Costa já tem “borboletas na barriga” com o resultado de domingo

O socialista começou o dia como primeiro-ministro a acompanhar os efeitos do Lorenzo nos Açores e acabou em Viseu. Pelo caminho, um desvio para ir ver as obras da nova ala pediátrica do Hospital São João, no Porto.

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Costa visitou obra da ala pediátrica do Hospital de S. João, no Porto Francisco Romão Pereira

“O que vou fazer depois das eleições? O elixir já me resolveu esse problema. Fiquei com borboletas na barriga”, disse António Costa ao PÚBLICO. A metáfora usada por Costa vai buscar uma ideia deixada por um jovem que, minutos antes, numa iniciativa de rua da Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra com que a caravana se cruzou, lhe tinha oferecido um elixir que conferia a Costa o poder da curiosidade.

A resposta, aliás, encaixa no perfil daquelas que tem dado ao longo dos dias, o de empurrar para depois das eleições o segredo mais bem guardado do socialista: que “elixir extraordinário” usará para fazer magia com os resultados eleitorais.

O nervoso miudinho tem sido indisfarçável por estes dias em que António Costa tem andado numa campanha de lusco-fusco entre o Costa-candidato e o Costa-primeiro-ministro. Este último que também entra na campanha, pela várias vias, desde o acompanhamento da situação nos Açores, depois da passagem do furacão Lorenzo, e das obras. Primeiro foram as do IP3 e, nesta quarta-feira, num desvio de Coimbra ao Porto para ir para Viseu, para visitar as da ala pediátrica do Hospital de São João no Porto. A construção da obra que lhe valeu fortes críticas da oposição durante meses começou na terça-feira e foi presenteada com a presença de Costa menos de 24 horas depois. 

“Não é conveniente?” Se o Governo que lidera lhe deu uma oportunidade (ou duas), o candidato não a desperdiçou e assumiu que quer mostrar o trabalho feito: “Teria sido muito mais conveniente a obra ter sido possível inaugurar” antes, responde.

Num dia com acrescentos de agenda de última hora, o socialista volta a ter os pés assentes na campanha e na sua mensagem das “prioridades para os portugueses”, uma fórmula que usa para não responder aos assuntos laterais - leia-se, o caso de Tancos. Mas pés assentes em passo de corrida. Num só dia pôs o pé em três distritos enquanto candidato, Viseu, Porto e Coimbra, e ainda em mais um como primeiro-ministro, Lisboa.

Tancos é aliás o assunto que contorna rápido, quase tão rápido quanto são alguns dos cumprimentos de rua. Há quatro anos Costa dizia e repetia que era na rua que se sentia bem, mas mantém a dificuldade em fazer conversa, em ter uma postura mais descontraída. Poucos têm sido os contacto de rua nesta campanha eleitoral, o socialista prefere outro tipo de iniciativas (poucas), mas não se pode dizer que a rua lhe corre mal, das poucas vezes que o fez nestes 15 dias, foi o contrário.

O regresso da Dona Fernanda para dar a volta ao texto de 2015...

É o próprio que admite que em 2015 tinha uma barreira para quebrar e que não o conseguiu fazer. Foi em Viseu, há quatro anos, que diz ter percebido que não ia ganhar as eleições de 2015. Tudo porque teve uma conversa com “a dona Fernanda que tem uma drogaria ali na Rua Direita” que lhe disse que não acreditava que, se António Costa fizesse tudo o que prometia, o país não entraria numa nova crise.

Agora, a dona Fernanda aparece num vídeo de apoio ao PS e Costa diz que esse foi um testemunho que agora, em vez de desalento, lhe deu confiança: “Emocionei-me particularmente a ouvir depoimento”, contou. “Há quatro anos foi a pessoa com quem falei que ao falar percebi que não íamos ganhar as eleições. Na altura disse-me :'eu acho que o senhor tem razão, mas eu tenho muito medo que, se fizer isso tudo, o país volte a andar para trás e cheguemos a uma grande crise outra vez'”. Costa conta que lhe pediu um “esforço” e que votasse no PS. “Estou convencido que não [votou]”.

O discurso de Fernanda mudou e o de Costa também. A viseense é a prova viva para os socialistas que mostra que o partido deu a volta ao texto de 2015. Na altura pedia uma maioria absoluta e nesse dia percebeu que não iria ganhar as eleições, agora não a pede e as sondagens dizem-lhe que está longe de a conseguir. 

