Padre da Casa do Gaiato acusado de 13 crimes de maus tratos

Director de instituição da Casa do Gaiato que acolhe deficientes profundos e doentes incuráveis terá dado medicação, castigado e agredido utentes. Segundo o MP, também ?os privou de alimentos.

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O bispo local já veio afirmar que a posição do padre não revela o sentimento da Igreja Adriano Miranda

O Ministério Público (MP) acusou um padre que há seis décadas dirige o Calvário, instituição da Casa do Gaiato que acolhe doentes incuráveis e deficientes em Beire (Paredes), da prática de 13 crimes de maus tratos e de um crime de ofensa à integridade física grave. Trata-se de um sacerdote octogenário que estará doente e que já tinha no passado sido indiciado por maus tratos, acusações que acabaram por ser arquivadas, apurou o PÚBLICO.

Segunda uma nota divulgada esta terça-feira pela Procuradoria-Geral Distrital do Porto, o padre que era o único responsável pela gestão diária do estabelecimento “procedia ele próprio à medicação de utentes, doseando segundo o seu critério, e à sutura de feridas”. De acordo com a acusação, “castigava os utentes desferindo-lhes bofetadas ou pancadas com uma bengala ou privando-os de alimentos, ou fechando-os em quartos, locais de arrumos ou num buraco destinado a silo de cereais”. De maneira a poder “controlar os movimentos de alguns utentes”, o padre terá também determinado “que fossem amarrados pelos pulsos às grades das varandas dos pavilhões, às cadeiras de rodas ou às cadeiras sanitárias”.

Ainda segundo o MP, o arguido “nunca contratou, nem sequer a tempo parcial, quaisquer técnicos especializados para a instituição, nomeadamente nas áreas da saúde mental, geriatria, terapia ocupacional ou enfermagem”. Os factos que constam da acusação reportam-se ao período de Agosto de 2006 a 21 de Maio de 2015. O PÚBLICO tentou falar com responsáveis do Calvário e da Casa do Gaiato, sem sucesso.

Surpreeendido com a notícia da acusação, o padre Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, defende que esta situação “não pode ser julgada de ânimo leve”. Quando o Calvário começou a funcionar, em 1957, era uma instituição pioneira, recorda. “O padre Américo dizia que, pior do que não ter onde viver, era não ter onde morrer”, frisa.

O Calvário foi construído para albergar pessoas que não tinham rectaguarda familiar ou tinham sido rejeitadas pela família, lembra Lino Maia, notando que o padre “dedicou a sua vida àquelas pessoas”.

Já tinha sido indiciado antes mas processo foi arquivado

Esta não é a primeira vez que o director do Calvário é constituído arguido. Em 2004, foi indiciado num processo por suspeita de maus tratos a dois menores. Um deles tinha sido encontrado amarrado pelos pulsos, num quarto. A justificação apresentada pelo padre foi a de que o jovem fugia e comia as suas próprias fezes, se estivesse em liberdade. Os menores foram transferidos e o processo foi arquivado pelo MP. “Não resultaram das diligências efectuadas indícios suficientes da prática de qualquer ilícito penal”, nem quaisquer “indícios da prática de maus tratos”, concluiu o magistrado do MP.

Este inquérito tinha sido instaurado na sequência de um relatório da Inspecção-Geral da Segurança Social que chegou a comparar o cenário encontrado na instituição ao de um hospício do século XIX. Os utentes dependentes de terceiros passavam grande parte do dia sentados em aparadeiras, devido à falta de pessoal, referia o documento, que acrescentava que alguns estavam amarrados pelos pulsos.

Eram os deficientes mentais com mais capacidade que tratavam dos mais dependentes e muitos passavam todo o dia a trabalhar na agro-pecuária e na limpeza das instalações, ainda de acordo com o relatório, que descrevia que o padre andava frequentemente com um estetoscópio para perceber se os deficientes sofriam de problemas de saúde.     

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