Caos no aeroporto de Lisboa provocado por “falha técnica grave” das empresas

Relatório da ENMC aponta falhas ao agrupamento formado pela Galp, Oz Energia, BP e Repsol. TAP foi “lesada fortemente” e quer compensações.

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Falhas no abastecimento de combustível afectaram quase 42 mil passageiros e 300 voos NUNO FERREIRA SANTOS

Os dois dias de confusão instalada no aeroporto de Lisboa, que afectaram quase 42 mil passageiros, ficaram a dever-se a uma “falha técnica grave” no sistema de abastecimento de combustível explorado pelo Grupo Operacional de Combustíveis (GOC), formado pela Galp, Oz Energia, Repsol e BP.

As conclusões constam no relatório da Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis (ENMC) sobre o incidente que obrigou a cancelar quase uma centena de voos entre 10 e 11 de Maio. De acordo com o documento a que o PÚBLICO teve acesso, a ENMC atribuiu o problema à falha no funcionamento de um dos elementos do sistema de aspiração e bombagem, mais especificamente do braço móvel articulado que faz a aspiração de combustível do reservatório de armazenamento.

Como o movimento do braço articulado falhou e não acompanhou a descida do líquido no reservatório, ficou a aspirar em seco, provocando a entrada de ar no sistema de bombagem de combustível, descreve o relatório, que foi enviado à secretaria de Estado da Energia. Para a ENMC “resulta evidente” que os problemas de abastecimento no aeroporto “tiveram por base uma falha técnica grave, potenciada pela ausência de uma correta monitorização e alerta que, a existir, teria evitado a entrada de ar no equipamento de bombagem”.

Além das “deficiências no sistema de monitorização e alerta”, a ENMC também destaca a “inexistência de redundâncias no sistema de aspiração e bombagem”, bem como o “deficiente programa de manutenção em componentes críticos do sistema”. Questionado sobre estas conclusões, o GOC sublinhou não ter "conhecimento de qualquer relatório produzido pela ENMC” sobre as perturbações no aeroporto, “pelo que não pode tecer comentários”. O incidente “está a ser presentemente analisado pelas entidades relevantes, não tendo ainda sido alcançadas conclusões”, disse ao PÚBLICO fonte oficial do agrupamento.

A Galp e a Oz Energia têm ambas 33,3% desta entidade, que opera nos aeroportos de Lisboa e Faro, enquanto a BP e a Repsol têm cada uma 16,6%. A gestão é rotativa entre os participantes do GOC, pelo que neste momento a Galp tem a gestão em Lisboa e a Repsol em Faro, apurou o PÚBLICO.

Além das questões relacionadas com as falhas no abastecimento, a ENMC concluiu que a licença de actividade do GOC é a de “armazenamento de produtos de petróleo para consumo próprio”, enquanto a actividade efectivamente exercida é a de “abastecimento de combustíveis a aeronaves”. Esta irregularidade é punível com coimas entre 3740 e 44.890 euros, os mesmos montantes aplicados a outras duas falhas nas obrigações de registo e reporte junto da ENMC que esta entidade diz também ter detectado.

O relatório já foi alvo de despacho do secretário de Estado da Energia, que o reenviou para a ENMC, mas também para a DGEG, solicitando “a actuação nos termos legais”. Além disso, o governante enviou-o para a Autoridade da Concorrência e para Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (que vai passar a regular o sector dos combustíveis) para “eventual actuação no âmbito das suas competências de regulação”.

TAP avalia danos

O departamento de comunicação da ANAC (Autoridade Nacional de Aviação Civil) adiantou ao PÚBLICO que “o processo de averiguações está em curso e demorará tempo”, pelo que não podem ser avançadas mais informações. Na semana passada, o presidente da ANA – Aeroportos de Portugal, Carlos Lacerda, anunciou que tinha sido pedido ao Ministério Público uma investigação sobre a falha no abastecimento.

De acordo com os dados mais recentes avançados pelo director da ANAC, a falha no sistema de abastecimento de combustível no aeroporto de Lisboa a 10 de Maio afectou, pelo menos, 41.681 passageiros, na sequência de mais de três centenas de voos afectados. Se o problema foi causado por “circunstâncias extraordinárias” alheias às transportadoras aéreas, estas não são obrigadas a pagar indemnizações aos passageiros desde que lhes tenham prestado apoio.

“Não é responsabilidade da TAP nem das outras companhias não ter havido capacidade de abastecimento no aeroporto”, explica o assessor da transportadora, André Serpa Soares, garantindo que a TAP “cumpre escrupulosamente os regulamentos e as leis aplicáveis”.

O assessor refere ainda que está a ser avaliado o valor total dos danos à companhia, que foi “lesada fortemente” pela protecção que teve de fazer ao cliente (refeições, alojamento, integração nos voos e funcionários a trabalhem fora dos períodos previstos). O valor destes prejuízos provocados às companhias será “assumido pela entidade responsável pela falha, que ainda não se sabe quem é”, acrescenta. O PÚBLICO tentou contactar outras transportadoras, como a Ryanair e a easyJet, mas não obteve resposta.

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