O pior é quando não nos dizem

Aceitamos as falhas que existiram, porque é evidente que não se resolve um problema de décadas em seis meses. Mas aceitamos essas falhas na condição de nos dizerem a verdade, de não fugirem às responsabilidades. E a primeira responsabilidade de quem governa é essa: a da transparência.

Não queremos que “S. Pedro nos proteja”, ao contrário do que dizia o PSD ontem. Não queremos que nos tragam milagres. Do Governo o que esperamos é que nos diga a verdade — sobre o combate aos incêndios que se aproxima, neste caso.

É mais difícil com duas tragédias em cima. Mas também por isso aceitamos melhor o que não correr bem. Aceitamos, porque sabemos que é difícil, aceitamos, porque sabemos que o Governo está a fazer tudo para que corra melhor (nem poderia ser de outra forma). Aceitamos as falhas que existiram, porque é evidente que não se resolve um problema de décadas em seis meses. Mas aceitamos essas falhas na condição de nos dizerem a verdade, de não fugirem às responsabilidades. E a primeira responsabilidade de quem governa é essa: a da transparência.

E não é isso que está a acontecer. Primeiro exemplo: na segunda-feira, a poucos dias de começar a época oficial de combate aos incêndios, demitiu--se um dos principais responsáveis da Autoridade Nacional da Protecção Civil. Dizem-nos que por “razões pessoais”, mas sabemos que foi por bem mais do que isso. 

Segundo exemplo: hoje, aqui no PÚBLICO, contamos-lhe que também os GIPS estão aflitos com falta de meios, agora mesmo, quando tudo teria de estar pronto. O que o Governo nos tem dito, ao contrário, é que os GIPS têm mais meios do que nunca. Mas nem luvas e capacetes haverá para todos esses militares da GNR.

O pior, repito, é quando tudo se esconde. Há meses que a jornalista do PÚBLICO Liliana Valente faz perguntas ao Governo — sobre as aeronaves objecto de contrato, sobre o SIRESP, sobre a auditoria interna da ANPC (que só se conheceu pelo PÚBLICO e de que o Presidente da República nem nos diz se teve conhecimento). Perguntas também sobre procedimentos disciplinares — em consequência dos erros. Sobre tantas mais coisas que nos permitiriam, pelo menos, estarmos mais seguros sobre com o que podemos contar no Verão que se avizinha. As respostas, já imagina, nunca chegaram. E as notícias que nos vão chegando entretanto não nos deixam mais descansados. 

Ontem, numa conferência da Comissão Europeia sobre “a democracia 4.0”, o Presidente da República explicou a quatro centenas de jovens alunos que o desafio que nos traz a era digital é que os cidadãos já não percebem porque é que os problemas não se resolvem rapidamente, ou porque é que a informação não lhes é prestada. Não percebem, senhor Presidente, sobretudo se não lhes explicarem. E não, senhor primeiro-ministro, não era recado. Era aviso, para quem quisesse ouvir. Já diz o velho ditado: “Quem te avisa...”

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