Portugal e Espanha unidos na criação de ferramenta para diagnosticar Alzheimer

O projecto de investigação quer fazer o cruzamento da análise cerebral, genética e social dos doentes com Alzheimer.

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Projecto de investigação quer fazer o cruzamento da análise cerebral, genética e social dos doentes com Alzheimer Paulo Pimenta

A ideia é criar uma ferramenta que cruza a informação dos genes com a actividade eléctrica cerebral de doentes de Alzheimer, a fim de ajudar no diagnóstico precoce desta e de outras doenças neurodegenerativas. Para tal, é preciso unir esforços, que não conhecem fronteiras.

É precisamente esta máxima que junta o instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup), especialista na análise genética, e o grupo de Engenharia Biomédica da Universidade de Valladolid, em Espanha, mestre na análise de electroencefalogramas no projecto AD-EEGWA, que integra o programa de cooperação Interreg V-A Espanha-Portugal. “A Alzheimer é uma doença com muitos factores associados. Para ver se há algum tipo de padrão da análise neuronal com a genética daquela pessoa, vamos correlacionar estas vertentes no mesmo paciente e conjugar diferentes análises”, Nádia Pinto, a responsável pelo AD-EEGWA.

Neste momento, as equipas aguardam pelos dados dos 250 doentes seleccionados no Norte de Portugal e, em Espanha, em Castela e Leão. Destes, 150 têm Alzheimer em fase inicial, moderada e severa, 50 com défice cognitivo ligeiro e 50 são idosos saudáveis.

A base de dados dos doentes da investigação, que teve início em Junho de 2017, é assegurada por duas associações – AFA-Zamora (Associação de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer e outras doenças) e a Alzheimer Portugal, que vão às casas dos doentes recolher amostras de saliva e medir e actividade cerebral com um electroencefalograma portátil. “As associações são uma ponte muito importante no projecto. Elas conhecem as pessoas, as famílias confiam nelas”, explica Nádia Pinto, do Ipatimup. 

Depois de cada equipa receber os dados e proceder às análises independentes, o objectivo é correlacioná-los, “mas sempre com a perspectiva social por trás”, explica a investigadora, daí que exista uma ficha que as associações devem preenchem com informação sobre o modo de vida e hábitos alimentares dos doentes. Este trabalho sociológico dos pacientes é imperativo, defende a investigadora, uma vez que existem inúmeros aspectos do estilo de vida que podem contribui para acelerar ou travar a doença.

A investigação, que é financiada em 543.404 euros pelo Fundo de Desenvolvimento Regional e pelas duas associações que fazem também parte deste consórcio ibérico, não pretende apenas criar uma ferramenta que ajude a diagnosticar a doença precocemente: esta tem de funcionar de forma rápida e barata. “Já há resultados muito promissores da imagiologia, de TAC, mas são exames muito caros”, explica Nádia Pinto.

"Fiquei muito chocada com a forma como os nossos dementes são tratados”

Se Portugal e Espanha unem esforços para levar esta investigação a bom porto, há muito que os continua a separar. “Comparo a realidade entre Portugal e Espanha e, enquanto cidadã, fiquei muito chocada com a forma como os nossos dementes são tratados”, diz a investigadora. “Em Espanha há centros de dia, de acolhimento e lares para pessoas com demência há 30 anos. Aqui, os nossos idosos com demência são, na maioria, integrados em lares, centros de dia generalistas.” O primeiro centro de apoio diurno dirigido a pessoas com doença de Alzheimer foi inaugurado em 2003, mas apenas pode acolher 15 utentes.

“Estes idosos não são idosos comuns, precisam de tratamento específico. Há uma diferença abismal na progressão da doença numa pessoa que é estimulada e outra que não é”, acrescenta Nádia Pinto. Além de os lares generalistas estarem impreparados para doentes com Alzheimer, a investigadora alerta para os vários casos em que estes doentes são rejeitados pelas próprias instituições. “Depois, o que acontece é um familiar dedicar-se a essa pessoa, porque também não há cuidadores formados para esta doença. Os próprios familiares muitas vezes ficam depressivos, porque é uma doença muito complicada, progressiva, que se torna muito frustrante para os familiares.”

Perante o problema complexo, os envolvidos no projecto AD-EEGWA acreditam já estar a fazer a sua parte. “Queremos que a nossa base de dados possa contribuir para bases de dados maiores, como a da população da ibéria ou para dados de bases mundiais.” O projecto termina este ano, mas a ambição é continuar a parceria ibérica. “Temos noção que só ganhamos em colaborar. Todos os esforços são bons e importantes quando toca a tratar esta doença.”

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