Cacofonia

Cate Blanchett muda de pele de cena para cena, recitando dezenas de textos, do manifesto do Partido do Comunista ao manifesto do Dogma 95. Um pequeno tratado sobre como a sobranceria conceptual pode arruinar uma boa ideia.

A lógica de “instalação” preside a todo o filme, no sentido mais pobre do termo: <i>Manifesto</i>>
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Filme sobre manifestos artísticos (e em parte, políticos), Manifesto tem pouco de manifesto, mas é como um pequeno tratado — sobre como a sobranceria conceptual pode arruinar uma boa ideia. Rosefeldt recolhe dezenas de textos, do manifesto do Partido do Comunista ao manifesto do Dogma 95 cunhado por von Trier, e deslocando-os para contextos novos, fá-los recitar por uma Cate Blanchett que muda de pele de cena para cena.

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A ideia parece ser uma homenagem: provar, ou experimentar, a validade destes textos (essencialmente teóricos, mesmo quando propõem uma praxis) em circunstâncias, e em estilos de dicção, que pouco ou nada têm a ver com a sua origem — excertos do manifesto Dada durante um velório, ou fragmentos de Brakhage (as Metaphors on Vision) ou de Jarmusch (aquele célebre textinho sobre Cinco Regras de Ouro para aspirantes a cineastas) recitados numa sala de aula para e por miúdos pequenos. A questão é que isto, na verdade, não produz nada ou produz muito pouco, embrulhado que está num “show off” frequentemente grotesco e sempre muito exibicionista — intrincados movimentos de câmara, com gruas, drones e o que mais houver, ou pequenos “teatrinhos” confrangedores onde a pobre Blanchett parece completamente perdida (todo o segmento punk rock, por exemplo). Acaba em cacofonia, um split screen a sobrepor personagens e textos, num cúmulo da lógica de “instalação” que preside a todo o filme, no sentido mais pobre do termo: a apresentação de um efeito, em vez da reflexão de uma experiência.

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