O que (também) se vai discutir no Parlamento em 2017

Deputados têm assuntos a que não poderão fugir no próximo ano: da descentralização à eutanásia, passando pelas questões laborais e da banca. O quotidiano do país ditará o resto.

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Rui Gaudencio

Há assuntos incontornáveis para os deputados em 2017, seja porque a sua discussão se arrastará deste ano para o próximo, como é o caso do novo regime da transparência ou da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos, seja porque são matérias em que algumas bancadas prometem apostar nos próximos meses, como a eutanásia ou a descentralização autárquica.

Tendo em conta a natureza também reactiva da Assembleia da República, é de esperar que durante o ano cheguem assuntos a que os deputados se vejam obrigados a dar resposta. Veja-se, por exemplo, os casos recentes da polémica com as declarações de rendimentos e património dos gestores da Caixa Geral de Depósitos, da nacionalização do Banif que motivou a criação de uma comissão de inquérito, da prospecção de petróleo no Algarve, ou ainda dos direitos dos animais (este último caso derivou de uma petição).

Descentralização autárquica

Depois de uma tentativa de lançar a discussão no Orçamento do Estado para 2017, mas sem sucesso, o PSD voltará a apresentar as propostas sobre a descentralização de competências das autarquias. Um dossier a que Pedro Passos Coelho é muito sensível e que foi o único a aproximar até agora o PSD ao PS. O primeiro-ministro vai levar propostas ao Parlamento e Passos Coelho já se comprometeu em dar contributos e em envolver o partido no debate, mesmo depois de os socialistas terem chumbado as intenções do PSD para reforçar o financiamento e as competências das autarquias.

O debate não se avizinha pacífico, tendo em conta o apoio dos partidos da esquerda ao Governo (o PCP tem forte implantação autárquica) e também porque 2017 é ano de eleições para municípios e juntas de freguesia. António Costa quer que a reforma seja aprovada antes das autárquicas. Se esse calendário for cumprido “serão os autarcas eleitos no final de 2017, e não o Governo, a escolher os próximos responsáveis das CCDR [Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional]”, afirmou o primeiro-ministro na passada semana.  

Legislação laboral

Os partidos à esquerda do PS têm no combate à precariedade uma das suas bandeiras eleitorais e o primeiro-ministro já garantiu várias vezes tanto a Jerónimo de Sousa como a Catarina Martins que esta é uma matéria que também o preocupa, prometendo mesmo que o Governo se empenhará nela. Aguarda-se o estudo que o executivo ficou de fazer sobre a precariedade na administração pública, mas também o Livro Verde das Relações Laborais (uma análise sobre todo o mercado de trabalho) que já terá chegado aos parceiros sociais e que motivará propostas legislativas de BE, PCP e PEV.

Entretanto, estes partidos querem já marcar terreno, tendo agendado para Janeiro a discussão de propostas de alargamento das férias para 25 dias úteis e a consagração do dia de Carnaval como feriado – que já têm chumbo garantido dos socialistas. Mas mais se seguirá, já que comunistas e bloquistas querem “retirar a troika” da legislação laboral, ou seja, revogar as mexidas de PSD/CDS no Código do Trabalho. Entre as medidas estará o aumento das compensações dos trabalhadores em caso de despedimento, acabar com a caducidade da contratação colectiva e reforçar os mecanismos previstos nela, repondo o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, aumentar as retribuições pelo trabalho extra (horas extraordinárias, fins-de-semana, feriados), e a integração nos quadros dos precários da função pública.

Eutanásia

Com a incógnita da liberdade de voto em alguns partidos – caso do PSD e do PS – a questão da eutanásia pode marcar a agenda parlamentar. Há uma petição a favor da despenalização da eutanásia que vai ser debatida em plenário e embora as petições não sejam votadas, o BE e o PAN já prometeram apresentar projectos de lei associados. Essas iniciativas vão suscitar o debate e uma contagem de deputados já que a liberdade de voto na bancada social-democrata – independentemente da posição oficial do partido – pode baralhar o resultado da votação, como aconteceu nas chamadas “barrigas de aluguer”. Até esse momento, os sociais-democratas vão debater o tema numa conferência com especialistas, em Janeiro, para permitir um voto informado.

Serviços públicos

Os serviços públicos, sobretudo nas áreas da educação e saúde, são matérias que todas as bancadas puxam para debater em plenário da Assembleia da República e pelo menos o BE já anunciou que pretende combater veementemente as PPP – Parcerias Público-Privadas na Saúde em 2017. As notícias recentes de problemas sucessivos no funcionamento de escolas e no atendimento hospitalar levarão com certeza os dois assuntos ao Parlamento pela mão não só da oposição mas também dos partidos à esquerda que apoiam o Governo.

Transparência

Criada em Abril, a comissão parlamentar para o reforço da transparência no exercício de funções públicas já fez as audições que pretendia e encontra-se agora na fase da compilação das quase duas dezenas de propostas de diplomas apresentados por todos os partidos e que dizem respeito a diversas matérias, desde o estatuto dos deputados (onde se incluem as incompatibilidades) ao regime de lobbying, do controlo público da riqueza dos cargos públicos e políticos ao regime de prevenção e enriquecimento injustificado e o combate à corrupção. Toda a discussão de fundo será feita ao nível desta comissão, que depois apresentará os diplomas ao plenário. É de esperar que os trabalhos se prolonguem pelo menos até ao final da actual sessão legislativa.

Ainda a banca

Depois das sucessivas interrupções e mesmo que seja pedido um alargamento do prazo, os trabalhos da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos deverão ficar terminados ainda na Primavera. É expectável que, a par da (sempre polémica) discussão final do relatório da comissão, o Parlamento venha a debater e votar propostas dos vários partidos para apertar a malha à banca, e que PCP e Bloco insistam na nacionalização do sector.

Renegociação da dívida

O primeiro-ministro empurrou a possibilidade de se discutir a renegociação da dívida a nível europeu depois das eleições alemãs do próximo ano e BE e PCP viram nisso uma abertura de António Costa para começar a olhar para o problema. Os comunistas vão lançar já em Janeiro uma campanha sobre a necessidade de Portugal sair do euro e renegociar a dívida, que se estenderá até Junho. No Parlamento, no âmbito do acordo assinado em Novembro de 2015, BE, PS e Governo criaram vários grupos de trabalho, sendo um deles precisamente para debater a dívida, esperando-se conclusões a médio prazo. 

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