O crescimento é económico e o desenvolvimento é humano

Um crescimento económico com interesse para Portugal, isto é, gerador de desenvolvimento humano, exige o papel ativo de um Estado empreendedor em parceria com as organizações da sociedade civil.

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O crescimento é económico e o desenvolvimento é humano. Crescer significa alargar no tempo a capacidade de produzir bens e serviços num território. Desenvolver significa potenciar no tempo a qualidade de vida da população que habita o referido território.

Para Amartya Sen, a liberdade é um meio constitutivo do desenvolvimento humano e um seu fim. O autor estabelece as seguintes liberdades instrumentais ou constitutivas do desenvolvimento: i) liberdades políticas (democracia); ii) dispositivos económicos (incluindo políticas redistributivas); iii) oportunidades sociais (educação e saúde); iv) garantias de transparência (confiança); v) previdência social (proteção dos mais vulneráveis); e, acrescentamos, vi) um clima estável. Expandir estas liberdades instrumentais ou capacidades das pessoas em sociedade potencia a liberdade das mesmas escolherem uma vida que faça sentido para si, potencia a qualidade de vida em sociedade.

O relatório Brundtland da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1987, estabelece que o crescimento económico constitui desenvolvimento sustentável quando é socialmente inclusivo e respeitador dos limites biofísicos do planeta. Como refere Jeffrey Sachs, o conceito de desenvolvimento sustentável da ONU pode ser entendido como um conceito normativo do crescimento económico. É aquilo que o crescimento económico deve ser, para constituir desenvolvimento sustentável e suportar o desenvolvimento humano, pelo que não serve um crescimento económico qualquer.

Sucede que nos últimos 40 anos, como mostram Janet Gornick, Thomas Piketty, Joseph Stiglitz e outros autores, o crescimento económico tem conduzido a um aumento da desigualdade de rendimentos em todos os países do mundo, também nos países mais ricos da OCDE a que Portugal pertence, e tem colocado em causa os limites biofísicos do planeta. Por outras palavras, o crescimento económico não tem constituído desenvolvimento sustentável gerador de desenvolvimento humano.

Um crescimento económico com interesse para Portugal, isto é, gerador de desenvolvimento humano, exige o papel ativo de um Estado empreendedor em parceria com as organizações da sociedade civil. Exige uma política industrial com uma base territorial sub-nacional e um Estado multinível e subsidiário que a suporte, como sucede em países como a Alemanha e a Espanha. Exige, por fim, a recuperação da figura de plano no contexto de uma economia de mercado, na boa tradição americana do pós-Segunda Guerra. Por outras palavras, não cai do céu. O dumping fiscal entre Estados-membros, para atrair as grandes empresas multinacionais e a respetiva tecnologia, não garante um crescimento económico com interesse para o país.

Em vez de apostar no referido dumping fiscal, Portugal deveria propor às instituições europeias que os impostos às grandes empresas multinacionais (financeiras, tecnológicas e outras) fossem cobrados pela União Europeia (UE), que tem outra capacidade de os cobrar, e servissem para financiar o Orçamento Europeu. Nessa altura, os Estados-membros seriam libertos de ter de contribuir para o referido orçamento, ficando com os recursos inerentes. Esta seria também uma forma de acabar com as guerras acerca de quem paga ou deixa de pagar o Orçamento Europeu, guerras que têm paralisado o aprofundamento da União Europeia. É que todos os Estados-membros passariam a ser beneficiários líquidos do Orçamento Europeu.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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