“A democracia europeia está sob ataque”, diz presidente do Parlamento Europeu

Roberta Metsola disse que a União Europeia “não está à venda” e garantiu que “não haverá impunidade” para os membros europeus envolvidos no alegado esquema de corrupção para beneficiar o Qatar.

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"Estes foram dos dias mais longos da minha carreira", admitiu a Presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola JULIEN WARNAND/EPA

A presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, deixou esta segunda-feira avisos para aquilo que define como um "ataque" à democracia europeia, assim como à instituição que preside e à "nossa sociedade livre, aberta e democrática".

As declarações de Metsola dizem respeito à detenção da vice-presidente do Parlamento Europeu, Eva Kaili, sob acusação de ter participado num esquema de corrupção para beneficiar o Qatar. O caso é já conhecido como Qatargate.

"Não é exagero dizer que estes foram dos dias mais longos da minha carreira. Tenho de ter cuidado na linguagem que utilizo para não interferir ou prejudicar as investigações em curso e para não pôr em causa ou menorizar o direito à presunção da inocência. Por isso, se a minha fúria, a minha raiva e o meu pesar não transparecem no meu discurso, peço desculpa, mas garanto que elas são tão fortes como a minha determinação em fortalecer esta casa", começou por assinalar Roberta Metsola no início da sessão plenária desta segunda-feira em Estrasburgo.

"Não tenham dúvidas, o Parlamento Europeu está sob ataque, a democracia europeia está sob ataque e a nossa sociedade livre, aberta e democrática está sob ataque. Os inimigos da democracia para quem a mera existência deste Parlamento constitui uma ameaça não vão parar. Estes actores malignos ligados a países terceiros autocráticos utilizaram ONG, sindicatos, indivíduos, assistentes e membros do Parlamento Europeu num esforço para interferir com os nossos processos. Os seus planos maliciosos falharam. A União Europeia [UE] não está à venda", garantiu a presidente do órgão legislativo europeu.

Roberta Metsola garantiu ainda que os serviços do Parlamento Europeu "têm estado a trabalhar com as autoridades para desmantelar esta rede criminosa e para assegurar que toda a informação é preservada, todo o material relevante é apreendido e todas as buscas podem ser realizadas". E acrescentou também o recurso ao artigo 21.º do regime do Parlamento Europeu, que diz respeito à cessação antecipada de funções, para que o mandato de vice-presidente seja retirado.

Face ao caso, Metsola, anunciou uma série de medidas que incluem uma investigação interna e a reforma do acesso dos grupos de lobbying às instalações parlamentares, assim como a protecção de denunciantes de actos criminosos.

A responsável europeia disse que o relatório sobre a abertura de negociações para a liberalização de vistos com o Qatar e Kuwait "não pode ser discutido e deve ser remetido de novo para comissão": "A corrupção não pode compensar. Estes planos não se podem materializar."

"Estas alegações não são de esquerda, direita, Norte ou Sul. Peço que não explorem este momento para marcar pontos políticos. Este é um teste para o nosso sistema. Não haverá impunidade, nenhuma", disse Metsola.

Eva Kaili, eurodeputada do Partido Socialista grego (PASOK) e uma das 14 vice-presidentes do Parlamento Europeu, foi detida na sexta-feira e a sua prisão preventiva foi confirmada no domingo sob acusação dos crimes de organização criminosa, corrupção e branqueamento de capitais no âmbito de uma investigação que incide sobre os esforços de lobbying por parte do Governo do Qatar junto do Parlamento Europeu. Na sexta-feira, foram feitas buscas em 16 residências em Bruxelas e apreendidos 600 mil euros em dinheiro.

De acordo com os procuradores belgas, eurodeputados receberam subornos durante meses para influenciarem decisões no Parlamento Europeu em favor do Qatar.

Esta segunda-feira, as autoridades gregas congelaram os bens de Eva Kaili, uma medida também estendida aos familiares mais próximos.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, classificou as alegações contra a vice-presidente do Parlamento Europeu "muito graves" e reconheceu que "são motivo de grande preocupação" para o executivo comunitário, uma vez que "abala a confiança dos cidadãos" nas instituições europeias.

"Sabemos que é preciso trabalhar mais para garantir essa confiança e também a independência e credibilidade das nossas instituições, com critérios de integridade mais apertados, regras mais claras e mecanismos de controlo comuns", disse esta segunda-feira Ursula von der Leyen, recordando que a Comissão avançou em Março com uma proposta legislativa para a implementação de um novo organismo de ética europeu que cobrisse todas as instituições (Comissão, Parlamento Europeu, Conselho da UE, BCE e Tribunal de Contas). A proposta está actualmente em discussão com os co-legisladores.

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