Alegre engrossa críticas de socialistas a listas transnacionais

António Costa assinou posição de princípio favorável a este novo tipo de listas nas eleições europeias. Há criticas à esquerda e à direita.

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Nuno Ferreira Santos

Manuel Alegre junta a sua voz aos que se têm oposto à hipótese de haver um círculo transnacional nas eleições europeias, assumida na mais recente cimeira dos países do sul da Europa. Um tema que já mereceu críticas do BE e do PSD, que já pediram uma audição do ministro dos Negócios Estrangeiros no Parlamento, e também do CDS. A oposição estende-se ao próprio PS, com Vital Moreira a ser o primeiro a vir a terreiro, juntando-se-lhe agora Alegre.

“Fiquei perplexo quando vi que o PS aderiu à ideia de haver lista transnacionais. Não favorece a transparência, nem a democracia. Apenas favorece os países mais poderosos”, disse ao PÚBLICO o fundador do PS.

Manuel Alegre diz estar “inteiramente de acordo” com a opinião de Vital Moreira expressa no blogue Causa Nossa, onde este escreveu que “os lugares atribuídos a tal lista transnacional seriam retirados aos círculos nacionais, implicando portanto uma redução do número de deputados eleitos em cada país, incluindo em Portugal”.

O constitucionalista acrescentou que “a lista transnacional favoreceria naturalmente a posição dos países mais populosos, nomeadamente Alemanha e a França, reforçando a sua representação parlamentar” e que passaria a haver “duas categorias de deputados”, “com o perigo de uma perda de status político” dos eleitos a nível nacional face aos eleitos nas listas transnacionais”.

“Passaria a haver deputados de primeira e deputados de segunda e isso é inadmissível”, acrescenta Alegre, salientando que o que se está a discutir “não é um detalhe ou algo assessório” e “terá de ser debatido na Assembleia da República”.

O histórico socialista lembra que, em 2007, na discussão do Tratado de Lisboa, se manifestou contra a diminuição da representatividade dos países mais pequenos, nomeadamente Portugal, na União Europeia. “Nessa altura, a representatividade de Portugal baixou de 3,74% para 2,14%, enquanto a da Alemanha subiu 8,4% para 16,75%, o mesmo pode acontecer agora”, afirma.

Toda a gente sabe que não sou um eurocéptico, mas também não sou um eurobeato e, acima de tudo, sou português”, concluiu Manuel Alegre.

Criticas à esquerda e à direita

O primeiro-ministro, António Costa, já negou ter dado o seu acordo à proposta do Presidente francês, Emmanuel Macron, para a criação de um círculo transnacional nas eleições europeias, contrapondo até que os socialistas portugueses se têm oposto. Costa salientou que alguns pontos da declaração final da cimeira, "embora não sendo objecto de rejeição, não têm acordo" de todos.

Porém, a posição de princípio consta do último ponto da declaração final da quarta reunião do chamado EU Med Group, que inclui Itália, França, Espanha, Portugal, Grécia, Malta e Chipre, em que se lê: “Apoiamos todas as iniciativas destinadas a promover a democracia e a participação dos cidadãos. A este respeito, congratulamo-nos com a ideia das consultas dos cidadãos, em toda a Europa, sobre as principais prioridades para o futuro da União Europeia, que poderiam ser organizadas a partir da próxima Primavera. No mesmo espírito, as listas transnacionais de deputados do Parlamento Europeu, a serem eleitos a nível europeu, poderiam reforçar a dimensão democrática da União.”

O BE e o PSD pediram, entretanto, a audição do ministro dos Negócios Estrangeiros no Parlamento para debater o tema, com Santos Silva a mostrar total disponibilidade para se apresentar na Assembleia da República.

Em declarações ao PÚBLICO, o eurodeputado do PSD Paulo Rangel considerou “inaceitável” esta “pré-vinculação” a uma proposta que altera as leis eleitorais, “sem que tenha sido debatida na Assembleia da República”.

Já o BE recorda um parecer da comissão de Assuntos Europeus que alertava para possíveis inconstitucionalidades nas propostas em discussão na Europa, entre as quais as listas transnacionais, e que poderia desvirtuar "a representatividade de várias forças políticas, tanto a nível nacional como a nível europeu".

O CDS também já fez saber da sua oposição a esta intenção, com o eurodeputado Nuno Melo a considerar que o apoio do primeiro-ministro português é a esta iniciativa é "um crime de lesa-pátria", que “transforma António Costa num joguete de franceses e alemães" e “atraiçoa os países médios e pequenos”.

A este, juntou-se o dirigente centrista Adolfo Mesquita Nunes que, num artigo de opinião no Jornal de Negócios, conclui: “Uma União que mitigue, secundarize, e relativize os países e o seu papel e a sua história é uma ficção. E as ficções políticas não costumam acabar bem.”

Só ideia, diz ministro

O ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou nesta quinta-feira que a declaração subscrita pelo Governo não passa de uma “ideia a discutir” e que Portugal não está obrigado a adoptá-la.  Augusto Santos Silva, que falava à margem de um debate alusivo ao percurso de Mário Soares, na sede nacional do Partido Socialista, em Lisboa, desvalorizou assim as críticas de vários partidos, incluindo de figuras do PS, à posição subscrita pelo primeiro-ministro, António Costa, ao assinar a Declaração de Roma no passado fim de semana.

“O Governo português assinou uma declaração, a Declaração de Roma. O compromisso a que chegaram os chefes de Estado e de Governo dos sete países da Europa Mediterrânica - e a declaração é clara [quanto a esse ponto] - diz que essa ideia das listas transnacionais poderia ser uma boa maneira de nós procurarmos chegar a um objectivo que nos une, que é o de reforçar a democraticidade da Europa”, disse o MNE português.

Ou seja, acrescentou Santos Silva, “Portugal entende que essa é uma ideia, e como todas as ideias deve ser discutida”.

Notícia alterada: acrescentada a posição do ministro dos Negócios Estrangeiros

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