A rentrée de Michel Houellebecq serve-se com humor e auto-crítica

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Comparar o duro autor francês a Woody Allen? A rentrée vai ter Michel Houellebecq como personagem do seu novo livro.

"La carte et le territoire" é o novo livro do polemista profissional Michel Houellebecq, o escritor francês a que quase sempre se justapõem os adjectivos "niilista", "provocador". O livro é publicado a 8 de Setembro em França, pela editora Flammarion, e segundo a agência AFP, que fez hoje uma antevisão do livro, há uma surpresa em tom humorístico. É a rentrée de um duro em versão auto-satírica e quase apologética, com um toque de... Woody Allen, diz quem já leu, e com o mundo da arte como alvo.

Houellebecq é o escritor francês mais traduzido, levando ao mundo as suas narrativas feitas dos dramas da sociedade actual, da ausência de cultura, da Europa sem aspirações. E ele é também o autor que foi, em 2002, processado por ter dito em entrevistas que o Islão "é a religião mais estúpida do mundo" (o Tribunal de Paris considerou-o inocente de provocação ao ódio racial e injúria racial) quando respondia a perguntas sobre o seu livro de então, "Plataforma" (2001).

E que em "A Possibilidade de Uma Ilha" sugere que Deus é uma civilização de outro planeta - com esse livro, inspirou Iggy Pop para um álbum em versão "crooner". "A Possibilidade de Uma Ilha" foi também filme, estreia em 2008 na realização de Houellebecq e um primeiro passo atrás da câmara pouco positivo - a crítica no Festival de Locarno desse verão de 2008 achou-o "entediante", para não dizer "catastrófico". Também a sua mãe se irritou com o facto de ele a descrever como uma "velha prostituta" e com a personagem com o mesmo apelido que ela, Ceccaldi, em "As Partículas Elementares" (1998) - uma ninfomaníaca que deixa o filho em prol de encontros sexuais. Ela contra-atacou com "L'Innocente" livro "tell all" em que apresenta a sua versão sobre quem é Michel Houellebecq.

Mas neste "La carte et le territoire", o autor de 54 anos conta-nos histórias sobre o artista Jed Martin, os seus momentos e dilemas criativos e o seu encontro com a fama. E, como parece ser coisa geracional entre escritores de certa idade e fama, torna-se ele mesmo personagem do livro, sendo "o autor célebre, mesmo mundialmente célebre", como se descreve via Jed, que a personagem central convida a escrever o texto do catálogo da sua primeira grande exposição. Aberto está o caminho para a auto-crítica, a auto-ironia, mas também os seus toques muito pessoais e fiéis sobre a existência e miséria humana, sobre a morte, o sexo, o Islão...

A AFP, leitora prévia desta obra que marca a rentrée editorial, compara o tratamento de Houellebecq a Houellebecq a algo próprio de um Woody Allen. Apresenta-se de pijama que o faz parecer "um recluso de uma novela televisiva", "malcheiroso como um cadáver", com uma casa vergonhosa e, enfim, um alcoólico, deprimido, descarnado, "como uma velha tartaruga doente". Tudo isto são as visões de Jed Martin nos encontros que vai tendo com o decrépito escritor ficcionado.

Joga com nomes da cultura francesa, de apresentadores de televisão ao ministro da Cultura de Sarkozy, Frédéric Mitterrand, ataca ferozmente e uma vez mais a imprensa francesa e, em suma, diz a AFP, "oferece aos seus leitores uma viagem no palimpsesto das suas referências culturais com um gosto pronunciado pelas marcas". A primeira tiragem do livro de 428 páginas terá 120 mil exemplares.

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