As mulheres e as CTEM

É fundamental ter mais mulheres a ocupar os empregos que vão ajudar a criar o mundo de amanhã.

Hoje em dia reconhece-se cada vez mais a importância das áreas CTEM (STEM, em inglês) no desenvolvimento das sociedades modernas, assumindo um papel fundamental no crescimento económico sustentável. A formação em CTEM — Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática (ou mesmo CTEAM, incluindo-se por vezes as artes neste pacote por mobilizarem competências de criatividade e imaginação) — estimula o pensamento crítico e desenvolve uma atitude criativa e inovadora, aspetos essenciais nos empregos do futuro. Além disso, as ofertas de trabalho nestas áreas têm crescido de forma mais acelerada do que as ofertas em geral, e os salários médios que estes trabalhadores recebem são também em média superiores aos dos restantes setores, para níveis equivalentes de qualificação.

Do ponto de vista de políticas públicas, muitos países, entre os quais os EUA (durante a presidência de Obama), têm apostado nas áreas CTEM procurando estimular os jovens para o prosseguimento de estudos em cursos científico/tecnológicos. Estes cursos, porém, requerem uma forte base matemática, bem como o desenvolvimento de competências analíticas e de abstração, aspetos em que os estudantes têm frequentemente dificuldade, pelo que uma abordagem dirigida a superá-las deve ser definida logo desde o 1.º ciclo do ensino básico.

Porém, se isto é um problema geral, mais grave é quando olhamos para a percentagem de mulheres que se candidata a cursos nestas áreas. Nos dados do Ministério da Educação [1] referentes a 31 de dezembro de 2016, os números são avassaladores: na FEUP [2] eram homens mais de 75% dos alunos inscritos nos cursos de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, Engenharia Informática e de Computação ou Engenharia Mecânica, percentagem idêntica à que se verificava na Faculdade de Ciências nos cursos de Ciências e Computação ou de Física; Engenharia Física ou Matemática eram um pouco mais equilibrados, com valores à volta de 60%. No Técnico, o cenário é em tudo semelhante: os dois cursos do país com média de admissão mais elevada (Engenharia Aeroespacial e Física Tecnológica) tinham ambos mais do que 75% de alunos do sexo masculino.

Ora, dados recentes mostram que as raparigas terminam o ensino secundário com médias superiores às dos rapazes e que a distância tem vindo a aumentar, o que significa que, em média, elas teriam melhores condições para uma primeira escolha — só que essa não recai nestes cursos, apesar da maior taxa de empregabilidade e de darem acesso a empregos mais bem pagos.

O problema não é novo e todos reconhecem a natureza complexa quer da sua origem, quer da sua resolução. Mas conseguir que mais mulheres procurem formação nestas áreas e ocupem empregos CTEM é muito importante não só porque a diversidade e a multiplicidade de abordagens por pessoas capazes e diferentes é em si mesmo uma mais-valia, como também porque é fundamental ter mais mulheres a ocupar os empregos que vão ajudar a criar o mundo de amanhã.

As dificuldades residem em hábitos culturais profundamente enraizados e que se reproduzem através de modelos comportamentais, mas também num discurso enviesado (ainda que, frequentemente, inconsciente) de pais, professores, colegas e até dos media.

Por tudo isto, este é um domínio em que as políticas públicas têm de ter um papel fundamental. Torna-se urgente definir um programa abrangente e multifacetado que vise promover as áreas CTEM como área de formação de eleição de um modo geral, mas que vise de forma muito objetiva aumentar a participação das mulheres. O programa tem que começar cedo, desde a formação pré-primária, e tem que ser continuado ao longo de toda a escolaridade. Tem que ter múltiplos instrumentos que podem passar por currículos específicos, integrados nos currículos obrigatórios, por uma abordagem inovadora do ensino da matemática, pela introdução de computadores e programação desde a 1.ª infância e que pode ir até campanhas publicitárias específicas para procurar moldar mentalidades (como fez o Reino Unido, entre outros).

Esta é mais uma vertente do combate à desigualdade de género, quer do ponto de vista de rendimentos mais equitativos, quer da ocupação de posições de destaque e de poder. Queremos mais mulheres inventoras, exploradoras e agentes de mudança: o país não se pode dar ao luxo de perder, nestas áreas, quase 50% dos potenciais talentos que gera.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

[1] Dados disponíveis em infocursos.mec.pt
[2] Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

O Institute of Public Policy (IPP) é um think tank académico, independente e apartidário. As opiniões aqui expressas vinculam somente os autores e não refletem necessariamente as posições do IPP, da Universidade de Lisboa, ou de qualquer outra instituição

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