Independentistas insistem em reconhecer que Puigdemont pode ser presidente

Todos os partidos têm propostas, mas para já não se entendem sobre que caminho traçar para desbloquear a legislatura e evitar eleições. Em Madrid, Rajoy não capitaliza com as detenções dos líderes do processo.

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Arrimadas exige a demissão de Roger Torrent como presidente do Parlamento catalão Quique Garcia/Reuters
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O primeiro-ministro não tem conseguido virar a situação catalã a seu favor Susana Vera/Reuters

No dia em que o seu primeiro candidato à presidência ficou em prisão preventiva na Alemanha, o conjunto dos partidos independentistas apresentou no Parlamento autonómico resoluções para que os deputados se comprometam a “adoptar todas as medidas necessárias para garantir” os direitos políticos, incluindo o de ser eleito presidente, de Puigdemont, Jordi Turull e Jordi Sànchez. Já ficou marcado um plenário para quarta-feira.

Há duas propostas de resolução em cima da mesa, muito parecidas. Uma refere-se a Turull, detido desde sexta-feira, um dia depois de ver chumbada a sua tentativa de tomar posse como líder da Generalitat, e a Puigdemont; a outra fala exclusivamente a Sànchez. Este foi “número dois” de Puigdemont nas eleições de 21 de Dezembro, que renovaram a maioria independentista, e foi a segunda escolha para candidato à investidura, com a Justiça a recusar deixá-lo sair da cadeia e participar no debate.

Com esta resolução dedicada a Sànchez, as forças independentistas (Juntos pela Catalunha, ERC e CUP) estarão a tentar sublinhar a adopção de medidas cautelares por parte do Comité de Direitos Humanos da ONU, que já aceitou pronunciar-se sobre este caso e pediu preventivamente a Madrid que “respeite todos os direitos políticos” do catalão. Na outra resolução, pede-se a “libertação imediata dos deputados e ex-deputados da câmara”.

Desobedecer à Justiça

Entretanto, sabe-se que a JxC e a CUP trabalham para conseguir tornar efectiva a investidura de Puigdemont (a partir da Alemanha ou de uma cadeia espanhola), o que implicaria mudar a lei da Presciência e o regulamento do Parlamento – o Tribunal Constitucional já aceitou pronunciar-se sobre o recurso do Governo de Madrid a estas alterações. Mas tanto a JxC como a CUP estão dispostas a desobedecer à Justiça.

“Com os elementos que temos, precisamos de ver como tornar Puigdemont presidente. Não simbólico, mas mesmo de verdade”, afirmou Elsa Artadi, porta-voz da JxC no Parlamento e a mulher a quem o líder afastado pela intervenção de Madrid na Catalunha confiou a direcção da campanha eleitoral, com ele em Bruxelas.

As detenções dos últimos dias – na sexta-feira ficaram em prisão preventiva sem possibilidade de fiança mais cinco dirigentes; domingo, foi a vez de Puigdemont ser detido pela polícia alemã –, as forças soberanistas voltaram a contar com o apoio dos Comuns (aliança do Podemos catalão com Ada Colau) e até com a simpatia do líder do PS catalão, Miquel Iceta, que considera as medidas cautelares “desproporcionadas”.

Os Comuns, liderados por Xavier Domènech, apresentaram uma proposta de resolução para ser debatida na quarta-feira onde se denuncia “a atitude irresponsável de Mariano Rajoy, que levou a política para os tribunais”, a libertação dos “presos políticos” e a garantia dos direitos políticos de todos os deputados. Mas a porta-voz da formação, Elisenda Alamany, também disse que os “simbolismos” não desbloqueiam a situação na Catalunha, lembrando aos independentistas que o plenário pelo qual “toda a gente espera é o da investidura”.

O politólogo Joan Subirats acredita que se uma parte dos independentistas se pusesse de acordo para “propor um candidato sem problemas judiciais” estes “podiam contar com o apoio dos Comuns, mesmo se não para entrar num governo, pelo menos para a votação da investidura". Outra proposta, com menos probabilidades de vingar, foi a que fez Iceta, que defende a necessidade de “um governo de concentração”, com todos os partidos com representação parlamentar. Seria, diz, “uma resposta excepcional a uma situação como a actual, excepcional”.

Oposição com benefícios

Subirats elogia Iceta – “pelo menos é uma proposta, um ponto de partida para um entendimento, e isso é o que tem faltado” – mas admite de imediato que “com todos não será, de facto, possível”. Iceta e Domènech estão a meio caminho, entre as posições mais extremadas de alguns independentistas e aquilo que defendem os Cidadãos e o PP catalão.

O líder popular, que teve o seu pior resultado de sempre, elegendo quatro deputados, pediu à Mesa do Parlamento que recuse a admissão a trâmite das propostas de resolução, tanto dos independentistas como dos Comuns. No sábado, no que deveria ter sido o plenário para a segunda votação de Turull e se transformou num debate sobre a situação política, Xavier García Albiol e a sua bancada abandonaram o hemiciclo, defendendo que a sessão era irregular.

Inès Arrimadas, a líder catalã do Cidadãos que conseguiu que o seu partido fosse o mais votado nas eleições de Dezembro, sem qualquer possibilidade de obter uma maioria, passou o dia a defender a demissão do presidente do Parlamento, Roger Torrent (ERC), argumentando que se rege por “critérios ideológicos” e “com absoluta arbitrariedade”. Aliás, o C’s vai avançar para o Tribunal Constitucional por considerar que Torrent “está a aumentar a divisão na Catalunha com discursos em que apela à desobediência aos tribunais”.

Enquanto isso, Rajoy não capitaliza minimamente com esta situação, apesar de ter deixado os independentistas à deriva. “Antes pelo contrário”, diz Subirats. “Quando não se tomam as decisões políticas que os momentos exigem, perde-se o controlo. E da parte dos juízes assiste-se a um conjunto de decisões tomadas com base numa dupla irritação: por um lado, com os independentistas, o que faz com que percam a neutralidade; por outro, com o partido no poder por lhes ter atirado para cima um problema que era político”, afirma o politólogo.

Contas feitas, nem a entrega de Puigdemont a Espanha trará benefícios a Rajoy, sustenta Subirats: “Muito provavelmente quem vai saber aproveitar melhor esse momento é o Cidadãos, como tem feito. Livres do peso se ser Governo, das responsabilidades que isso envolve, só têm benefícios, nunca têm os custos que Rajoy vai pagando. Aliás, foi isso que se viu nas últimas eleições catalães”.

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