De tanto bater o coração do actor Benoît Poelvoorde quase parou

O homem do coração: impregnado do espírito de Chaplin em Le Rançon de la Gloire, de Xavier Beauvois, e a habilitar-se a enfartes do miocárdio em 3 Coeurs, de Benoît Jacquot

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Chiara Mastroianni e o actor belga Benoît Poelvoorde em 3 Coeurs
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Catherine Deneuve, que passa o filme a cozinhar para as filhas
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Charlotte Gainsbourg e o actor belga Benoît Poelvoorde em 3 Coeurs

Se ele é suficientemente atraente para fazer Charlotte Gainsbourg e Chiara Mastroianni, que interpretam duas irmãs, apaixonarem-se por ele parece ser a dúvida, que assolou alguma imprensa em Veneza, quanto à verosimilhança de 3 Coeurs, a participação de Benoît Jacquot na competição do festival.

 O que quer que se diga – por exemplo que o desafio de qualquer melodrama é levar o espectador a desistir da fiscalização -, o actor belga Benoît Poelvoorde é o homem com coração neste concurso e foi convincente e comovente: impregnado do espírito proletário de Chaplin em Le Rançon de la Gloire, de Xavier Beauvois, que também foi exibido em concurso, e a habilitar-se a enfartes do miocárdio em 3 Coeurs, num e noutro é figura com o coração ao alto e em risco. E admira-se a forma como trabalha com elegância a sua tristeza de clown.



Em 3 Coeurs ele cruza-se por acaso com Charlotte na província francesa, numa altura da vida de ambos em que os dois têm o peito a rebentar, e combinam encontro em Paris, nas Tulherias, onde ele não vai aparecer por causa do enfarte (ecos do Love Affair, de 1939, e do An Affair to Remember, de 1954, ambos filmes de Leo McCarey).

Numa segunda visita à província Poelvoorde vai encontrar Chiara Mastroianni, ignorando que é a irmã de Charlotte, que nesse momento vive nos Estados Unidos – são ambas filhas de Catherine Deneuve, que passa o filme a cozinhar para as filhas, relação sensual com os alimentos e com os talheres que, disse ela, é uma das histórias da sua vida.

Poelvoorde e Chirara casam-se. Como é expectável, mais cedo ou mais tarde Charlotte vai saber quem é o marido da irmã. A banda sonora, até essa altura, já fez aproximações  do melodrama ao film noir, como, referências assumidas por Jacquot, no Leave her to Heaven, de John M Stahl, ou na Mulher do Lado, de Truffaut (este também pelo retrato de uma certa burguesia da província francesa). Uma voz off aparece três ou quatro vezes para situar o espectador no tempo e no lugar: é um dispositivo que pode soar estranho à distância, parecerá um preciosismo, mas está entranhado na disposição do filme de seguir em frente com as regras internas da sua verosimilhança, olhando para o espectador a ver se este acompanha. Quem não tiver coração para seguir Poelvoorde, cansa-se.

                

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