Mudanças na selecção de dirigentes são “operação de cosmética”, critica oposição

PS, PCP e Bloco de Esquerda dizem que alterações à lei não impedem escolha de acordo com o “cartão político”.

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Leite Martins, secretário de Estado da Administração Pública, esteve no Parlamento a defender as alterações na nomeação de dirigentes Rui Gaudêncio

Os partidos da oposição acusam o Governo de estar a promover uma “operação de cosmética” com o diploma que altera as regras de selecção e recrutamento dos dirigentes de topo da Administração Pública. Durante o debate que antecedeu a votação na generalidade do diploma que altera o Estatuto do Pessoal Dirigente, os deputados do PS, PCP e do Bloco de Esquerda criticaram o modelo que está em vigor e lamentaram que as alterações tenham sido adiadas até ao final da legislatura.

O diploma foi aprovado na generalidade pela maioria e desce agora à comissão parlamentar do Orçamento, Finanças e Administração Pública, onde será debatido na especialidade antes da votação final global, em plenário, o que deverá acontecer no final de Julho.

Durante o debate, Jorge Machado, do PCP, considerou que as mudanças propostas “são uma profunda hipocrisia” e não impedem que o Governo “possa escolher quem quiser, de acordo com a cor do cartão partidário”.

"O PSD e o CDS-PP nunca quiseram rigor, transparência e competência na Administração Pública”, acusou, com o argumento de que as mudanças agora propostas não resolvem o problema dos dirigentes que se eternizam em regime de substituição, e que ficam em vantagem nos concursos, e vêm “facilitar a escolha pelo membro do Governo quando o concurso fica deserto”.

Para Isabel Santos, do PS, as alterações introduzidas são uma "operação de cosmética”, que não mudam “a transparência do processo”, crítica também feita por Mariana Aiveca, do Bloco de Esquerda.

A deputada socialista destacou alguns aspectos positivos das mudanças em cima da mesa, mas ainda assim não poupou nas críticas.

Depois de o Governo ter gasto cerca de dois milhões de euros por ano com a Cresap (a comissão que faz o recrutamento e selecção dos dirigentes de topo no Estado e que envia ao membro do Governo a lista com o nome dos três finalistas para que o executivo possa escolher), disse Isabel Santos, “a conclusão a que chegamos é a de que, numa análise a 94 organismos e em 213 nomeações, 75% são pessoas do PSD e CDS-PP”.

“Para um processo que visava a despartidarização, o senhor secretário de Estado [da Administração Pública] tem de nos esclarecer o que isto é”, questionou.

Isabel Santos acusou ainda os membros do Governo de terem “atrasado ao máximo as nomeações”, o que faz com que o mandato dos dirigentes “ultrapasse o mandato do próximo Governo”. “A maioria capturou a máquina da Administração pública”, concluiu.

E foi precisamente com esta conclusão que Artur Rego, do CDS, aproveitou para dar uma alfinetada ao PS: “A selecção rigorosa dos candidatos está a preocupar o PS porque perdeu o controlo da máquina administrativa do Estado”.

Do lado do PSD, a deputada Maria Mercês Borges defendeu a “coragem” do Governo para impor um sistema “que introduz rigor e transparência".

"Criticavam no passado as nomeações políticas, criticam hoje porque se gasta dinheiro, porque não é transparente. O PS quer o que estava para trás e os senhores [do BE e do PCP] dizem que até o que está a ser feito para contribuir para a transparência está mal.”

A proposta de lei que altera o estatuto os dirigentes foi apresentada no início do debate pelo secretário de Estado da Administração Pública, José Leite Martins, que destacou o reforço da transparência do processo.

O diploma passa a prever um prazo de 45 dias, contado a partir da data da recepção da proposta de designação da Cresap, para que o membro do Governo escolha o dirigente. A ideia é acabar com os casos em que a lista de finalistas está nas mãos dos ministros há mais de dois anos, sem que a nomeação se efective.

Outra alteração passa pela “introdução de um maior equilíbrio e balanceamento entre a intervenção do membro do Governo competente e a Cresap no processo de recrutamento e selecção”. Actualmente, os ministros detêm o “exclusivo” da definição do perfil do candidato. Na proposta, prevê-se que o Governo identifique as competências do cargo a prover e as principais responsabilidade e funções que lhe estão associadas, cabendo à Cresap elaborar “uma proposta de perfil” do candidato a seleccionar.

Na proposta recupera-se também uma regra que esteve em vigor até 2011 e que impedia o poder político de nomear dirigentes de organismos públicos entre a data de convocação de eleições e a tomada de posse de um novo executivo.

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