Sargentos dos Comandos “apenas seguiram guião da prova”

Da fase de instrução prevista terminar esta semana, resultará a pronúncia ou não pronúncia dos 19 arguidos acusados.

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Rui Gaudêncio

As audições dos quatro sargentos acusados no processo dos Comandos, que pediram para ser ouvidos na fase de instrução, resultaram numa tentativa idêntica de desmontar a acusação individual contra cada um deles. 

Os quatro insistiram que apenas cumpriam o guião da Prova Zero (a primeira e mais exigente do curso), ordens superiores e os procedimentos definidos na Escola Prática de Quadros, na fase preparatória do curso 127, que se iniciou a 4 de Setembro de 2016.

Daquilo que puderam ver, disseram esta terça-feira no Tribunal de Instrução Criminal, em Lisboa, ninguém [da equipa sanitária ou de instrução] recusou prestar assistência, nenhum recruta foi deixado desfalecido no chão, maltratado, nenhum foi violentado, agredido ou empurrado para as silvas de cabeça, disseram. 

Se um dos sargentos ouvidos admitiu agarrar na cabeça de um instruendo, e sacudi-lo ao mesmo tempo que lhe gritava aos ouvidos que ele tinha que comer, foi por “preocupação”. Ele recusara comer a ração. “Eu queria que ele comesse para garantir o que estava previsto no horário da tarde. E gritei, sim.” O mesmo sargento começou por prestar as condolências aos representantes das famílias de Hugo Abreu e Dylan da Silva, os dois instruendos de 20 anos que morreram depois de participarem nas primeiras horas da Prova Zero. Quando questionado pelo seu advogado Varela de Matos sobre um ponto da acusação, que o visa pessoalmente, garantiu que, ao contrário se refere no processo, não acordou “à bofetada e ao pontapé” um dos instruendos, que estava estendido no chão, e sobre ele não disse: “Deixem-no, ele não vale nada.”

“Não se aperceberam” de nenhum sinal de alarme

Até à hora do almoço, os quatro sargentos “não se aperceberam” de nenhum sinal de alarme nos instruendos dos seus respectivos grupos – “nenhum” tinha desmaiado, vomitado, desfalecido.

Depois do almoço mais de 20 começaram a dar sinais de desorientação ou exaustão, desfaleceram ou desmaiaram e foram assistidos no posto de socorros instalado numa tenda com capacidade para menos de uma dezena.

A versão dos instruendos contida nos autos do processo conduzido pelo Ministério Público não coincide com a relatada esta terça-feira pelos quatro sargentos. Segundo estes, todos os recrutas beberam água em vários momentos da prova, eram colocados à sombra quando mostravam sinais de exaustão e forçados a alimentarem-se com a ração de combate prevista a cada refeição.

Os instruendos dormiram apenas duas horas na primeira noite em que chegaram às 3h da madrugada ao Campo de Tiro de Alcochete, obrigados a montar e desmontar as tendas até que estivessem todas alinhadas. Mas, como notou, uma das advogadas de defesa, o guião da prova apenas previa uma hora de sono nessa noite.

“Nunca houve intenção de provocar lesões a qualquer instruendo” – foi uma das frases mais frequentemente proferidas. Ou ainda – “apenas seguíamos o guião da prova”. 

Da fase de instrução que deverá terminar esta semana, resultará a pronúncia ou não pronúncia dos 19 arguidos acusados pela procuradora do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) Cândida Vilar que, a dado momento, perguntou a um dos sargentos: “O senhor tem uma vontade, tem discernimento?”; “E nunca disse que não concordava” com os seus superiores, com as regras da instrução ou com o Guião da Prova?"

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