Obama: marcha de Selma ainda "não acabou", mas já fez um longo caminho

Presidente norte-americano discursou neste sábado na cidade-símbolo da luta pelos direitos cívicos na América. Há vários sinais de que “o trabalho ainda não acabou”, 50 anos depois de Selma e Luther King, e Obama relembrou-os apesar de recusar a ideia de que nada mudou.

Obama: “A América é o que nós fizermos dela”
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Obama: “A América é o que nós fizermos dela” Justin Sullivan/Getty Images/AFP
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“A marcha ainda não acabou” mas já fez um longo caminho. Barack Obama celebrou neste sábado em Selma, Alabama, a marcha pelos direitos cívicos que marcou uma viragem na história dos Estados Unidos ao garantir o direito de voto aos afro-americanos dos Estados do Sul do país.

O primeiro Presidente negro da história dos EUA pronunciou um discurso junto à ponte Edmund Pettus, onde no dia 7 de Março de 1965 várias centenas de manifestantes pacíficos foram violentamente travados pela polícia, num ataque que traumatizou a América e que iria levar, alguns meses mais tarde, ao nascimento do Voting Rights Act que reafirmou o direito de voto a todos os americanos.

Sobre os heróis da luta pelos direitos cívicos que marcharam em Selma e fizeram crescer um movimento de direitos humanos irreversível, Obama começou por dizer que “a vitória deles não está completa, mas eles mostraram que a mudança sem violência é possível”.

A pensar no presente, num discurso de homenagem a figuras heróicas da luta pelos direitos cívicos na América, o Presidente citou a constituição — “Nós o povo” — para reafirmar que está nas mão dos americanos lutar para corrigir o que está mal, para mudar o que está errado, para impor a justiça. Foi o que fizeram os homens e as mulheres que marcharam em Selma há 50 anos. E é, insistiu Obama, o que os homens e mulheres têm que continuar a fazer hoje, seja “na associação de bairro local, seja na Casa Branca”.

O Presidente avisou: “Não podemos baixar a guarda.” Mas também se recusou a aceitar que “nada mudou nos últimos 50 anos”, apesar dos acontecimentos recentes de violência policial contra negros. “Perguntem aos habitantes do Alabama, perguntem às mulheres, perguntem aos latinos, aos homossexuais.” E eles “vão responder-vos” que muito mudou na América nos últimos 50 anos.

“A marcha ainda não acabou”, mas a mensagem que Obama quis deixar é que cabe aos americanos e ao seu sentido de cidadania e respeito pelas leis a responsabilidade de levar a marcha a bom termo. “A América é o que nós fizermos dela.” A responsabilidade continua, insistiu o Presidente. “Vocês são a América.” E, insistiu Obama, “vocês têm que votar” e “ninguém tem o poder de vos impedir de votar”.

A 15.ª emenda da Constituição americana de 1870 proíbe a recusa do direito de voto a qualquer cidadão “com base na sua raça ou na sua cor”. Mas em vários Estados do Sul foi sempre ignorada. Foi necessário o movimento dos direitos cívicos lançado por Martin Luther King e a tragédia de Selma — ninguém morreu mas as imagens da brutal carga policial contra os manifestantes correram os jornais e as televisões da América e do mundo — para forçar o então Presidente Lyndon Johnson a agir.

Forçado por uma tragédia e um movimento social com uma dinâmica imparável, o Presidente democrata submeteu ao congresso um projecto-lei que iria tornar-se no Voting Rights Act, uma legislação que levantava as barreiras que impediam os negros de votar em vários Estados do Sul do país. Uma lei que foi sendo contestada ao longo dos anos por republicanos, que tentavam assim limitar os votos de um eleitorado maioritariamente democrata.

Há vários sinais de que “o trabalho ainda não acabou”, 50 anos depois de Selma e Luther King, e Obama relembrou-os apesar de recusar a ideia de que nada mudou. Uma sondagem do Pew Research Center de Agosto de 2012 mostrava que 79% dos negros norte-americanos consideravam que ainda há muito a fazer para atingir a igualdade racial da América. E, dois anos depois, um polícia branco matou um jovem negro em Ferguson, Missouri, o que levou a uma vaga de motins na cidade e a protestos um pouco por todo o país, onde se gritou “as vidas dos negros também contam”. Um relatório publicado esta semana revelou um comportamento racista e discriminatório generalizado na polícia de Ferguson. Obama insistiu que Ferguson é a excepção, não é a regra, como era no Sul da Améria há 50 anos.

Mas em Selma, cidade que tem uma taxa de desemprego superior a 10% (o dobro da média nacional) e onde quase 40% dos lares vivem abaixo do limiar da pobreza, a luta é também pela igualdade de oportunidades.

Para Letasha Irby, 36 anos, que trabalha numa fábrica de peças automóveis, “hoje há outros combates para travar” no Alabama. “Se eles se conseguiram unir há 50 anos numa frente conjunta, isso também podia acontecer agora”, diz esta mulher que ganha 12 dólares por hora e elege como prioridade actual das minorias mais desfavorecidas “a luta por salários decentes”.

Se Letasha falou de “eles”, Obama falou do “nós” como essa palavra que define a América e os americanos. Ontem e hoje: “Nós o povo” (“We the people”), “Nós vamos conseguir” (“We shall overcome”), “Sim, nós conseguimos” (“Yes we can”).

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