A vingança é um pato que se serve frito

Quando vi Paulo Portas a anunciar este sincero apoio a Marcelo Rebelo de Sousa veio-me à memória a célebre série brasileira “Sai de Baixo”

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Paulo Portas anunciou, com bastante solenidade, o apoio ao “professor” Marcelo Rebelo de Sousa na corrida às eleições presidenciais do próximo ano. Disse que Portugal vive “circunstâncias muito particulares”, com praticamente todos os altos cargos do Estado preenchidos por pessoas do PS ou ligadas ao PS, alertando para o perigo de esse grande bastião da democracia que é a Presidência da República (palavras minhas) poder vir a ser tomada por alguém de esquerda, nomeadamente socialista, “ainda para mais, quando o professor tem tido o cuidado de ser caloroso e abrangente com os portugueses como um todo”.

Quando vi Paulo Portas a anunciar este sincero apoio a Marcelo Rebelo de Sousa veio-me à memória a célebre série brasileira “Sai de Baixo” (1996/2002), na qual a actriz Marisa Orth corporiza a sensual e indizivelmente burra Magda, para quem a realidade é uma coisa longínqua, tem um comportamento quase sempre nonsense e atira frases num português que quase só ela conhece.

Paulo Portas não encaixa no perfil de Magda Salão Antibes, de seu nome completo, tanto mais que a habilidade política da personagem de “Sai de Baixo” é muito mais do que um zero à esquerda. Paulo Portas e Marcelo Rebelo de Sousa são velhos conhecidos, pelo menos dos tempos de “O Independente”, altura em que Portas dirigia este semanário com sarcasmo q.b. e um empenho quase heróico em derrubar Cavaco Silva. Se bem os leitores se lembram, quase não havia semana em que o jornal não trazia uma manchete ou uma notícia talhada à medida para, no mínimo, deixar de orelhas quentes o homem que não perdia cinco minutos a ler jornais e não se enganava e raramente tinha dúvidas.

Ora, numa dessas campanhas quixotescas de Paulo Portas (Cavaco ganhou as eleições todas, apesar dele), “O Independente” publicou uma notícia sobre uma “célebre” reunião do PSD, a qual Marcelo terá “relatado” a Portas com o devido pormenor, incluindo a vichyssoise (sopa fria) servida durante o jantar. Tudo inventado pelo “professor” e que cobriu Portas de um ridículo político ainda hoje recordado. Em 1999, os dois, enquanto líderes dos respectivos partidos, desentenderam-se para reeditar a AD e… Durão Barroso chegou à presidência do PSD.

Paulo Portas pode ter muitos defeitos políticos, mas de falta de memória ninguém pode acusá-lo e muito menos de sageza para as consecutivas estratégias que vai desenhando para se manter colado ao poder há muitos e bons anos. Por isso, foi com um sorriso escarninho que vi a conferência de imprensa de anúncio do apoio do CDS-PP a Marcelo Rebelo de Sousa. Será este apoio irrevogável? Será que Portas vai relatar a Marcelo o conteúdo das reuniões do partido? E como será quando a campanha eleitoral começar a sério? Vai Portas sair para a rua de bandeira em punho, ou vai alinhar no distanciamento já definido face ao PSD e, por consequência, a Marcelo?

Além da catchphrase “num tô intendendu”, Magda dizia, nas alturas de maior intensidade dramática “a vingança é um pato que se serve frito”. Como a vichyssoise?

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