigência?”. Este longo poema em 32 partes é uma reivindicação do humano em tempos sombrios.

 

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Franny e Zooey

J. D. Salinger

Quetzal

Livro do Dia — 8 de Junho

7,45 € (PVP: 14,90 €)

À Espera no Centeio (1952) é tão célebre que pode correr o risco de transformar J. D. Salinger no autor de um só livro, o que seria particularmente injusto para o divertidíssimo Franny e Zooey, protagonizado pelos dois irmãos mais novos da numerosa prole da família Glass, que surge em várias histórias do autor. Exasperada com a futilidade de tudo o que a rodeia, namorado incluído, a jovem Franny volta-se para a espiritualidade. Zooey, por sua vez, está na banheira a reler uma velha carta do seu irmão Buddy quando a mãe entra para lhe confiar a sua aflição com a crise que Franny atravessa. Reunião de um conto e de uma novela originalmente publicados na New Yorker, o livro saiu em 1961. É uma pequena maravilha.

 

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Os Sertões

Euclides da Cunha

Glaciar

Livro do Dia — 9 de Junho

 27,56 € (PVP: 55,12 €)

É o mais inclassificável dos clássicos de língua portuguesa. Reportagem, romance pré-modernista, tratado de geografia, ensaio sociológico e antropológico, obra historiográfica, uma epopeia comparável à Ilíada, como pretendeu o crítico literário Alexei Bueno? Os Sertões, que agora podem ser lidos nesta cuidada edição prefaciada e anotada por Leopoldo M. Bernucci, são provavelmente tudo isso, além de nos oferecerem um espantoso relato da chamada Guerra de Canudos, que no final do século XIX opôs o Exército brasileiro ao movimento popular dirigido pelo líder messiânico Antônio Conselheiro. Um episódio que fascinou muitos autores, incluindo o peruano Mario Vargas Llosa, que lhe chamou A Guerra do Fim do Mundo.

 

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A Condição Humana

Hannah Arendt

Relógio D’Água

Livro do Dia — 12 de Junho

12 € (PVP: 20,19 €)

Um bom companheiro para A Terceira Miséria de Hélia Correia é este livro que Hannah Arendt publicou em 1958, e que justamente traça a história da condição humana desde a Grécia antiga até à Europa moderna. Ao cidadão ateniense, cuja liberdade se exercia agindo na esfera pública, intervindo nos assuntos da cidade, contrapõe-se um homem moderno que se vai tornando cada vez mais alienado e apolítico. E não há verdadeira democracia sem um espaço público participado e plural. “De vez em quando encontro livros que me dão a sensação de terem sido escritos para mim... A Condição Humana pertence a esse pequeno e seleccionado género”, escreveu o grande poeta inglês W. H. Auden.

 

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Crime Num Quarto Fechado

Hans Olav Lahlum

ASA

Livro do Dia — 12 de Junho

8,30 € (PVP: 13,90 €)

Para quem já percebeu que não é Henning Mankell quem quer e começa a ficar um bocado farto desta onda de policiais escandinavos, com os seus enredos deprimentes e os seus detectives realistas, este livro  do norueguês Hans Olav Lahlum, publicado na recomendável colecção Crime à Hora do Chá, é uma lufada de ar fresco. Um herói da resistência ao nazismo é assassinado na sua sala de estar e o jovem e zeloso inspector Kolbjørn Kristiansen vê-se às aranhas para deslindar o crime. Salva-o a ajuda inestimável, se bem que um tanto embaraçosa, de Patricia Borchamnn, uma rapariga de 18 anos confinada a uma cadeira de rodas. Patricia sai tão pouco de casa como Nero Wolfe e tem células cinzentas dignas de um Poirot. 

 

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O Monte dos Vendavais

Emily Brontë

Presença

Livro do Dia — 13 de Junho

 9,65 € (PVP: 16,15 €)

O fulgurante talento literário das três irmãs Brontë é um dos mais desconcertantes enigmas da história literária. Mas Emily Brontë, que morreu aos 30 anos e viveu numa quase completa reclusão, é um mistério por direito próprio. E o protagonista do seu único livro (mas que livro!), o demoníaco Heathcliff, brutal, agreste, apaixonado, mas capaz de planear a sua vingança a frio, é um abismo ainda mais insondável. Até a brilhante irmã mais velha de Emily, Charlotte, se assustou com o negrume selvagem de Heathcliff. E quando o livro saiu, em 1847, assinado por um pseudónimo masculino, a Graham’s Lady Magazine questionou-se: “Como é que um ser humano pôde cometer um livro como este sem se suicidar antes de concluir uma dúzia de capítulos?”    

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Da Democracia na América

Alexis de Tocqueville

Relógio D’Água

Livro do Dia — 14 de Junho

23 € (PVP: 38,36 €)

Com o mundo de respiração suspensa à espera do próximo desvario de Trump, pode ser reconfortante ler este clássico de Alexis de Tocqueville, editado pela primeira vez em 1835, e que resultou de uma viagem de nove meses pelos Estados Unidos, onde o aristocrata francês chegou em 1831, enviado pelo Governo francês para estudar o sistema prisional americano. O Presidente americano da época era curiosamente Andrew Jackson, o antecessor no qual Trump mais se revê. O que impressionou Tocqueville foi, acima de tudo, a enérgica participação dos cidadãos na vida política da nação: “Até parece que o único prazer que o americano conhece é tomar parte no governo e discutir as suas medidas”.

 

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Dicionário de Lugares Imaginários

Alberto Manguel e Gianni Guadalupi

Tinta da China

Livro do Dia — 16 de Junho

17,66 € (PVP: 29 €)

Da Utopia de More à Terra Média de Tolkien, da Atlântida, a que Platão alude no Crátilo, ao maravilhoso mundo de Oz, de Frank Baum, da Lilliput de Swift ao País das Maravilhas de Lewis Carroll, da Terra do Nunca de J. M. Barrie à Terramar de Ursula K. Le Guin, da Xanadu de Coleridge à Narnia de C. S. Lewis, o Dicionário de Lugares Imaginários é uma extraordinária obra de referência, que descreve quantos lugares a imaginação humana criou com o mesmo rigor com que uma boa enciclopédia descreveria países e cidades reais. Redigido pelo argentino Alberto Manguel com a ajuda do tradutor, editor e bibliófilo italiano Gianni Guadalupi, este dicionário dá bem a medida da erudição e do talento do autor de Uma História da Leitura.

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