Autora do Jardim de Sophia, no Porto, “deveria ser convidada para o refazer”

Histórico da arquitectura paisagista em Portugal, Fernando dos Santos Pessoa escreveu, “incomodado”, carta a Rui Moreira.

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O jardim de Sophia foi construído na década de 90 do século passado. Paulo Pimenta

O arquitecto paisagista Fernando dos Santos Pessoa escreveu a Rui Moreira, incomodado pela forma como decorreu o processo que redundou na decisão de destruir o Jardim de Sophia, para a construção, no local, de uma estação de metro da futura Linha Rosa. Saindo em defesa da autora do jardim, Marisa Lavrador, o antigo professor da Universidade de Évora defendeu que, a ser permitida a obra do metropolitano, a autora deveria ser convidada a refazer o espaço que projectou nos anos 90. 

Ao mesmo tempo que continua a correr, na internet, com mais de 1700 assinaturas, uma petição contra o arranque de sobreiros em Gaia e a destruição do Jardim de Sophia, no Porto, pela Metro do Porto, partiu do Algarve um dos últimos apelos à preservação do jardim junto à Praça da Galiza. O autor da carta a Rui Moreira, o arquitecto paisagista Fernando dos Santos Pessoa, é um dos históricos desta profissão em Portugal e co-autor, com Ribeiro Telles e outros, do capítulo sobre Ambiente da Constituição Portuguesa.

Este arquitecto paisagista defende a manutenção deste jardim, como previsto, aliás, na própria Declaração de Impacte Ambiental da linha de metro em causa. Mas assume que se o trabalho de Marisa Lavrador “tiver mesmo que ser sacrificado – o que em regra para engenheiros e alguns arquitectos nunca levanta objecções –, o mínimo que se poderia esperar da Câmara Municipal seria que convidasse a autora do jardim actual – e os jardins são obras de arte que se incluem nas Belas Artes – para fazer um novo projecto”. 

Dignificar a profissão

Com isto “se dignificava quem fizesse o convite e dignificava a profissional atingida”, escreve o antigo professor da Universidade de Évora, onde deu aulas a Marisa Lavrador, cujo “brio e profissionalismo” enaltece nesta carta. Nela assume o espanto por se ter convidado um arquitecto para intervir no local, mas, mais ainda, pelo facto de o gabinete de Eduardo Souto de Moura ter aceitado “sem rebuço” trabalhar aquele espaço assinado por outro autor. É algo que, considera este arquitecto paisagista, “deixa em aberto a questão da verdadeira ética profissional – simplesmente lamentável”. 

Souto de Moura já afirmou que não pretendia alimentar mais esta polémica. Responsável pela arquitectura de todas as estações da rede de metro, incluindo os espaços à superfície, no caso daquelas que são subterrâneas, como é o caso, o prémio Pritzker garantiu, ao PÚBLICO, que tentou envolver Marisa Lavrador no projecto de reformulação do jardim (cujo espaço vai ser escavado e usado também como estaleiro para a obra). Mas a arquitecta paisagista considera que os esforços foram tardios e insuficientes, e afirmou sentir que o seu trabalho estava a ser desrespeitado em todo o processo pelas várias entidades envolvidas: O município, a dona da obra, a Metro do Porto, e o gabinete responsável pelo projecto da estação. 

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Paulo Pimenta

Para Fernando dos Santos Pessoa, Rui Moreira também não esteve bem, ao afirmar, numa assembleia municipal recente, que, nas mãos de Souto de Moura, o jardim “vai ficar perfeito” e “melhor do que o de hoje”. “Talvez o Senhor Presidente se tenha esquecido de que existe na Universidade do Porto uma licenciatura em arquitectura paisagista e esta desfeita será sentida por toda uma classe”, lamenta o autor da carta. 

Já em Novembro passado, a própria Associação Portuguesa de Arquitectos Paisagistas tinha demonstrado público incómodo pela forma como esta questão tem sido tratada. "Deixo esse apelo [à Metro do Porto] para que garanta a preservação do Jardim de Sophia [na Praça da Galiza] e, caso seja necessária alguma alteração, aquilo que se pede é que seja a autora do projecto [a arquitecta paisagista Marisa Lavrador] a resolver esse processo”, defendeu, em declarações à Lusa, o presidente da APAP, João Ceregeiro.

Classificar o jardim da Rotunda da Boavista

A Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas (APAP) juntou-se na semana passada às sete associações do Porto que enviaram este mês à Direcção-Geral do Património Cultural um requerimento propondo a classificação do monumento e jardim envolvente da Praça Mouzinho de Albuquerque, no Porto. Em carta enviada aos proponentes da classificação, o presidente da APAP, João Ceregeiro, assinala que “apesar da importância simbólica, histórica, patrimonial e arbórea desta praça, ela ainda não consta da lista de jardins e monumentos de valor patrimonial da cidade do Porto”, o que justifica que se junte àquelas organizações. 

A proposta de classificação do jardim e do Monumento aos Heróis da Guerra Peninsular foi inicialmente subscrita pela Árvore – Cooperativa de Actividades Artísticas, pela Associação Cultural e de Estudos Regionais, a Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, a Associação Portuguesa dos Jardins Históricos, a associação de defesa do ambiente ​Campo Aberto, o Clube Unesco da Cidade do Porto e o NDMALO-GE, o Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro – Grupo Ecológico.

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