Perguntas e respostas sobre o envio ao fisco dos dados bancários

Autoridade tributária vai receber informação sobre o saldo das contas bancárias, a exemplo do que já acontece com as contas dos não-residentes.

Foto
A informação sobre o saldo dos clientes residentes não será trocada pelo fisco com terceiros Joana Goncalves

É a primeira vez que o fisco vai conhecer o saldo de contas em Portugal?
Não. Os bancos já têm de comunicar desde 2017 o saldo das contas detidas em Portugal pelos residentes noutros países (incluindo emigrantes portugueses), seja de quem vive nos Estados Unidos, num país da União Europeia ou noutro que tenha aderido à convenção da OCDE para a troca de informações. Da mesma forma que a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) recebe esses dados e partilha-os com as outras administrações fiscais, delas recebe informação recíproca sobre os portugueses com contas no estrangeiro.

O que muda?
Com a proposta agora aprovada, os bancos portugueses passam a comunicar também o saldo das pessoas que residem em Portugal e que têm aqui contas. Ficará a saber quanto é que uma pessoa tem depositado num determinado banco se o saldo a 31 de Dezembro do ano anterior for superior a 50 mil euros. O leque de contribuintes é muito mais vasto, porque abrange muitos mais cidadãos.

Os contribuintes terão de entregar alguma declaração?
Não. Para os cidadãos (contribuintes/clientes bancários) não há qualquer nova obrigação declarativa ao fisco. Quem tem de comunicar o saldo das contas são os bancos e as outras instituições financeiras.

O fisco vai aceder às contas bancárias e conhecer os movimentos?
Não. Os dados transmitidos referem-se ao valor global que uma pessoa tem guardado no banco, se essa soma (de uma ou mais aplicações) superar o tecto dos 50 mil euros. A AT não conhecerá os movimentos, nem os seus detalhes, apenas o saldo registado no fim do ano.

Por que é que há o limite dos 50 mil euros?
O Governo ponderou obrigar os bancos a enviarem informação sobre todas as contas (tivesse uma pessoa depositados dois mil euros, 15 mil ou 35 mil), mas decidiu definir um tecto de 50 mil euros sem apresentar uma justificação técnica objectiva. Porém, a opção tem semelhanças óbvias com o acordo de troca de informação com os Estados Unidos (FACTA). É que, nesse âmbito, os bancos portugueses têm de comunicar ao fisco o saldo das contas tituladas em Portugal por residentes dos Estados Unidos se o valor for superior a 50 mil dólares.

Como é calculado o valor?
O saldo é calculado somando todas as contas financeiras de uma pessoa num banco, ou seja, o tecto é visto por cliente e por instituição. Por exemplo, se um cidadão tiver uma conta à ordem, outra a prazo e uma aplicação em unidades de participação que, somadas, valem 63 mil euros, o banco terá de dizer qual é o saldo detido pelo cliente. Por hipótese, se um cidadão tiver 52 mil euros distribuídos por dois bancos (26 mil em cada um) o fisco não ficará a saber. Numa conta colectiva, o saldo é sempre considerado por “cabeça”.

E se o dinheiro for transferido para outro país?
Apesar de a lei poder levar à dispersão de dinheiro entre bancos em Portugal, não incentiva uma pessoa o colocar no estrangeiro, num país europeu ou noutro país que tenha aderido à troca de informação no âmbito da OCDE. Se uma pessoa o fizer, o fisco ficará a sabê-lo, justamente porque o banco terá de comunicar à autoridade tributara nacional informação sobre os não-residentes (cidadãos portugueses) e, por sua vez, o fisco desse país irá partilhá-la com o fisco português.

Qual é a data usada para verificar o saldo?
É o dia 31 de Dezembro de cada ano; os dados são comunicados no ano seguinte até ao fim de Julho.

Além dos depósitos, há outras aplicações abrangidas?
Sim. Como a lei se refere às contas financeiras, isso inclui não apenas os depósitos (contas comerciais, à ordem, de aforro, a prazo ou de poupança), mas também muitas outras aplicações. Estão abrangidas as contas de custódia (como contratos de investimento), contratos de renda, poupanças aplicadas em unidades de participação e acções de fundos de investimento, fundos de pensões, organismos de investimento em capital de risco, ou títulos em trusts (estruturas fiduciárias).

Por que é que o Governo quer implementar a medida?
Dotar as administrações fiscais de ferramentas que permitam conhecer o património dos contribuintes e cruzar dados para detectar situações de risco é uma tendência global. Como a troca de informações será uma prática cada vez mais frequente, o fisco tem vantagem em ter sobre os residentes o mesmo grau de informação que vai receber sobre os não-residentes. Passa a ter à disposição mais dados para olhar de forma integrada para o património dos cidadãos. Será mais um elemento a juntar aos que conhece hoje (os valores e o património declarado, por exemplo), para detectar eventuais casos de ocultação de património e subdeclaração de rendimentos.

Em que situações o fisco já pode pedir o levantamento do sigilo?
O fisco já pode pedir a derrogação do sigilo bancário em várias situações, para conhecer informações financeiras; por exemplo, quando há indícios de crimes fiscais, de falta de veracidade ou quando um contribuinte tem um acréscimo de património não justificado. Mesmo conhecendo o saldo, o fisco só continuará a conhecerá outras informações bancárias com o levantamento do sigilo.

Quem vai ter acesso ao valor do saldo?
Sabe-se que haverá um acesso restrito e sujeito a autorização, mas os procedimentos internos não foram detalhados. Os dados estão protegidos pelo segredo profissional dos funcionários do fisco, tal como acontece nos bancos. Às informações que a autoridade tributária já recebe sobre o saldo dos não-residentes já se aplicam as medidas especiais de segurança previstas na Lei da Protecção de Dados Pessoais. Exemplos: impedir que suportes de dados sejam “lidos, copiados, alterados ou retirados” por pessoas não autorizadas, garantir que os autorizados só acedam aos “dados abrangidos pela autorização” ou impedir que os sistemas de tratamento automatizado de dados” sejam utilizados por quem não está autorizado.

Os dados estarão seguros?
Cabe à AT garantir que assim seja e ao Governo assegurar que a AT o cumpre. Na explicação da proposta de lei, o Governo escrevia que a “confidencialidade dos dados obtidos é garantida, não havendo lugar a troca de informações com terceiros, privados ou públicos, nacionais ou estrangeiros”.

Sugerir correcção
Comentar