Bolsonaro nomeia amigo da família para comandar Polícia Federal

Presidente brasileiro desvalorizou críticas de que a nomeação de Alexandre Ramagem põe em causa autonomia da polícia.

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Demissão de Moro abriu crise no Governo de Bolsonaro Reuters/UESLEI MARCELINO

A nomeação de um amigo da família Bolsonaro como novo director-geral da Polícia Federal (PF) brasileira está a gerar desconforto junto das próprias forças policiais e pode dar origem a uma batalha judicial, aprofundando a crise política no Governo.

O Presidente Jair Bolsonaro quer indicar o actual director-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, para chefiar a PF – a oficialização da escolha é esperada ainda para esta segunda-feira. Ramagem foi o responsável pela segurança pessoal de Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018 e tornou-se especialmente próximo do vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, filho do Presidente.

De acordo com a imprensa brasileira, uma das razões para o descontentamento de Bolsonaro com o anterior director-geral da PF, Maurício Valeixo, era a falta de informações sobre o andamento das investigações que implicam Carlos Bolsonaro sobre uma alegada rede de difusão de notícias falsas contra adversários políticos do Governo.

Quando anunciou a sua demissão, o ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, acusou Bolsonaro de querer interferir na PF e de desejar que fosse chefiado por alguém escolhido por si, embora não tenha referido nenhum caso em particular.

A escolha de Ramagem para comandar a PF vem suscitar os receios de que o Presidente interfira na força policial.

Confrontado com um comentário numa rede social em que era questionada a amizade entre Carlos Bolsonaro e o futuro chefe da PF, o Presidente optou por desvalorizar a relação. “E daí? Antes de conhecer meus filhos eu conheci o Ramagem. Por isso, deve ser vetado? Devo escolher alguém amigo de quem?”, respondeu Bolsonaro.

Já na sexta-feira, em resposta às acusações de Moro, Bolsonaro rejeitou que pedir informações ao director da PF pudesse ser considerado uma interferência.

Nas mãos do Supremo

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao Supremo Tribunal Federal a abertura de um inquérito para apurar se as acusações de Moro constituem crimes cometidos por Bolsonaro. Ainda na sexta-feira, o ex-ministro revelou trechos de conversas pelo Whatsapp que revelavam a insistência de Bolsonaro em demitir o director-geral da PF.

Cabe agora ao STF decidir se as investigações devem avançar – o juiz Celso de Mello deverá autorizar a abertura do inquérito ainda esta semana, segundo a imprensa brasileira. Nesse caso, devem ser chamados a depor tanto Moro, que diz ter provas que apoiam as suas denúncias, como Bolsonaro.

Receando que a nomeação de Ramagem seja torpedeada pelos tribunais, o Governo passou os últimos dias a sondar elementos do STF para tentar descortinar eventuais problemas legais, diz a Folha de São Paulo. Segundo os juízes ouvidos pelo jornal, não há objecções do ponto de vista legal à nomeação – é ao Presidente que cabe nomear os responsáveis nacionais das polícias. Mas, recorda a Folha, o STF tem um historial de contemplar a situação política do momento nas suas decisões.

Os receios de que a autonomia da PF possa ser posta em causa pela nomeação de alguém tão próximo do Presidente levaram a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal a publicar uma carta aberta em que dizem não querer “trabalhar sob clima de desconfianças internas”. “O ordenamento jurídico prevê que as actividades investigativas da Polícia Federal são sigilosas e somente os profissionais responsáveis em promovê-las é que devem ter acesso aos documentos”, lembraram os delegados.

Padrinho de Eduardo

Para substituir Moro, Bolsonaro escolheu também um nome próximo do seu círculo: o actual ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira. Para além de ter sido padrinho do casamento de Eduardo Bolsonaro, deputado e filho do Presidente, Oliveira trabalhou no gabinete de Jair Bolsonaro, quando este era deputado federal. Já o pai do futuro ministro tinha sido assessor de Bolsonaro durante duas décadas.

No que pode ser interpretado como uma preciosa vitória para o Governo, a Frente Parlamentar da Segurança Pública, conhecida como “bancada da bala” no Congresso, emitiu uma declaração de “amplo apoio” a Oliveira, garantindo uma base parlamentar importante a Bolsonaro.

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