Venda da CGD está fora do memorando da 5.ª avaliação

Foto
O Governo anunciou na quinta-feira a escolha da Fosun para a área seguradora da CGD Filipe Arruda

A privatização parcial da CGD foi abordada, de novo, nas últimas negociações que decorreram entre o Governo e a missão externa, e é um tema que está em aberto, mas não vai constar da revisão do memorando que resulta da 5.ª avaliação da troika.

Entretanto, está em estudo a passagem de parte do capital da CGD da Direcção-Geral do Tesouro, para a Parpública, a holding financeira do Estado.

O PÚBLICO apurou, ao mais alto nível, que a administração do grupo público, presidida por José de Matos, não foi consultada, nem informada, da eventual intenção de Passos Coelho em avançar, em breve, para a abertura do capital da CGD a privados. E, dentro do banco, não há qualquer indicação concreta sobre o tema. Uma fonte da instituição explicou que em condições normais o "natural" seria que o Governo, "se o propósito fosse esse", abordasse o assunto com a gestão. Todavia, admitiu, que dado "o padrão da actuação" da actual equipa das Finanças, liderada por Vítor Gaspar, que mantém as informações "em círculo fechado, possa não o ter feito". Apesar destas declarações, admite-se (sem confirmação) que o administrador não executivo da CGD, indicado pelo Governo, Pedro Rebelo de Sousa, possa ter em mãos a "preparação" da operação de venda parcial da CGD, que a concretizar-se não seria no imediato.

Em Maio, na véspera da 4.ª avaliação da troika, Rebelo de Sousa (e Fernando Ulrich, do BPI) veio defender a abertura do capital do banco estatal a privados, mencionando a alienação entre 30% e 40% do capital.

Ontem havia quem não excluísse a eventualidade de o tema ser falado em Conselho de Ministros de hoje. De qualquer modo, o PÚBLICO sabe que a privatização da CGD não constará do 5.º relatório da avaliação da troika, que resulta da revisão do memorando, a publicar, em princípio, em Outubro. Mas a operação terá sido um dos pontos referidos nas últimas conversações com a missão externa, à semelhança, aliás, do que aconteceu nas negociações do primeiro memorando de entendimento (Teixeira dos Santos opôs-se). Em Maio, no 4.º exame, o assunto já tinha sido equacionado.

Esta é uma matéria controversa e, por isso, tem estado no centro da discussão pública nos últimos dias. A semana passada, José António Seguro colocou o tema da venda da CGD em cima da mesa, durante o debate quinzenal no Parlamento, um sinal de que esta solução terá sido ponderada em algumas instâncias, ou, pelo menos, reconhecida como uma hipótese de trabalho. Interpelado duas vezes por Seguro, que se opõe a ela, Passos Coelho só respondeu à segunda tentativa e de forma vaga: "No dia em que o Governo tiver de anunciar alguma coisa relevante sobre a CGD, não deixará de o fazer."

Ontem, o Jornal de Negócios avançou com uma informação relevante, ao noticiar que o Governo contratou a Deloitte para avaliar a CGD no quadro da sua privatização. Uma fonte da CGD, que está no universo da Direcção-Geral do Tesouro, explicou que a Parpública pediu à Deloitte que estudasse todas as empresas públicas, nomeadamente a CGD. A intenção é integrar parte do grupo estatal na holding, para equilibrar as contas e compensar as saídas da EDP e da REN. Se for este o objectivo, então a CGD passará a ter dois accionistas, a Parpública e o Tesouro.

Embora a privatização da CGD não conste do programa do Governo, o primeiro-ministro defendeu-a em campanha eleitoral. Esta operação é do agrado da equipa das Finanças, sobretudo agora que está obrigada a lidar com um desvio do défice orçamental, não previsto, e a cumprir a meta da troika de 4,5% em 2013 e 2,5% em 2014.

Qualquer decisão nesse sentido terá de ser equacionada com pinças. Não só a autoridade do Governo, e das Finanças, está abalada (dada a surpresa da derrapagem do défice) como Passos sabe também que se trata de uma medida polémica que abrirá uma nova frente de batalha com o PS, que já disse que discordava. Por outro lado, e no pressuposto de que o PP não mudou de opinião, o que não é garantido, Passos e Gaspar teriam de lidar com o parceiro de coligação. O PÚBLICO contactou o PP para saber se Paulo Portas está disponível para rever a sua posição inicial, de não aceitar a venda da CGD, mas não obteve uma resposta.

Em todo o caso, há no executivo quem tenha a compreensão de que privatizar, nesta fase, é um risco, pois o valor de mercado da banca está a preços de um café: uma acção do BES vale 62 cêntimos, uma do BPI 79 cêntimos. Já cada acção do BCP negociou-se ontem a seis cêntimos.

Os que advogam esta tese alegam que a CGD se tornou um encargo para o Estado. Em 2011, a CGD apurou 488 milhões de euros de prejuízos, os primeiros desde que está a operar. E os problemas actuais da CGD são evidentes: estima-se que, em 2012, as imparidades para crédito em incumprimento totalizem 1,2 mil milhões de euros. Estes consideram ainda que o banco estatal têm pouca transparência e é susceptível de pressão política. Quem se opõe à privatização, defende que Portugal, ao dispor da CGD, pode contar com um instrumento de política financeira e dar orientações à economia e, assim, regular o mercado.

Sugerir correcção
Comentar