Transportes e BES penalizam contas públicas em dez mil milhões de euros

BPN também vai ter efeito negativo no défice. Ainda assim, Governo assegura metas.

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Reestruturação financeira de transportadoras públicas com impacto na dívida e no défice PÚBLICO/Arquivo

Os efeitos extraordinários que o Governo poderá ser obrigado a reconhecer este ano nas contas públicas poderão ter um impacto negativo superior a dez mil milhões de euros. A resolução da crise no Grupo Espírito Santo, com o consequente aumento de capital do Novo Banco, a inclusão da CP no perímetro do Estado, os empréstimos à STCP e à Carris e o reconhecimento de perdas com o malparado do BPN estão estimados em 6% do Produto Interno Bruto. O Governo ainda aguarda por cálculos mais exactos das autoridades estatísticas, mas garante que as metas para este ano serão cumpridas.

Os impactos vão fazer-se sentir a dois níveis: no défice; e na dívida. O caso da recapitalização do Novo Banco, que ficou com os activos bons do BES, é um dos casos em que o Instituto Nacional de Estatística (INE) e o Eurostat, o gabinete estatístico da União Europeia, ainda terão de clarificar a sua posição. “As autoridades estatísticas ainda não se pronunciaram sobre se terá ou não impacto no défice", sublinhou nesta quinta-feira a ministra das Finanças, na conferência de imprensa em que apresentou o Orçamento do Estado (OE) rectificativo. O Estado concedeu um empréstimo de 3900 milhões de euros à instituição financeira, aos quais acresceram outros mil milhões por via da Contribuição do Sector Bancário e de um financiamento do sistema bancário.

No relatório que acompanha o rectificativo, o Governo escreve que, “se as autoridades estatísticas decidirem que [o financiamento de 3,9 mil milhões] não é uma operação financeira de empréstimo, mas uma transferência de capital, é uma operação que vai consolidar” no défice. Já em termos de dívida, “já estava incluído por corresponder a um empréstimo no âmbito do Programa de Ajustamento Económico”, lê-se no documento.

O segundo maior impacto nas contas públicas vem da reclassificação da CP. A transportadora ferroviária teve de ser incluída no perímetro das contas públicas, porque, com a entrada em vigor das alterações metodológicas na União Europeia (o SEC 2010), não cumpria os rácios para se manter autónoma. A sua inclusão está estimada em 3843 milhões de euros (2,3% do PIB), com impacto na dívida.

Ainda no sector dos transportes, as contas públicas serão penalizadas pelo financiamento concedido à STCP e à Carris, que fez com que o Estado se substituísse à banca na concessão de empréstimos a estas duas empresas. As regras obrigam a que, além do montante do crédito, também seja consolidada a dívida, o que significa um impacto de 1192 milhões de euros (0,7% do PIB). Neste caso, a operação também tem um efeito negativo no défice, apesar de as transportadoras continuarem fora do perímetro das administrações públicas.

Esta reestruturação financeira fez, aliás, com que o Governo fosse obrigado a aumentar o limite ao endividamento face ao que tinha previsto, fixando-se agora a fasquia em 12.726 milhões de euros. É que, além da Carris e da STCP, outras empresas foram abrangidas por operações deste tipo, como a Empordef, a EDIA e a Parque Expo. No relatório, o executivo diz que “este financiamento foi parcialmente compensado pelo reembolso antecipado de CoCos [instrumentos de capital contingente] por parte do BCP e do BPI”.

Face aos efeitos extraordinários que a ministra das Finanças referiu na conferência de imprensa, o relatório que acompanha o rectificativo acrescenta apenas uma novidade: este ano, o Estado ainda terá de reconhecer perdas com o malparado do BPN. Neste caso, o impacto está avaliado em 0,1% do PIB, o que, de acordo com a última estimativa do INE para 2014, corresponde a cerca de 170 milhões de euros. “O impacto desta operação no saldo orçamental, bem como a determinação do seu valor exacto, está a ser avaliado pelas autoridades estatísticas”, ressalva o Governo.

Não se sabe, porém, se os impactos vão ficar por aqui, uma vez que, pelo menos no que diz respeito ao SEC, há outras alterações que podem penalizar as contas públicas. Nomeadamente o facto de, à semelhança da CP, outras empresas serem reclassificadas este ano. O INE já tinha assumido que esse seria o caso da Parpública, da EDIA e de empresas municipais, mas nenhum deles é referido no relatório.

O somatório dos impactos que o executivo identifica ronda os 10.100 milhões de euros, correspondendo, no global, a 6% do PIB. Ainda assim, a ministra garantiu que estas operações extraordinárias não vão contar para a avaliação do défice feita por Bruxelas, o que significa que a meta de 4% continua ao alcance do Governo. Maria Luis Albuquerque explicou que “para a avaliação dessas metas há uma série de efeitos que não contam”, garantindo que é esse o caso destes efeitos extraordinários.

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