O défice de inovação

Importa impulsionar uma estratégia económica que assegure igualdade de oportunidades.

Desde o início desta crise financeira internacional, as desigualdades sociais têm aumentado em vários países e, nessa medida, diversas organizações internacionais, como a OIT ou a OCDE, têm vindo a chamar a atenção para o problema da distribuição de rendimentos em diversos países do mundo – designadamente em Portugal – e o crescente fosso entre o rendimento dos trabalhadores mais bem pagos e os menos bem pagos, assim como para a necessidade premente de se implementarem políticas públicas em matéria de correção destas crescentes disparidades.

A verdade é que o mercado de trabalho europeu evidencia fortes diferenças não só ao nível das taxas de desemprego (com países, como a Áustria, o Luxemburgo, a Holanda e a Alemanha a apresentarem taxas de desemprego na ordem dos 5% e outros, como a Espanha e a Grécia, acima dos 25%), mas também por tipo de vínculo contratual (com países como o Luxemburgo ou a Áustria a apresentar uma muito reduzida precariedade laboral e, no polo oposto, países com elevada proporção de contratos a termo e/ou temporários, como a Polónia, Espanha e Portugal.

Atentemos no caso português. A contratação precária atinge diversas faixas etárias, mas é sobretudo notória junto dos jovens que, na sua maioria, saem do sistema de ensino caindo numa cadeia de contratações precárias, que os sujeita a uma forte instabilidade profissional e a baixos salários. Desde 2011 que se assiste a uma reconfiguração do mercado de trabalho, que passa pela destruição de emprego permanente e a tempo completo, desemprego e pelo aumento de emprego mal remunerado, não permanente e a tempo parcial e do subemprego.

Ora, uma política laboral inadequada que estimule o aumento do emprego precário poderá permitir melhorar as estatísticas do desemprego a curto prazo, mas, a médio e a longo prazo, terá efeitos negativos no desenvolvimento e na própria competitividade do país, comprometendo as qualificações dos trabalhadores, a sua saúde e bem-estar e, o que é grave, a capacidade de a economia gerar inovação. E há que questionar a competitividade do país em matéria de inovação porque esta é o motor do desenvolvimento a médio e a longo prazo.

E se, um pouco por todo o mundo, cresce a preocupação com o chamado “défice de inovação”, também em Portugal precisamos de trabalhadores que gerem realmente inovação em ambiente de trabalho. Não só porque a economia do conhecimento assim o exige, mas também porque a inovação é essa capacidade de inventar outros caminhos, de revelar novos desafios. É um processo que implica a geração de novas ideias ou conceitos, de novas associações de ideias e de conceitos pré-existentes mas que antes não se conciliavam. Nesse sentido é preciso promover a cultura de cooperação entre as instituições científicas e as empresas dos diferentes sectores económicos e disseminar boas práticas para reforçar a dinâmica de inovação.

De acordo com o Innovation Union Scoreboard 2014, as diferenças na performance de inovação no seio da UE continuam acentuadas, sendo este ranking europeu de inovação composto por quatro grupos de países, liderado pela Suécia, seguida pela Dinamarca, Alemanha e Finlândia (os denominados innovation leaders) e onde Portugal se posiciona no terceiro grupo, moderate innovators, tendo descido um lugar em 2014.

Sendo o “défice de inovação” um dos principais desafios da generalidade dos países da União Europeia, urge compreender que a promoção de inovação passa não só por um investimento contínuo na educação e na formação, mas também em facultar melhores condições de trabalho à população ativa. Uma economia assente na precariedade dos vínculos laborais e em baixos salários não gera inovação tecnológica, pois é da valorização dos recursos humanos que emerge a inovação.

A este propósito importa não esquecer o texto fundamental do ordenamento jurídico português – a Constituição da República Portuguesa – que consagra relevantes direitos sociais que permitiram que no nosso país se tenha percorrido, desde 1976, um trajeto progressista de mudança em dimensões fundamentais da sociedade, afirmando o propósito de assegurar qualidade de vida aos portugueses e coesão económica e social. Como enfatiza a Constituição, no seu artigo 9.º, são tarefas fundamentais do Estado promover o bem-estar e a qualidade de vida dos portugueses, bem como efetivar os direitos económicos, sociais, culturais e ambientais e, como menciona no seu artigo 73.º, a criação e a investigação científicas, bem como a inovação tecnológica, devem ser incentivadas e apoiadas pelo Estado.

E é prosseguindo este espírito que importa hoje impulsionar uma estratégia económica que assegure igualdade de oportunidades, operando as necessárias correções de desigualdades laborais e sociais, em prol de uma economia baseada no conhecimento e na inovação, mais eficiente e capaz de promover um desenvolvimento sustentável.

Professora universitária e investigadora

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