Governo anterior não quis "privatizar a Caixa"

Maria Luís Albuquerque garante que não favorece a Arrow Global, onde trabalha por ter sido ministra com a tutela da CGD. E disse que se "tivesse mais tempo e mais dinheiro era possível fazer muito mais".

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Nuno Ferreira Santos

A ex-ministra das Finanças negou esta quinta-feira que o anterior Governo tenha promovido uma recapitalização insuficiente da Caixa Geral de Depósitos, tendo em vista a sua futura privatização. “O Governo não tomou nenhuma iniciativa para iniciar a privatização da Caixa”, disse Maria Luís Albuquerque na comissão de inquérito à gestão da CGD. Mais tarde ironizou com o facto de a esquerda a questionar sobre nada ter feito depois de 2014 quando em 2017 ainda nada foi feito.

"A sério? Está a perguntar-me em 2017, quando a recapitalização da CGD ainda não foi feita, porque não a fiz em 2014?", questionou em resposta ao deputado do BE, Moisés Ferreira, que queria saber por que razão o Governo anterior não agiu depois dos constantes alertas da comissão de auditoria interna da CGD após o primeiro trimestre de 2014. A ex-ministra contou ainda que teve uma reunião no início de 2015 com o presidente da CGD que lhe disse que o banco público "poderia não ter condições para devolver os instrumentos híbridos [Cocos] até Junho de 2017 e que era matéria que seria avaliada a seu tempo. Sendo que o tempo era o ano de 2016", disse.

Nas respostas ao deputado, Maria Luís Albuquerque explicou sobretudo o processo de recapitalização de 2012 e defendeu que a recapitalização, decidida por Vítor Gaspar, foi aquela que o supervisor, o Banco de Portugal, defendeu. 

"Para a CGD foi feita uma análise e foram identificadas as necessidades de reforço de capital. Portugal entrou numa situação de pré-bancarrota, que teve impacto na actividade económica, e o conjunto de operações da CGD perdeu valor e foi necessário reforçar o capital. O supervisor fez a avaliação da necessidade de capital para que o banco funcionasse com normalidade e chegou ao valor de 1650 milhões de euros", disse Maria Luís Albuquerque.

O deputado do BE insistiu na ideia, defendendo que a recapitalização da CGD foi "pelos mínimos" e questionou Maria Luís Albuquerque sobre o porquê de o Governo não ter decidido por uma "almofada financeira para absorver impactos de uma crise".

A ex-ministra justificou, dizendo que o país vivia com "restrições" e que parte dos compromissos em relação à CGD estava inscrita no memorando de entendimento assinado com a troika. "Se tivesse mais tempo e mais dinheiro era possível fazer muito mais. Os recursos eram muito escassos. Fazer a constitiuição de almofadas de capital que não foram identificadas pelo supervisor daria a sensação de que a discussão podia fazer-se dizendo que não havia restrições ou que as decisões eram tomadas como se as restrições não existissem", defendeu. Mais tarde acrescentou a ideia de que a crise era forte e não havia espaço, "como há" para o Governo actual, que considera ter um mais liberdade do que o executivo da altura.

Já em resposta ao deputado do CDS, João Almeida, Maria Luís Albuquerque explicou que o plano de recapitalização foi ajustado ao longo do tempo em que foi sendo implementado.

A ex-ministra das Finanças recusou que o Governo não tenha feito qualquer auditoria à Caixa Geral de Depósitos, dizendo que em 2014 a CGD foi abrangida por uma auditoria mais vasta das instituições europeias e que "evidenciava rácios superiores aos exigidos quer num cenário normal quer de stress". "Dizer que não foi feita uma auditoria simplesmente não corresponde à verdade. Houve múltiplas auditorias que tornavam desnecessário que o Ministério das Finanças fizesse outra por cima”, defendeu

"A CGD sempre cumpriu todos os rácios de capital e sempre passou em todas os testes e auditorias", garantiu.

Ex-ministra questionada sobre Arrow

A ex-governante negou que o seu trabalho na financeira Arrow Global seja favorecido por dispor de dados relativos a créditos e participações da Caixa Geral de Depósitos de que tenha tomado conhecimento enquanto ministra das Finanças. Disse aliás que não tem informações privilegiadas: "Não tenho informação nem nunca tive sobre créditos da CGD", disse aos deputados.

Maria Luís Albuquerque respondia a uma pergunta do deputado do PCP, Miguel Tiago, que quis saber que "garantias" podia a ex-ministra dar aos deputados que "não há forma de a Arrow Gobal ou subsidiárias poder de alguma forma usufruir dessa sabedoria?". 

Na resposta, Maria Luís Albuquerque, agora deputada do PSD, pediu ao PCP que esclarecesse se o partido tinha feito alguma queixa junto do Ministério Público e se já tinha tido alguma resposta sobre o assunto: "Gostaria de saber se o PCP fez queixa ao Ministério Público, porque não voltámos a ter notícias sobre isto. Até agora ficou apenas a suspeita que lançaram sobre mim", disse.

Sobre a substância do assunto em causa, a ex-governante do PSD respondeu que, enquanto ministra, não teve "informação sobre créditos da CGD". "Não tenho nem nunca tive. Nunca teria a capacidade de fazer aquilo que me questionou. Não tenho essa informação, não tinha capacidade para fazer alguma análise como sugeriu. E como tive ocasião de referir, as minhas funções na Arrow Global são desempenhadas junto da cabeça do grupo em Inglaterra e não incluem estes negócios. Não tenho qualquer envolvimento em decisões desta natureza sobre que carteiras de crédito são compradas", garantiu.

Já sobre o período em que foi ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque assegurou: "Nunca interferi em nenhum negócio da Caixa".

Antes, o deputado do CDS João Almeida tinha questionado a ex-ministra sobre a notícia do PÚBLICO segundo a qual relatórios da Inspecção Geral de Finanças sobre as contas da Caixa não tinham sido despachados pelo seu secretário de Estado das Finanças, Manuel Rodrigues. A ex-ministra defendeu a acção do ex-secretário de Estado, dizendo que tratou sempre dos assuntos com diligência e que os relatório em causa tinham informação que se tornou "desactualizada por ter chegado informação posterior". "Essa informação chegou ao Ministério das Finanças já depois de terem sido remetidas ao accionista as contas anuais auditadas. A informação [da IGF] estava ultrapassada e sem relevância", disse.

Notícia actualizada: Parágrafos 11 a 18 acrescentados às 20h

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