Perante a obra feita - à noite em mais uma praça ao ar livre, desta vez no Rossio, em Viseu, voltou a referir o IP3 como exemplo de algo que não pode “andar e parar, avançar e recuar” - o socialista desta vez mostrou-se confiante que ultrapassou a barreira psicológica desse medo dos portugueses porque tem na bagagem os compromissos cumpridos.

“Às donas Fernandas que não acreditaram em nós, que não confiaram em nós, que tiveram medo de nós, aquilo que podemos dizer hoje é que sim, devolvemos os salários cortados; sim devolvemos as pensões que tinham sido cortadas; sim, eliminámos a sobretaxa do IRS; sim, poupámos aos portugueses mil milhões de euros por ano em IRS; sim, poupámos 2 mil milhões de euros de juros da dívida; e sim, temos o défice mais baixo da nossa democracia e vamos continuar a baixar o défice, a dívida e a ter contas certas”.

... ao medo do papão da maioria absoluta

Nestas eleições Costa diz ter aprendido com os erros do passado e por isso não pede uma maioria absoluta. Diz, aliás, que sabe que os portugueses não são fãs dessa forma de Governo. A luta deste PS agora é a de afastar o “papão da maioria absoluta” da ideia dos eleitores para que estes não pensem nisso na hora de pôr a cruz. É por isso que Costa se tem esforçado nos últimos dias em fazer um apelo ao voto no PS, mas afastando sempre essa ideia. Esta noite em Viseu, no largo do Rossio, voltou a fazê-lo. "Não se ponham a olhar para sondagens para verem como vão votar. Num dia temos maioria, noutro estamos em queda, noutro a recuperar. Só temos o resultado que tivermos no próximo domingo, não é o resultado que as sondagens nos dão”, insistiu.

Se em 2015 tinha mais mais dificuldade em passar a mensagem porque era difícil arrancar confiança, mesmo que essa fosse a sua palavra mote na campanha, agora é receptor de queixas, sobretudo sobre alguns serviços públicos, mas a maior parte ouve palavras de apoio. Em Viseu, acabou por passar ao largo de uma manifestação de motoristas dos transportes urbanos da cidade que se concentravam em frente à Câmara Municipal. “Não tem mostrado grande atitude e vontade de vir falar connosco”, gritava um sindicalista ao microfone já depois da caravana passar. 

Mas chocou de frente com um problema bem no meio da praça: a tenda que o Bloco de Esquerda tinha montado para o comício da noite, na mesma cidade. Um comerciante mostrou-lhe um jornal com a notícia que contava que a tenda do BE impedia a passagem para a Rua da Moeda. Manuel Machado, presidente da Câmara Municipal, que o acompanhava, tentou sacudir a água do capote dos socialistas dizendo que são coisas de “campanha”. Mas antes, longe de alguns microfones, já tinha atirado as culpas para o BE.

Costa ouviu e nada disse. Aliás, como nada tem sido sempre que o assunto são os bloquistas. Os recados mais à esquerda surgiram pelas figuras do partido, como Carlos César ou Augusto Santos Silva, não sendo necessário a Costa fazê-lo. Agora, nesta segunda semana de campanha houve uma inversão das críticas para a direita e só à direita. Depois de Pedro Nuno Santos e Vieira da Silva terem entrado em campanha a centrar o foco em Rui Rio, na noite desta quarta-feira foi a vez de Jorge Coelho mandar recados a Rui Rio. Em Viseu, disse que se sentiu “ofendido” por Rui Rio ter pedido para voltar o “cavaquistão”. “Não nos chamem nomes! Nós somos viseenses. Aqui não há cá cazaquistão nem cavaquistão nenhum, somos de Viseu”, disse no seu tom habitual.

A campanha socialista ruma a Sul nos últimos dois dias de campanha, para depois terminar a Norte. António Costa decidiu não sair muito da zona mais caseira nestas eleições e depois de uma visita a Mangualde, o concelho onde o cabeça-de-lista por Viseu ganhou as autárquicas por mais de 69%, ruma a Lisboa para uma arruada e depois termina o dia com um comício em Setúbal.

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