Cibercrime e “ciberignorância”

É urgente promover a capacidade de todos e de cada um para lidar com um ataque eminente, para reconhecer as técnicas mais comuns empregues pelos cibercriminosos.

Multiplicam-se as burlas informáticas e as fraudes financeiras à escala internacional. O cibercrime é um “fenómeno em galopante crescimento”. Estima-se que em 2015, à escala global, 549 milhões de pessoas foram vítimas de crime online. Esta tendência verificou-se também entre nós. De acordo com a Procuradoria-Geral da República “os crimes contra infra-estruturas tecnológicas (contra a confidencialidade, integridade e disponibilidade de sistemas e dados) têm registado um significativo crescimento, pondo em causa o funcionamento de diversas instituições, públicas e privadas.”. Dados da comarca de Lisboa indicam que em 2015 foram instaurados 2528 inquéritos, dos quais 1984 com arquivamento e 44 com acusação. O que confirma também a dificuldade da sua repressão, muitas vezes devido à falta de meios de prova.

Destaco que o impacto do cibercrime traduz-se na ordem dos milhões de dólares, na destruição de empresas, de reputações – pense-se no roubo de identidade –, bem assim na difusão no público de uma espécie de receio mental, que afecta a confiança nas estruturas informáticas, em especial na banca digital, além de outros malefícios. Entre estes destaco os que afectam directamente a esfera da vítima, como os de natureza financeira e emocional, em particular os que abalam a sua vivência e relações interpessoais por perda de confiança em si e nos outros, incluindo no seu círculo pessoal mais restrito. Sublinho que o cibercrime é crescentemente utilizado para fins de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo e outros fluxos financeiros ilícitos, designadamente através de pequenas transacções financeiras, que podem passar despercebidas ao titular da conta.

As empresas e, em especial, o sector bancário e os seus clientes estão especialmente expostos a este tipo de criminalidade. A prevenção é central, posto que o cibercrime está também relacionado com o facto de as rotinas e os hábitos de vida quotidianos sinalizarem uma generalizada falta de sensibilidade para a sua perigosidade ou para cuidados de cibersegurança. No plano das pessoas predomina a ideia que “A mim isso não acontece”, bem assim os hábitos de vida que porventura sinalizam descuido e até falta de sentido de responsabilidade para a importância dos procedimentos de cibersegurança, em particular no que respeita aos códigos de acesso/password ou rotinas de controlo efectivo dos movimentos no extracto/saldo bancário.

No plano das empresas existe muitas vezes falta de investimento em segurança, falta de consciencialização para questões de segurança informática ou dos perigos envolvidos, falta de formação dos colaboradores, ou deficiências na análise de risco. Acresce ao que ficou dito que a actividade das autoridades públicas, em especial daquelas com atribuições de regulação e supervisão, não terá ainda atingido o grau de preparação e envolvimento adequado, por exemplo, através de acções de difusão de esclarecimentos e campanhas de (in)formação no sentido de identificar massivamente as populações com a perigosidade deste fenómeno criminoso e de serem adoptados generalizadamente comportamentos de cibersegurança. Basta para o demonstrar verificar a informação disponível no sítio do Banco de Portugal.

No sentido de favorecer um combate eficaz ao cibercrime é decisivo a boa compreensão deste fenómeno criminoso que ataca tudo e todos, e que em muitos casos é perpetrado por organizações criminosas altamente organizadas e que operam à escala internacional com meios de grande fôlego.

É urgente ultrapassar a fase actual de generalizada “ciberignorância” da sociedade no que respeita à perigosidade do cibercrime que cria vulnerabilidades que são reais, assim como é urgente promover a capacidade de todos e de cada um para lidar com um ataque eminente, para reconhecer as técnicas mais comuns empregues pelos cibercriminosos, os “sintomas” de ataque, ou como reagir a um. Devido a isto é de vital importância criar campanhas de informação públicas dirigidas a valorizar a importância de serem interiorizadas nas rotinas de cada um procedimentos de cibersegurança. Por exemplo: sabe o que é o cibercrime? Tem uma chave para cada fechadura? E para cada conta de e-mail, bancária, gadget tem uma password? E há quanto tempo não muda cada password? Verifica os movimentos do seu extracto bancário? E acede a filmes/livros gratuitos na net cujo acesso depende do envio de dados pessoais? Sabe o que é botnet? Em caso de ataque sabe o que fazer e a quem recorrer?

Advogado, especialista em direito fiscal

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