Reserva Federal pode travar programa de estímulo económico nos EUA

Receios sobre a instabilidade do sistema financeiro podem suspender a torneira de 85 mil milhões de dólares por mês em crédito hipotecário.

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Ben Bernanke foi o principal defensor do QE3 e de uma acção mais expansionista por parte da Fed Chip Somodevilla/AFP

A Reserva Federal norte-americana (Fed) pode suspender o programa de compra ilimitada de activos hipotecários antes do esperado. A máxima instituição financeira dos EUA divulgou na quarta-feira que vários dos seus responsáveis se mostravam apreensivos face ao risco da instabilidade dos mercados e exposição da Fed.

“Uma série de responsáveis afirmou que a avaliação da eficácia, custo e risco do programa de compra de activos pode levar a que o comité altere ou suspenda as compras”, lê-se no comunicado do último encontro do Comité de Operações de Mercado Aberto da Fed, citado nesta quinta-feira pelo Financial Times.

De acordo com o Wall Street Journal e a Bloomberg, os receios dos responsáveis da Fed partem da possibilidade de o programa chamado Quantitative Easing 3 (QE3) estar a facilitar demasiado o acesso ao crédito. Os críticos do programa apontam para a possibilidade de a acção da Fed estar a alimentar o sobre-endividamento da população e a acumulação de créditos tóxicos na carteira do banco central norte-americano.

Estes riscos fazem ressurgir o fantasma da instabilidade financeira que esteve por detrás da crise financeira norte-americana, em 2008. 

O programa foi anunciado em Setembro como o terceiro do seu género. Tal como os seus antecessores, QE1 e 2, o QE3 permite o acesso dos bancos norte-americanos a um fundo da Fed para reaverem vantajosamente o dinheiro investido em crédito para a economia real. Assim, o banco central assume parte dos créditos dos bancos e injecta liquidez no sistema financeiro, estimulando o empréstimo e, por arrasto, o investimento.

Mas, ao contrário dos primeiros dois programas da Fed, o QE3 não tem limite máximo de injecção de liquidez ou prazo para terminar. Ben Bernanke, presidente da Reserva Federal, anunciou que o programa terminaria apenas quando se verificasse uma “melhoria significativa no mercado de trabalho” dos EUA.

O mercado de trabalho norte-americano tem recuperado consistentemente desde a crise financeira de 2008. Mas esta recuperação está ainda aquém da “melhoria significativa” a que Ben Bernanke se referiu quando anunciou o QE3, em Setembro de 2012. 

Para além da suspensão do programa, está também em cima da mesa a alteração do seu formato. Actualmente, a Fed está limitada à compra de 85 mil milhões de dólares em activos hipotecários por mês (cerca de 63,5 mil milhões de euros). A redução deste valor poderá atenuar os receios da instabilidade do mercado financeiro e da acumulação de créditos tóxicos.

A possibilidade de o programa de estímulo ser interrompido está a arrastar as bolsas europeias para o terreno negativo. O Euronext 100, que representa as principais cotadas europeias, desvalorizava 1,68% por volta das 10h40.

A divisão que o QE3 criou no seio da Reserva Federal já era conhecida. Em Dezembro, o Comité de Operações de Mercado Aberto já se havia mostrado hesitante em relação aos riscos do programa. Em todo o caso, o comité escolheu manter a sua confiança no estímulo monetário.

O programa é alvo de críticas de vários sectores desde que foi anunciado. Nos EUA, vários políticos e economistas insurgiram-se contra o expansionismo monetário da Fed, receosos de que a injecção de liquidez no sistema financeiro pudesse levar ao aumento da inflação. No entanto, passados seis meses desde que o programa entrou em vigor, a inflação mantém-se abaixo dos 2%. 

A entrada em vigor dos estímulos da Fed fez disparar o expansionismo monetário a nível internacional. Depois do Quantitative Easing 1 norte-americano, os bancos centrais do Reino Unido e Japão seguiram o mesmo caminho de estimulo.

Com o disparar da política expansionista monetária nos principais bancos centrais, cresceu também o receio de uma guerra monetária internacional. Os principais focos de crítica às acções de "easing" partiram das economias em desenvolvimento, que acusaram os EUA de estarem a implementar medidas proteccionistas.

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