“Ninguém dorme debaixo da semiótica”, disse Souto de Moura em Paraty

Pritzker português elogiou obra de Paulo Mendes da Rocha num debate esta quinta-feira na Festa Literária Internacional de Paraty, no Brasil

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Eduardo Souto de Moura (ao centro) e Paul Goldberg ( à direita) Walter Craveiro/ Festa Literária Internacional de Paraty

Paul Goldberger, crítico de arquitectura da The New Yorker e da Vanity Fair , e interlocutor de Eduardo Souto de Moura na conversa que decorreu hoje na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), no Brasil, considerou-a “a melhor frase do dia, possivelmente da semana”. E o público em Paraty aplaudiu.

O arquitecto português, Prémio Pritzker de arquitectura 2011, acabara de dizer que “ninguém dorme debaixo da semiótica”. E mais à frente diria que as pessoas  também “não conseguem almoçar debaixo de um manifesto”. Discutia-se o peso da teoria na arquitectura, e Souto de Moura explicou que quando era estudante, nos anos 70, “falava-se de tudo menos de arquitectura” e que “o importante era a semiótica”. Foi então que surgiu em Portugal um programa que implicava a construção em larga escala de casas, hospitais, escolas. “Ninguém sabia fazer. A nossa formação era só metafísica. No fim do curso, eu e os meus colegas não sabíamos fazer uma linha”. Valeu-lhe Álvaro Siza e, Mies van der Rohe, arquitecto que mais admira e que dominou grande parte da conversa na FLIP que foi transmitida em directo no site oficial do evento.

Souto de Moura insistiu muito na questão do equilíbrio entre uma arquitectura habitável e a necessidade de fazer “arquitectura para os museus” — ou seja, para ficar na História. E interrogou-se sobre por que é que muitas das casas que os críticos e historiadores apontam como os grandes exemplos da arquitectura do século XX foram pouco habitadas, como acontece com a Villa Savoye de Le Corbusier.

Foi aí que disse que “as pessoas não conseguem almoçar debaixo de um manifesto”, o que deixou a Paul Goldberger a ingrata (foi ele quem o disse) tarefa de defender a teoria. “O erro é ver essas casas como protótipos”, disse o crítico. “São obras de arte únicas. Mas eu aprecio a Villa Savoye porque não tenho que viver nela. É muito difícil viver todos os momentos dentro de uma obra de arte. Quem é que consegue ouvir um quarteto de cordas de Beethoven o dia inteiro, todo o tempo?”.

Questionado sobre quais os arquitectos brasileiros que mais admira, Souto de Moura fez um rasgado elogio a Paulo Mendes da Rocha, e à sua obra em Lisboa, o (ainda por inaugurar) novo Museu dos Coches. Quanto às críticas, diz que as aprecia desde que não sejam ofensivas ou pessoais, e defendeu que a arquitectura “não deve ser adjectivada”.

Numa entrevista ao jornal Globo, o arquitecto português falou do projecto para o qual foi convidado, juntamente com Álvaro Siza, de um pavilhão temporário no Parque do Ibirapuera que deveria estar pronto para a Bienal de Arquitectura de São Paulo, em Outubro, mas para o qual não há financiamento porque “Portugal não tem dinheiro e os brasileiros perguntam qual a razão para financiarem um pavilhão português”.

Siza confirmou isso mesmo à Lusa, explicando que o projecto, no valor de 880 mil euros, está à espera de que a Secretaria de Estado da Cultura concretize o apoio que prometera.

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