Colégios: nem todos os alunos carenciados vão ser apoiados pelo Estado

Existem critérios legais para seleccionar os alunos que têm financiamento do Estado, mas estes poderão perder apoio se a verba atribuída ao colégio não chegar para todos. Montante foi fixado pelo Ministério da Educação em função do valor atribuído no ano passado.

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Os contratos de desenvolvimento destinam-se a "promover a educação pré-escolar" Sérgio Azenha

Os alunos que são apoiados pelo Estado para poderem frequentar colégios só receberão esse financiamento, neste ano lectivo, se este tiver cabimento num montante igual à verba que cada colégio recebeu para o efeito no ano passado. O alerta partiu da Associação de Creches e Pequenos Estabelecimentos de Ensino Particular (ACPEEP), que já pediu a intervenção da Inspecção-Geral da Educação e da Ciência (IGEC) no sentido de travar uma situação que classifica como “absolutamente ilegal e inconstitucional”.

Em causa estão os chamados contratos simples e de desenvolvimento, que se destinam a subsidiar uma parte das mensalidades cobradas pelos colégios a alunos oriundos de agregados economicamente carenciados. Em 2016, existiam cerca de 29 mil alunos abrangidos por estes contratos.

Os critérios a preencher pelas famílias para a atribuição destes apoios mantêm-se iguais desde 2009, mas o Ministério da Educação (ME) optou agora por impor uma selecção que tem na base não estes requisitos, mas sim o montante que foi atribuída no ano passado a cada colégio.

Ou seja, frisa a ACPEEP, tal “vai limitar as verbas a disponibilizar às famílias, ainda que estas preencham os requisitos legais para poderem beneficiar dos apoios”. E pretende avançar com esta mudança “sem que tenha existido qualquer alteração legislativa que justifique ou legitime esta alteração”, acusa a associação.

Esta mudança foi comunicada aos colégios em meados de Dezembro através de uma informação enviada pela Direcção-Geral da Administração Escolar (DGAE), numa altura em que vários destes estabelecimentos já tinham adiantado às famílias parte do financiamento que é devido pelo Estado, conta a vice-presidente da associação, Susana Batista.

Selecção será dos colégios

Na prática, e como os requisitos se têm mantido inalteráveis desde 2009, o que estes colégios fazem é abater parte da mensalidade logo desde o início do ano lectivo, porque “para muitas famílias é impossível esperar” pelos pagamentos do Estado, que são feitos em várias tranches, a primeira das quais já quando o ano lectivo está em curso.

“E agora o que vamos fazer? Como vamos retirar a uma família algo que já demos?”, questiona Susana Batista, acrescentando que esta é uma decisão que não lhes compete assumir, como o ministério pretende que façam. Através da DGAE, o ME já informou os colégios que serão eles os responsáveis pela gestão da “atribuição dos apoios financeiros aos alunos”, uma resposta que os deixou “perplexos”.

“Como pode uma entidade particular, que é uma mera intermediária no processo, decidir sobre a atribuição de fundos públicos? Como pode uma entidade particular estabelecer critérios próprios e aplicá-los, contrariando o disposto numa portaria emanada do Ministério da Educação e das Finanças? Como se compatibiliza esta selecção com o direito à educação em condições de igualdade?”. Estas são algumas das questões colocadas na exposição que foi enviada à IGEC.

Em resposta a perguntas do PÚBLICO, o ME limitou-se a indicar que “serão consideradas as famílias que cumpram os requisitos legais, dentro dos limites máximos da despesa autorizada, como resulta da legislação aplicável”. Para 2018, acrescentou, o Orçamento de Estado prevê a atribuição de 19,3 milhões de euros para os contratos simples e 7,7 milhões de euros para os contratos de desenvolvimento, em ambos os casos valores idênticos aos destinados para o efeito em 2017.

Os contratos simples cobrem a frequência do 1.º ciclo ao secundário, a sua existência é justificada na lei pelo “exercício do direito de opção educativa das famílias” e destinam-se a agregados com um rendimento mensal per capita inferior a 541 euros. Os contratos de desenvolvimento dizem apenas respeito à frequência de jardins-de-infância, destinam-se “à promoção da educação pré-escolar” e abrangem famílias com um rendimento per capita mensal inferior a 541 euros. Os valores atribuídos oscilam em média entre os 50 e os 100 euros mensais. 

Notícia corrigida às 14h50 de 28 de Fevereiro. Reformula valor do rendimento mensal per capita.

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