Realizadores europeus querem audiovisual fora do acordo de comércio com os EUA

Petição lançada esta segunda-feira está assinada por alguns dos nomes mais importantes do cinema europeu como Michael Haneke, Luc e Jean-Pierre Dardenne, Michel Hazanavicius, Pedro Almodóvar e Mike Leigh.

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Michael Haneke, realizador de Amor, é o primeiro signatário da petição DR

Vários realizadores de renome, na sua maioria europeus, lançaram esta segunda-feira uma petição endereçada aos líderes europeus para que a indústria do audiovisual fique de fora do novo acordo de comércio livre, que está a ser negociado entre a União Europeia (UE) e os Estados Unidos. Com duras críticas a Durão Barroso, os signatários desta petição, encabeçada pelo austríaco Michael Haneke, realizador de Amor, escrevem que a excepção cultural não é negociável.

A acção conjunta dos realizadores surge depois de Barack Obama ter anunciado em Fevereiro um acordo com a União Europeia, que  poderá representar um crescimento económico de 0,5% do PIB para os europeus e de 0,4% para os americanos em 2027. No entanto, os realizadores, como os irmãos belgas Luc e Jean-Pierre Dardenne, o francês Michel Hazanavicius, o espanhol Pedro Almodóvar ou o britânico Mike Leigh, temem os efeitos deste acordo, defendendo que se a excepção cultural existe é para que a Europa não seja inundada pela produção audiovisual americana. Devendo por isso manter-se assim e impor limites à importação de filmes americanos.

“Há 20 anos, a excepção cultural apareceu na cena internacional, levando ao reconhecimento de um estatuto específico para as obras audiovisuais, uma vez que estas não são bens como outros quaisquer, devendo por isso ser excluídas das negociações comerciais”, lê-se na petição, que explica que foi graças a esta medida que se conseguiu garantir uma diversidade cultural em toda a Europa. A excepção cultural "permite o intercâmbio e a compreensão mútua, sendo também um vector para o crescimento e a criação de emprego”, continua o texto da petição que conta já quase com cem assinaturas.

A fim de salvaguardar a sua própria diversidade cultural e promover a produção local, a União Europeia conseguiu uma isenção das regras do comércio livre da Organização Mundial do Comércio, conhecida por “excepção cultural”, que permite que os países europeus coloquem limites à importação de determinados bens culturais como os filmes. Esta excepção prevê ainda uma percentagem mínima de tempo de difusão para os programas europeus, reflectindo a preocupação de evitar que as produções americanas absorvam uma parte significativa do mercado.

“Estão esquecidas as palavras apaixonantes do Presidente Barroso em 2005: ‘Numa escala de valores, a cultura vem primeiro do que a economia’. Esquecidas, também, estão as declarações de amor ao cinema do Presidente Barroso quando os realizadores foram forçados a agir para defender o programa MEDIA. E o que aconteceu ao slogan da Comissão, ‘Os Europeus amam cinema?’”, lembram os realizadores, entre os quais está o norte-americano David Lynch.

Na petição é então exigido aos líderes europeus que se pronunciem a favor da excepção cultural quando começarem as negociações deste acordo de comércio livre, que tem como grande objectivo suavizar as diferenças de regulação que têm prejudicado o comércio entre as duas regiões em áreas como a agricultura, os químicos, os produtos farmacêuticos ou os automóveis.

As conversações sobre este acordo comercial devem começar em Julho embora ainda não tenham sido avançadas datas certas. O Reino Unido espera que a Cimeira do G8, em Junho na Irlanda do Norte, dê um empurrão às negociações.

“Aqueles que, em nome da Europa, aceitarem esta resignação serão para sempre culpados aos olhos da História”, afirmam os signatários, defendendo que “a liberalização do sector do audiovisual e do cinema levará à destruição de tudo o que até agora protegeu, promoveu e ajudou a desenvolver as culturas europeias".

A petição só esta segunda-feira foi lançada mas conta já com alguns dos nomes mais importantes do cinema europeu. Além dos acima referidos, também Aki Kaurismäki, Costa Gavras, Bela Tarr, Marco Bellocchio, Paolo Sorrentino, Joachim Trier e Ken Loach já assinaram o documento. Nas últimas horas aparecem já alguns nomes portugueses entre as mais de 700 assinaturas. É muito provável que nos próximos dias a lista dos signatários aumente consideravelmente, sendo que é aberta a qualquer cidadão e não apenas ao mundo do cinema.

Notícia actualizada às 9h19: Acrescentada a informação de que já há nomes portugueses na petição
 

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