Parlamento Europeu reforça posição de Portugal contra suspensão de fundos

Comissão decide qual a recomendação que vai dar na próxima semana, mas num cenário já benigno para Portugal, o Parlamento deu mais argumentos a favor da recusa de qualquer suspensão de fundos.

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Mário Centeno falou hoje aos deputados no Parlamento Europeu Miguel Manso

Com o momento decisivo marcado para daqui a uma semana, Portugal recebeu esta terça-feira mais uma ajuda preciosa para poder acreditar que não irá sofrer uma suspensão parcial dos fundos europeus. O Parlamento Europeu decidiu, depois de ouvir Mário Centeno e o seu homólogo espanhol, defender junto da Comissão que não avance para qualquer tipo de congelamento na atribuição de fundos aos dois países da Península Ibérica.

A posição do parlamento europeu foi adoptada por uma “maioria muito expressiva”, anunciou a deputada Marisa Matias, que é uma das coordenadoras da comissão do Parlamento Europeu para os assuntos económicos que, em conjunto com a comissão de desenvolvimento regional, votou esta matéria.

Cabe agora à Comissão Europeia tomar a decisão sobre qual a recomendação que irá fazer ao Conselho, a instituição que, em última análise tem o poder para decidir sobre esta matéria. Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, afirmou aos jornalistas que é entendimento do Parlamento Europeu que “temporariamente o caso está encerrado”, mas assinalou que fica aberta a possibilidade de reabrir a discussão com a Comissão caso esta venha a tomar uma decisão diferente daquela que foi agora defendida pelo parlamento.

O voto do parlamento ocorreu numa reunião marcada imediatamente a seguir a Mário Centeno e o ministro das Finanças espanhol, Luís de Guindos, terem falado aos deputados, defendendo que os seus países não devem ser penalizados com a suspensão dos fundos.

Centeno repetiu aqueles que têm sido os seus argumentos nesta discussão: uma suspensão seria contraditória com a decisão da Comissão de não aplicar multas, seria contraproducente a nível económico e os efeitos políticos seriam muito negativos devido à desconfiança face ao projecto europeu que criaria nos cidadãos. “Cabe-nos a todos proteger o projecto europeu, não pô-lo em causa”, afirmou o ministro na sua intervenção.   

A grande maioria no parlamento a defender o mesmo que o ministro foi evidente na sessão de perguntas e respostas que se seguiu ao seu discurso. Deputado atrás de deputado, portugueses e de outros países da UE, usaram adjectivos fortes para criticar uma eventual suspensão: “absurda”, “ilógica”, “contraproducente” e “uma trapalhada”. E muitos deles, mais à esquerda do que à direita, defenderam ainda que a legislação europeia que prevê a possibilidade deste tipo de medida deveria ser alterada.

Entre os portugueses que intervieram, todos os deputados do PSD fizeram questão de salientar que em 2015 o défice acabou afinal por ficar logo abaixo de 3%, e que “o Governo deveria ter notificado a Comissão desse facto”. Nuno Melo, do CDS-PP, disse que por uma vez não via Centeno “como ministro socialista” e citou o livro em que dois jornalistas franceses entrevistam o presidente François Holande, citando as passagens em que este explica porque é que a França e os grandes países recebem tratamento preferencial das instituições europeias.

Os deputados do Bloco de Esquerda e do PCP, para além de criticarem uma eventual suspensão, assinalaram que foi a política de austeridade aplicada a nível europeu que colocou Portugal na situação difícil em que se encontra. Pedro Silva Pereira, do PS, disse que “este é um debate absurdo que se arrasta há demasiado tempo” e defendeu que “Portugal não precisa de nenhum incentivo para cumprir as regras pela simples razão de que Portugal já está a cumprir as regras”.

Houve no entanto também alguns deputados de outros países que, embora nunca defendendo a opção de suspender os fundos, colocaram questões sobre as políticas seguidas pelo Governo português. O alemão Burkhard Balz foi um deles, ao perguntar porque é que a economia não cresce tanto como a espanhola e a questionar a opção do Governo de passar das 40 para as 35 horas o horário semanal dos funcionários públicos.

Centeno respondeu que a Espanha resolveu mais cedo o problema de fragilidade do sistema financeiro e defendeu que as mudanças feitas pelo Governo na função pública foram “muito limitadas”.

Reestruturação recusada

Da Grécia veio outra crítica. Uma deputada da Nova Democracia não gostou de saber que Centeno defendeu na Assembleia da República uma redução das taxas de juro da dívida, defendendo que a situação portuguesa é bem diferente da Grécia. “Temos vindo a rejeitar liminarmente discussões sobre reestruturação da dívida”, foi a resposta do ministro.

Logo a seguir, em declarações aos jornalistas, Mário Centeno respondeu a apenas uma pergunta, precisamente sobre a reestruturação de dívida. Dessa vez, Mário Centeno repetiu de forma quase idêntica aquilo que Jeroen Dijsselbloem tinha no dia anterior defendido sobre o assunto. “A reestruturação da dívida não está e não vai estar em cima da mesa” disse o ministro. O presidente do Eurogrupo tinha dito que o tema “não foi discutido, nem irá ser discutido”.

Na semana passada, no debate no orçamento na Assembleia da República, o ministro apresentou um discurso bastante menos definitivo sobre este assunto, tendo afirmado em resposta a questões colocadas por Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda, que “é necessário que Portugal tenha uma redução na taxa de juro que paga pelo seu endividamento” e defendendo que esta questão é “crucial para o futuro próximo da economia portuguesa”.

Contradição entre aquilo que é dito em Lisboa e Bruxelas sobre um possível alívio dos encargos com a dívida? Centeno garante que não, “rigorosamente” nenhuma.

A explicação do ministro assenta essencialmente na ideia de que quaisquer avanços sobre esta matéria têm de ser feitos a nível europeu. No parlamento português, o ministro das Finanças assinalou que uma solução teria de ser encontrada, não de forma unilateral por Portugal, mas pela Europa. Agora, disse-o de forma ainda mais clara: “É uma matéria que se pode discutir a nível europeu quando os países europeus assim o decidirem, mas não é algo que esteja na agenda do Governo”.

A resposta do ministro das Finanças sobre este assunto surge depois de sentir o desconforto de responsáveis políticos europeus com a ideia de Portugal vir a tentar obter condições mais vantajosas para o pagamento da sua dívida.

Na segunda-feira, em resposta às questões colocadas por jornalistas portugueses sobre as declarações do ministro no parlamento português, Jeroen Dijsselbloem foi taxativo: “Não discutimos e não vamos discutir, porque Portugal é capaz de pagar a sua dívida”. Para reforçar esta ideia, o presidente do Mecanismo de Estabilidade Europeu, Klaus Regling fez questão de assinalar que a taxa de juro a que Portugal está a conseguir obter financiamento nos mercados “está em torno dos 3,5%, enquanto na Grécia é de 8%.

O PÚBLICO viajou a convite do Parlamento Europeu

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