Resgate do Bankia vai ser feito com recurso a dívida pública espanhola

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A oposição espanhola quer explicações sobre a situação do banco Foto: Andrea Comas/ Reuters

A gigantesca injecção de capital que o Estado espanhol se dispõe a realizar no Bankia não vai ser feita com dinheiro fresco.

Os 19 mil milhões de euros que irão salvar a instituição da bancarrota entrarão no banco na forma de títulos de dívida pública de Espanha, avançou ontem o jornal El País.

O recurso a este expediente fará com que a Espanha evite ter que financiar-se no mercado, que lhe exigiria uma elevada taxa de juro no contexto actual de crise e dado o risco da operação, e acaba por atirar para o BCE, embora de forma indirecta, a tarefa de financiar o Bankia, que utilizará os títulos de dívida para os apresentar como garantia em empréstimos a solicitar ao banco central.

O jornal assinalava ontem que há uma alternativa em estudo, a de ser o Fundo de Reestruturação Ordenada da Banca (FROB) a emitir os títulos que estarão na base da injecção de capital. Este fundo de emergência já colocou no Bankia cerca de 4500 milhões de euros, o que eleva para 23.500 milhões de euros o total de dinheiro que o Governo Rajoy se viu obrigado a disponibilizar para a instituição.

Depois de ter acumulado perdas de quase 3000 milhões de euros em 2011 e com o balanço afectado pela dimensão do crédito de risco, o conselho de administração do Bankia reuniu-se na passada sexta-feira para pedir ao Estado um resgate de 19 mil milhões de euros. Na sequência do pedido, a gestão do banco apresentou a demissão e convocou uma assembleia geral para escolher novos responsáveis.

É neste contexto que está a ser negociada com a Comissão Europeia a solução para o Bankia e que poderá ser replicada na mais ampla missão de recapitalizar os outros bancos espanhóis que vivem momentos de grande aperto. Os analistas têm apontado para um valor que, no total, poderá chegar aos 60 mil milhões de euros e que o Governo de Mariano Rajoy não quer ir buscar aos mecanismos europeus de resgate, sob o temor de um agravamento das suas condições de financiamento externo.

O FROB dispõe, actualmente, de uma liquidez próxima dos 5400 milhões de euros, dos quais 1000 milhões já estão destinados a uma tranche de ajuda ao Banco de Valência. O restante é manifestamente insuficiente para acudir à dimensão do problema bancário espanhol, que acumulou verbas astronómicas nos empréstimos hipotecários que se converteram em crédito de alto risco com a crise no imobiliário e a consequente descida dos preços das casas.

Em condições normais, o Estado espanhol colocaria dívida no mercado e utilizaria o dinheiro na recapitalização dos bancos. Assim, passa para terceiros o encargo do financiamento do Bankia, que poderá utilizar os títulos como garantia no mercado interbancário para conseguir liquidez ou mesmo junto do Banco Central Europeu em empréstimos de mais longo prazo.

Mas os especialistas dizem que a manobra tem riscos. Os juros a pagar poderão até ser menores, mas o rácio de dívida pública em proporção do produto interno bruto (PIB) aumenta na mesma, com as consequências que isso poderá ter nos mercados. E, como assinalava ontem o El País, este tipo de soluções podem gerar uma nova onda de desconfiança sobre Espanha, por estar a confundir, num mesmo patamar, o risco bancário e o risco soberano.

Para além de um problema financeiro, o Bankia transformou-se, igualmente, num problema político, com o líder do PSOE, Alfredo Pérez Rubalcava, a exigir que os protagonistas dêem explicações cabais no Parlamento. O dirigente socialista diz que não dará o seu aval a novas injecções de capital sem que lhe expliquem "o que se passou, de quem é a culpa e como se vai resolver a situação" do Bankia, para evitar que "se socializem as perdas e se privatizem os benefícios".

O banco mais "tóxico"

O Bankia/BFA nasceu no final de 2010 para agregar sete instituições financeiras regionais espanholas, entre as quais a Caja Madrid e a Bancaja, operação para a qual o Estado contribuiu com uma primeira tranche de ajuda de 4500 milhões de euros.

O banco é, actualmente, o terceiro mais importante de Espanha e tem uma base de 10 milhões de clientes. Mas é também o que acumulou o maior volume de crédito de alto risco - cerca de 30 mil milhões de euros, segundo as contas revistas recentemente.

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