Bruxelas confirma perda de dinamismo e revê em baixa crescimento de Portugal

Comissão Europeia projecta crescimento de 2,2% em 2023 e uma desaceleração no próximo ano, com o PIB a aumentar 1,3% antes de recuperar para 1,8% no ano seguinte.

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Fernando Medina, ministro das Finanças LUSA/TIAGO PETINGA
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A Comissão Europeia reviu em baixa as suas anteriores projecções para o crescimento do Portugal e confirmou a perda do dinamismo da economia nacional: este ano, o Produto Interno Bruto deverá crescer 2,2%, e não 2,4%, como Bruxelas estimava há seis meses.

A desaceleração da actividade económica no país será mais evidente no próximo ano, com Bruxelas a projectar um crescimento de 1,3% em 2024, e uma recuperação parcial no ano seguinte, em que se estima um aumento do PIB de 1,8%.

“Há algumas diferenças ligeiras em relação às projecções das autoridades portuguesas”, notou o comissário europeu da Economia, Paulo Gentiloni, observando que “em 2023 a estimativa para o crescimento do PIB é idêntica à do Governo, e marginalmente acima do Banco de Portugal, mas para 2024 temos uma projecção inferior, como é o caso em vários outros países”.

O comissário, que disse que o eventual impacto da crise política nacional nas contas públicas não foi avaliado neste exercício, identificou outra diferença na avaliação de Bruxelas e Lisboa, relativamente à trajectória da dívida pública.

“Temos algumas diferenças, mas neste ponto até espero estar errado, porque gosto desta meta da dívida abaixo dos 100% do PIB estabelecida pelas autoridades portuguesas”, afirmou Gentiloni, esclarecendo que nas estimativas de Bruxelas, esse objectivo só deverá ser alcançado em 2025 e não no próximo ano, como diz o Governo.

Apesar da quebra, o desempenho da economia portuguesa, este ano e nos próximos, continua acima da média europeia, fortemente penalizada pela contracção da Alemanha, que segundo Bruxelas, não escapará da recessão este ano, com um crescimento negativo de 0,3%.

No total, serão dez os países com um crescimento negativo este ano: Alemanha, Irlanda, Estónia, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Áustria, República Checa, Hungria e Suécia. Uma situação que o comissário europeu da Economia, Paulo Gentiloni, explicou com o forte impacto da subida do preço da energia (principalmente no caso da Alemanha).

Este cenário obrigou a Comissão Europeia a corrigir as suas estimativas de crescimento tanto no conjunto da UE como na zona euro, que no ano de 2023 deverá ficar nos 0,6%, uma quebra de 0,2 pontos percentuais face às previsões intercalares do Verão e de 0,5 pontos percentuais quando comparado com o valor de 1,1% anunciado na Primavera.

O contexto macro-económico descrito pelo executivo comunitário, na divulgação do seu exercício de Outono do Semestre Europeu, esta quarta-feira em Bruxelas, continua a ser de grande incerteza, marcado pelo “elevado custo de vida”, a “fraca procura externa” e as “maiores restrições” da política monetária.

A Comissão assinala os riscos do prolongamento da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia e do conflito no Médio Oriente — que até agora teve um “efeito contido” nos mercados de energia. Porém, não se pode excluir que ainda possa provocar “perturbações no aprovisionamento energético”, com impacto nos preços a nível global e na produção mundial. A evolução económica na China é outro facto externo que preocupa Bruxelas.

A boa notícia tem a ver com o ritmo de queda da taxa de inflação, que de acordo com Bruxelas terá descido para um mínimo de dois anos no mês de Outubro, “e deverá continuar a diminuir ao longo do horizonte das previsões”, apesar de poder demorar mais três anos a atingir o valor de referência de 2% do Banco Central Europeu.

Em Portugal, a taxa de inflação deverá ficar em 5,5% em 2023, e reduzir para os 3,2% em 2024 e os 2,4% em 2025. Mais uma vez, os números são melhores em Portugal do que na média da zona euro, cuja inflação será de 5,6% em 2023, e na UE, com uma taxa de 6,5% este ano. No próximo ano estes valores caem quase para metade (3,2% e 3,5%, respectivamente), e ainda mais em 2025, quando Portugal deverá alinhar com os 2,4% previstos para a UE.

Esta tendência de abrandamento da inflação, conjugada com o crescimento sustentado dos salários graças a um mercado de trabalho “robusto, a recuperação do consumo interno, e o aumento do investimento, auxiliado pela execução dos Planos de Recuperação e Resiliência, oferece perspectivas de uma melhoria do quadro macro-económico no próximo ano e seguintes.

Bruxelas projecta um crescimento de 1,3% do PIB da União Europeia em 2024, e de 1,7% em 2025 — mais uma vez, trata-se de uma revisão em baixa de 0,1 pontos percentuais em relação ao Verão. Na área do euro, os valores são ligeiramente inferiores, com o crescimento no próximo ano a ficar nos 1,2% e a subir para 1,6% no ano seguinte.

Na avaliação da Comissão, apesar de terem de lidar com um contexto económico menos favorável, e de suportar custos mais elevados por causa da subida das taxas de juro, as contas públicas deixarão de estar tão condicionadas no lado da despesa depois da eliminação das medidas de crise adoptadas durante a pandemia e dos apoios temporários relacionados com o aumento do preço da energia.

“Consequentemente, prevê-se que o défice das administrações públicas da UE diminua ligeiramente em 2023, para 3,2% do PIB, (…) e que a contenção do apoio orçamental discricionário reduza ainda mais o défice público da UE para 2,8% do PIB em 2024 e para 2,7% em 2025”, lê-se no relatório divulgado esta quarta-feira.

“Estamos a aproximar-nos do fim de um ano muito desafiante, em que as perspectivas pioraram mais do que estimávamos. A nossa expectativa é que em 2024 quase todas as economias melhorem gradualmente o seu desempenho, antes de experimentar uma expansão mais forte em 2025”, disse o comissário europeu da Economia, Paulo Gentiloni.

No entanto, Portugal continua ser uma excepção: no próximo ano, ao contrário de outros Estados-membros, a economia nacional parece não beneficiar da entrada em velocidade cruzeiro da execução dos Planos de Recuperação e Resiliência.

Na Primavera, Bruxelas já tinha deixado um recado ao país sobre a necessidade de “assegurar uma capacidade administrativa adequada” para evitar atrasos na execução dos investimentos e reformas programados, comprometendo os desembolsos das futuras parcelas (de subvenções e também empréstimos).

Questionado sobre as repercussões negativas das investigações judiciais que determinaram a queda do Governo, e se põem em causa projectos ligados à transição energética e digital, Paulo Gentiloni disse ter tomado nota “da decisão de aprovar o orçamento [do Estado] antes da convocação de eleições”, e manifestou a sua convicção de que “a situação não tenha impacto no investimento no país”.

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