Vídeos educativos: será que funcionam?

Parece existir evidência que este tipo de curtos vídeos educativos promove apenas um conhecimento superficial, que não perdura.

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A oferta de vídeos educativos prolifera na Internet Andrea Piacquadio/pexels

Na Internet abundam vídeos educativos, mas estes não parecem ser boas ferramentas pedagógicas. Uma investigação muito recente indica que, em matemática, os vídeos educativos facilitam apenas uma aprendizagem superficial. Combinar vídeos com estratégias que aumentam a aprendizagem (por exemplo, a prática de recuperação) pode aumentar o seu valor pedagógico.

Será que assistir a curtos vídeos educativos pode causar mudanças nas redes neuronais que processam informação? Parece que não, pelo menos no domínio da matemática. Esta é a conclusão de um estudo conduzido pelos investigadores Marie Amalric, Pauline Roveyaz e Stanislas Dehaene, de centros de investigação em Itália, Estados Unidos e França, recentemente publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences.

A oferta de vídeos educativos prolifera na Internet. Estes são normalmente gratuitos, curtos, e cobrem vários domínios e graus de estudo — da biologia à geologia, do pré-escolar à universidade. A acessibilidade torna-os instrumentos de estudo bastante utilizados, que parecem poder despertar o interesse dos alunos e facilitar o trabalho dos professores. Mas será que melhoram verdadeiramente a aprendizagem?

Almaric, Roveyaz e Dehaene estudaram o efeito do visionamento de curtos vídeos de matemática nas redes neuronais envolvidas no processamento de conhecimentos nesse domínio. Para tal, criaram vídeos semelhantes aos oferecidos por uma plataforma online bastante conhecida, a Khan Academy, e usaram ressonâncias magnéticas funcionais para medir a atividade cerebral de 21 alunos enquanto respondiam a perguntas, antes e depois de assistirem aos vídeos.

Além de identificarem áreas cerebrais que respondem sobretudo a conhecimentos matemáticos e não a outros tipos de conhecimento (por exemplo, geográficos ou históricos), os estudos neurocientíficos permitem identificar uma rede neuronal capaz de integrar novos conhecimentos matemáticos. Os investigadores deste trabalho focaram-se especificamente nesta rede neuronal, procurando saber se é possível visualizar a rápida integração de novos conhecimentos após os alunos assistirem aos vídeos educativos. Apresentaram-lhes vídeos de cinco minutos, sobre conceitos matemáticos que os alunos ainda não tinham aprendido, e vídeos-controlo sobre biologia e direito. Antes e depois de assistirem aos vídeos, os alunos avaliaram a veracidade de afirmações verbais nos domínios apresentados. Estas afirmações incluíam conceitos já conhecidos, conceitos desconhecidos mas ensinados nos vídeos, e conceitos desconhecidos e não ensinados.

Durante a visualização dos vídeos sobre matemática, as imagens de ressonância magnética indicaram a ativação de uma rede neuronal que inclui os nódulos temporais intraparietais anteriores e inferiores e é específica para conhecimentos matemáticos. No entanto, alguns minutos mais tarde, enquanto os alunos respondiam a perguntas sobre os conceitos ensinados nos vídeos, os investigadores só identificaram atividade em redes neuronais genéricas e envolvidas em memória a curto-prazo e em linguagem. Verificou-se também que o desempenho dos alunos aumentou apenas ligeiramente nos conceitos desconhecidos mas ensinados nos vídeos.

Estes resultados sugerem que, após verem os vídeos, o desempenho dos alunos terá melhorado não porque os novos conhecimentos foram integrados e profundamente aprendidos, mas porque os estudantes ainda mantinham imagens e sons dos vídeos nas suas memórias a curto-prazo. Assim, parece existir evidência que este tipo de curtos vídeos educativos promove apenas um conhecimento superficial, que não perdura.

Os investigadores concluem que os vídeos não devem ser suficientes para produzir uma aprendizagem substancial e duradoura, embora possam ser úteis para introduzir conceitos, transmitir entusiasmo e cativar os alunos. No entanto, assistir a esses vídeos não substitui experiências pedagógicas que incluam aprendizagem ativa por parte dos alunos, interação com professores e estratégias de ensino baseadas em ciência, tais como a prática de recuperação.


Bibliografia
Amalric, M., Roveyaz, P., & Dehaene, S. (2023). Evaluating the impact of short educational videos on the cortical networks for mathematics. Proceedings of the National Academy of Sciences, 120(6).


Artigo em parceria com Teresa e Alexandre Soares dos Santos – Iniciativa Educação.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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