Reis, pescadores e as memórias gastronómicas de Cascais

Receitas de Reis e Pescadores - Memória e Património Gastronómico do Concelho de Cascais é muito mais do que um livro de receitas.

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O Foral de Cascais, de 1514, mencionava "queijadas e biscoitos". Essa é a mais antiga referência escrita a preparações culinárias do concelho, que agora apresenta Receitas de Reis e Pescadores (livro editado pela LeYa em parceria com a Câmara Municipal de Cascais e a Escola Superior de Hotelaria e Turismo), uma verdadeira viagem pelo património gastronómico da região.

Num outro documento do mesmo século XVI, fala-se de uma "galinha recheada" para, no século seguinte, o Regimento dos Fornos (1604) fixar o preço pela cozedura de "biscoitos, rosquilhas, bolos de fogaça, rosquilhas de Baptismo" e ainda de "empadas de peixe".

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Mais do que um livro de receitas, Receitas de Reis e Pescadores - Memória e Património Gastronómico do Concelho de Cascais apoia-se numa investigação em documentos, livros de gastronomia e testemunhos dos habitantes do concelho para citar factos verídicos que envolveram figuras históricas como a Rainha D. Amélia, o Rei D. Carlos ou Luís de Camões. Inclui as famosas “areias” e “nozes”, entre os pratos apreciados pelo rei D. Carlos, e singulares episódios históricos, como o de um homem que terá prometido a Camões umas galinhas recheadas em troca de versos.

Ao longo de 270 páginas (ilustradas com fotografias de Teresa Aires), as autoras, Raquel Moreira e Cláudia Silva Mataloto, respectivamente, professora e aluna na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE), foram além da recolha de propostas gastronómicas, aventurando-se na história dos produtos, dos peixes, crustáceos, moluscos e bivalves, do leite, manteiga, queijo e caça, do pão de trigo, azeite e vinho, do território de montanha e de mar, das terras cultivadas no interior e da criação de animais (da Malveira da Serra até São Domingos de Rana), dos vestígios no interior de "agricultura antiga, quase memória, que subsistem agora na presença de hortas e quintais dispersos, onde o tradicional limoeiro, uma nespereira ou uma figueira pontuam a paisagem".

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Trata-se de um levantamento do património alimentar e gastronómico do concelho de Cascais como "valorização dos patrimónios locais e da memória tornada presente", um conjunto grande de receitas de um "território de reis e pescadores, de gentes da terra e de gentes de outros lugares", como escreve Raquel Moreira, responsável pela sistematização de receitas publicadas em livros de cozinha identificadas como sendo "à Cascais" ou "de Cascais". Gastronomia é, no seu entender, "a cozinha do quotidiano de uma região, são as tradições alimentares dos dias de festa e são os espaços de convívio em torno de um refeição ou de um petisco".

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Da horta, chegam sopas e caldos (de favas, de tomate, de pepino de feijão com couve lombarda, de feijão com nabos, de tomate com peixe, de perdiz e de grão com galinha). Do mar, caldeiradas e arrozes (como as amêijoas à Guincho, o mexilhão de caldeirada à fragateira ou o arroz de sardinhas à pescador). Da capoeira e da caça, assados e estufados (como a carne de alguidar ou o coelho frito). E para adoçar a boca bolos, bolinhos e outros docinhos (como as joaninhas, as areias e as pratas de Cascais, o arroz-doce saloio ou o licor de folha de figueira).

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A obra dá ainda a conhecer novas receitas confeccionadas pelos chefs e alunos da ESHTE com ingredientes da região, como o figo-da-Índia, comum na paisagem do concelho, o funcho-marítimo, que nasce espontaneamente na orla costeira, ou a amora silvestre, que cresce na zona da serra. Empada de congro e funcho marítimo, bolinhos de arroz de marisco e geleia de pimentos, sardinhas recheadas sobre arroz de salsa, polvo de Cascais à lagareiro, pato corado com redução de mel, sabores da horta e aromas do pomar, galinha recheada à Camões, lebre com puré de feijão branco e nabos, sorbet de figo-da-Índia, chatas, cheesecake de areias de Cascais e Figos em calda de Carcavelos.

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