Aumento de 130 milhões com reposição dos salários esgota reserva

Execução da despesa está abaixo do previsto mas desvio na receita continua. Marcelo desdramatiza alertas e espera “surpresa boa” com dados de Setembro.

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RG Rui Gaudencio

Percorridos oito meses de execução orçamental, o défice continua a encolher mas nem tudo são rosas na balança das contas públicas. A Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) voltou nesta terça-feira a lembrar que há um “desvio desfavorável” na receita e que, embora a despesa esteja a ter uma execução inferior ao projectado, há encargos que vão acelerar até ao fim do ano.

O alerta mais relevante tem a ver com as despesas com pessoal, porque à medida que se aproxima o final do ano aumenta a pressão nas contas associada à reposição progressiva dos salários na função pública. E se até agora o Governo mantém intacta a dotação orçamental de 447 milhões de euros reservada para compensar a reversão dos cortes, é expectável que toda esta fatia venha a ser precisa, antecipam os especialistas da UTAO. Caso esta despesa continue a crescer ao ritmo actual, a execução ficará cerca de 130 milhões acima do objectivo deste ano. Isto “numa hipótese considerada conservadora”, alertam os técnicos desta unidade de apoio ao Parlamento.

Até Agosto, o penúltimo mês em que os funcionários públicos têm corte nos vencimentos, a despesa com pessoal está a crescer mais do que o previsto para todo o ano (a um ritmo de 3%, quando a previsão do Governo é que aumente 2,3%, ficando 439 milhões de euros acima do valor do ano passado).

Além desta reserva, o Governo tem ainda uma dotação provisional para outras despesas correntes (de 502 milhões de euros), que até Agosto foi usada em apenas 16 milhões (3,1%).

Também do lado da despesa, a UTAO refere outros desvios. No programa orçamental do ensino básico, secundário e administração escolar, a execução dos encargos do Estado é mais alta: aumentou até Agosto 110 milhões, embora para todo o ano esteja prevista uma redução superior a 290 milhões. E na Defesa, Segurança Interna e Justiça “também se verifica um grau de execução superior ao observado no mesmo período de 2015”.

Segundo a UTAO, também poderão acelerar as despesas com investimento e transferências correntes e de capital, mais dependentes da aplicação dos fundos comunitários.

As transferências correntes apresentam uma execução inferior à do ano passado, mas é preciso ter em conta que estão por executar transferências para entidades exteriores às administrações públicas: 81 milhões de euros para o Fundo de Contragarantia Mútuo e mais 64 milhões do Fundo Português do Carbono. Quanto à transferência para a Grécia, relativa aos lucros do BCE com a compra de dívida pública grega, a UTAO refere a possibilidade de este impacto, que agora deve ser contabilizado como despesa, não ocorrer este ano “após acordo entre autoridades gregas e o Eurogrupo”.

Na receita com os impostos, aumentou em Agosto ainda mais a diferença em relação ao que está previsto para todo o ano. E, para as metas da receita fiscal se cumprirem, será preciso arrecadar nos últimos quatro meses do ano mais 3531 milhões do que no período homólogo, ou seja, conseguir 17.434 milhões, calculam os técnicos. Mas não é “verosímil” que aconteça, advertem.

Se a oposição alinhou pelos alertas da UTAO, com o PSD a acusar o Governo de vender uma realidade e o CDS a lembrar previsões “demasiado optimistas”, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, veio desdramatizar. E antecipou que o valor das receitas fiscais de Setembro “talvez possa ser uma surpresa boa”.

Poupança com subsídios

Já do lado positivo, a UTAO refere que, no total, o grau da execução da despesa está aquém do que acontecia nesta altura de 2015, sublinhando as poupanças na Segurança Social (diminuição dos encargos com subsídios de desemprego e outras prestações sociais). Feitas as contas, houve até Agosto “um saldo positivo superior ao verificado no período homólogo” na Segurança Social, de 1029 milhões de euros, quando o valor dos oito primeiros meses do ano passado era de 806 milhões.

Também a compra de bens e serviços está em queda, ajudando as contas. Até Agosto, estas despesas apresentam uma quebra de 1,3%, ficando o valor gasto abaixo dos 7000 milhões de euros, quando a previsão para o conjunto do ano é que estes encargos aumentem em 1,5%.

No entanto, a UTAO alerta que “o passivo não financeiro para aquisição de bens e serviços da administração central é superior ao observado em Dezembro de 2015, traduzindo a existência de compromissos de despesa ainda não pagos e que poderão concretizar-se em despesa efectiva nos próximos meses”.

Do lado das dívidas por pagar há mais de 90 dias, o desempenho está pior do que um ano antes. Os Hospitais EPE (Entidades Públicas Empresariais) tinham no final de Agosto 713 milhões de euros de pagamentos em atraso, um aumento de 38 milhões face a Agosto de 2015 (e mais 262 milhões em relação ao final de 2015, como nota a UTAO). No entanto, no subsector da saúde e nas administrações local e regional houve uma redução.

Só que, lembra a UTAO, a Direcção-Geral do Orçamento “destaca a existência de situações de não consolidação entre entidades do programa orçamental Saúde, o que torna a comparabilidade homóloga e a avaliação face ao objectivo do OE/2016 menos fidedigna”. E, nas contas finais, olhando para os pagamentos em atraso em todo o universo das entidades públicas, há um aumento: as dívidas por pagar há mais de 90 dias totalizam 1157 milhões de euros, mais 60 milhões do que o que se registava em Agosto do ano passado. com Ana Brito

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