Para a francesa Saint Gobain a casa do futuro vai ter telhado de vidro

Entre 2008 e 2015 a facturação da multinacional fundada há 350 anos caiu 30% em Portugal. Com a construção a dar sinais de vida, a Saint Gobain diz que o próximo ano será de recuperação, com a inovação a mostrar caminho

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Saint Gobain tem 14 mil pessoas a trabalhar na área da inovação REUTERS/Nacho Doce

Em 2065, as casas vão ser concebidas com materiais de construção impressos em 3D e capazes de purificar o ar. O tecto será transparente e recuperará toda a energia necessária. As paredes serão móveis e difundem música, as janelas vão escurecer automaticamente e servir de ecrã, a luz e o calor emanam das paredes, do chão e do tecto. A multinacional francesa Saint Gobain traçou, assim, a sua visão da casa do futuro e desenhou um modelo de edifício repleto de vidro, sem arestas e linhas rectas.

Com 350 anos de existência – é a mais antiga das cotadas no CAC 40, o principal índice da bolsa francesa – há muito que deixou de ser apenas uma companhia de produção de vidro. Hoje gosta de se identificar como “líder mundial no mercado do habitat e da construção” e está presente nos pára-brisas dos automóveis, nas janelas que cobrem os edifícios, nos materiais de isolamento, nos pavimentos, ou nas canalizações vermelhas que, por exemplo, são usados nos parques de estacionamento de todos os centros comerciais em Portugal. É da Saint-Gobain o vidro que cobre as pirâmides do Louvre, o chão da Torre Eiffel ou os espelhos do palácio de Versalhes.

A Saint Gobain teve vendas de 41 mil milhões de euros em 2014 (está presente em 66 países, tem mais de 180 mil trabalhadores e 945 fábricas, nove das quais em Portugal) e estava há sete anos à espera que a crise passasse. Enquanto o mercado da construção não animava, fez uma profunda reestruturação e focou prioridades. Vendeu a Verallia (de fabrico de embalagens de vidro para alimentos e bebidas) ao fundo Apollo - que comprou a Tranquilidade – e avançou para a aquisição da Sika, que produz produtos químicos para a construção. Esta operação, ainda por formalizar, deu polémica, com 140 quatros directivos do grupo suíço a contestar a venda à Saint Gobain. 

Pierre-André de Chalendar, presidente executivo da multinacional francesa, diz que o negócio avançará em breve e vai compensar a venda da Verallia, nomeadamente em Portugal, onde pesava um terço das vendas. “É uma perda importante mas se a construção continuar a crescer, teremos mais material para vender”, disse, em Paris, num encontro com jornalistas, por ocasião do 350º aniversário. “O projecto de aquisição do controle da Sika e o lançamento da venda da Verallia marcam a aceleração da nossa estratégia”, continua o gestor, acrescentando que a intenção é recentrar a visão “na concepção, produção e distribuição de soluções inovadoras e de alta performance para o habitat e a indústria”. Na prática, a Saint Gobain quer apostar nos países emergentes e nos Estados Unidos para crescer, aumentar a gama de produtos, “apoiada em marcas fortes”.

Sem contar com a Verallia, a Saint Gobain facturou em Portugal 140 milhões de euros em 2014 e a previsão para este ano é chegar aos 154 milhões (seriam 247 milhões se incluísse a empresa de embalagens). O país pesa apenas 15% no negócio que é feito entre Espanha, Marrocos, Argélia e Tunísia, com os espanhóis a representar 80% das vendas neste universo. A saída da Verallia para o fundo Apollo implica que Portugal passe a valer 13% do negócio. E dos 893 trabalhadores que tinha, a Saint Gobain passará a empregar 653.

Ricardo de Ramon Garcia, administrador delegado para Portugal, Espanha, Marrocos, Argélia e Tunísia adianta que entre 2008 e 2015 as vendas no território nacional caíram mais de 30%. E, em consequência, o número de funcionários desceu de 1317 para 942, 47 dos quais temporários. “A venda de casas e de automóveis está a melhorar tanto em Portugal como em Espanha, por isso prevemos crescimento este ano”, disse, sublinhando que não há, contudo, intenção de contratar mais pessoal. “Se o mercado em termos globais caiu 50%, ainda temos de crescer 50%. Não há planos de expansão de fábricas ou de contratação”, admite.

As 13 empresas da Saint Gobain a operar no mercado nacional incluem a produtora de argamassas industriais Weber (com 164 trabalhadores) e a Saint Gobain Sekurit (156 funcionários), dedicada à produção de vidros para a indústria automóvel. Mas a marca mais conhecida é a Glassdrive, que nasceu da ideia de um trabalhador português e se dedica à reparação de vidro de viaturas em 130 centros. Este negócio já chegou a oito países.

O ano passado a Saint-Gobain submeteu para aprovação cerca de 350 patentes e tem 14 mil pessoas em todo o mundo a trabalhar na inovação. Pierre-André Chalendar não tem dúvidas de que só com forte investimento em investigação uma empresa sobrevive a duas guerras mundiais, revoluções e transformações ao longo de mais de três séculos. Desde que foi criada pelo ministro das Finanças do Rei Luís XIV, Jean-Baptiste Colbert, para concorrer com o monopólio de Veneza na produção de vidro, a Saint-Gobain já deu muitas voltas. E hoje um em cada dois carros que circulam na Europa têm vidro fabricado pelas suas unidades industriais. 

O PÚBLICO viajou a convite da Saint Gobain

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