Miguel Poveda promete um concerto “muito emocionante” com flamenco clássico e coplas

Figura cimeira do flamenco actual, Miguel Poveda volta a mostrar o que vale a sua arte. Este sábado na Casa da Música e domingo no CCB.

Foto
Miguel Poveda Maxi del Campo

No primeiro Festival de Flamenco de Lisboa teve uma recepção eufórica: quem não o conhecia ficou a saber que estava ali uma grande figura do flamenco. Isso foi a 19 de Abril de 2008 e os que ainda não o conheciam não mais lhe perderam o rasto.

Mas não foi essa a primeira vez que cantou em Portugal, já que em 1997 actuou em Lisboa e Torres Novas. Também não foi a última, nos palcos ou através da tela (vimo-lo no filme Fados, de Carlos Saura). Agora, Miguel Poveda volta para dois concertos únicos em Portugal, este sábado na Casa da Música, no Porto (22h) e domingo no Centro Cultural de Belém, em Lisboa (21h). Íntimo, é o título do concerto.

Porquê íntimo? Porque Miguel Poveda estará em palco apenas com dois músicos: Juan Gomez “Chicuelo” na guitarra e o maestro catalão Joan Albert Amargós no piano. E isso permite-lhe abordar o universo clássico do flamenco mas também fazer uma incursão no mundo das outras canções.

Ele já o explicará, pelas suas próprias palavras, mas antes disso recordemos-lhe as origens. Nascido Miguel Ángel Poveda León, em Barcelona, a 13 de Fevereiro de 1973, começou a cantar aos 15 anos nas peñas flamencas da Catalunha. Mas o gosto pelo flamenco começou em casa dos pais, ela doméstica, nascida em Ciudad Real, ele torneiro mecânico, de Murcia. “Influências maiores foram da minha mãe, que punha esta música em casa. Não porque ela a cantasse de forma profissional, cantava como qualquer dona-de-casa, mas pelo gosto com que a ouvia.”

Como a irmã mais velha da sua mãe também cantava, iam aos fins-de-semana, com ele e as irmãs mais (tem duas), às peñas onde a tia cantava. “Havia espectáculos de cante e baile e isso foi criando em mim uma afición”. Foi evoluindo aos poucos. “A princípio estava muito verde, mas a família apoiava-me. A minha mãe achava que, enquanto eu cantasse pelo menos não andava nas ruas. Fui melhorando a minha forma de cantar, ouvindo os que achavam que eu devia amadurecer e devia dar tempo ao tempo. E houve muita gente fiel e paciente e continuou a ouvir-me desde esse primeiro momento, acompanhando a minha evolução. Ainda hoje continuam a ouvir-me.”

Miguel teve uma boa iniciação na Tertúlia Flamenca de Badalona (cidade onde cresceu). “Às quartas-feiras faziam debates, punham gravações e iam comentando o mundo do flamenco. E eu assistia sempre. Davam-me gravações, porque eu não tinha dinheiro para tantos discos. Gravações de Antonio Mairena, Fosforito, Rafael de Utrera, Manolo Caracol e todos os grandes cantaores em que eu devia fixar-me se quisesse ser alguém no mundo do flamenco.”

Em linhas gerais, diz ele, as críticas que saíam nos jornais era boas, mas havia também quem exigisse mais, quem achasse (e bem) que ele ainda podia e devia crescer como artista. Além, disso, muitas das grandes figuras do flamenco estavam ainda no activo e Miguel não passava, como ele próprio diz, de um “inexperiente jovenzinho de Badalona”. Aos 15 anos, “não tinha a mínima noção do que significava dedicar-me à música. Via isto como uma brincadeira, uma fantasia, achava que ser artista era ter um bom carro, ser famoso, ser conhecido, quando hoje, na verdade, até gostaria de ser menos conhecido, de ser mais anónimo.”

Pelo caminho, o baile
Antes de se lançar no cante, Miguel esteve com as irmãs numa escola de baile (uma delas, Sonia, seguiu carreira de bailaora) mas não se fixou aí, o cante falava mais alto. Desde que gravou o primeiro disco, Viento del Leste (1995), e actuou nas principais salas de Espanha, por vezes ao lado de nomes já históricos como Enrique Morente, Cármen Linares, Manolo Sanlúcar ou Paco de Lucia, que a sua carreira se foi sedimentando no flamenco, no cante jondo, mas também no cruzamento com outras sonoridades. Ainda recentemente gravou um disco com o bandoneonista argentino Rodolfo Mederos, Dialogos, onde tango e flamenco se cruzam. “A gente do flamenco tem a virtude de poder cantar outras coisas. Já é mais difícil ver gente de outros géneros a cantar flamenco. A mim não me passaria pela cabeça, por exemplo, cantar fado como a Mariza [com quem contracenou no filme de Saura sobre o fado], mas acho que posso trazer a outras canções o meu próprio som flamenco, a minha maneira pessoal de cantar.”

Uma maneira de cantar que se expressa de forma particular em Íntimo, concerto que o traz a Portugal. Ele, Juan Gomez “Chicuelo” (guitarra) e Joan Albert Amargós (piano) estarão por vezes os três em palco. “Isso na primeira e na última parte. No meio haverá flamenco clássico, onde estaremos apenas dois, eu e “Chicuelo”, o guitarrista. Mas com Amargós ao piano haverá coplas e composições com poemas de Lorca, Alberti, Miguel Hernandez, umas com arranjos de “Chicuelo”, outra de Pedro Guerra. É muito emocionante.” O reportório virá de ArteSano (2012), um dos seus discos mais celebrados, mas também de outros momentos da sua carreira, em particular de Coplas del Querer, de 2010. Duas noites a não perder, de forma alguma.

Sugerir correcção
Comentar